Mapeamento do judô escolar nos Estados de São Paulo, Paraná e Rio de Janeiro

Workshop prof. Okada realizado em São Paulo

Além de apontar caminhos, a pesquisa realizada durante o workshop de capacitação ministrado pelo professor Hirotaka Okada em São Paulo, Bauru, Rio de Janeiro e Curitiba estabelece várias interrogações e questionamentos sobre a qualificação, organização e regulamentação dos professores de judô

Judô nas Escolas
26 de dezembro de 2019
Por RAFAEL BORGES I Fotos BUDOPRESS
Curitiba – PR

Em pesquisa realizada de 14 a 20 de fevereiro, durante a realização do workshop de capacitação para professores de judô ministrado pelo mestre japonês Hirotaka Okada, o professor doutor Rafael de Camargo Penteado Borges realizou um mapeamento do perfil do desenvolvimento do judô escolar nos Estados de São Paulo, Paraná e Rio de Janeiro.

Nos encontros realizados nas cidades de Bauru (SP), Rio de Janeiro (RJ), Curitiba (PR) e São Paulo (SP), o renomado professor campineiro entregou a cada participante um questionário elaborado por ele, orientando os participantes sobre como responder. Após o preenchimento do questionário, foi feita a compilação das informações resumidas.

Ao todo foram considerados válidos 415 questionários para a pesquisa, que abrangeu exclusivamente professores registrados e filiados a suas respectivas federações estaduais.

Resultados

Havia 830 inscritos nos workshops de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná, sendo considerados apenas 428 questionários preenchidos e 415 validados (cerca de 50% do total de inscritos). O resumo dos principais resultados está descrito na tabela 1, abaixo.

A figura 1 mostra o percentual dos praticantes de judô em escolas públicas e privadas nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná comparado ao percentual de praticantes de judô fora do ambiente escolar. Verificou-se que o Paraná apresentou maior percentual de praticantes de judô dentro do ambiente escolar (67,2%), seguido por São Paulo com 48,9% e Rio de Janeiro com 39,1%.

A figura 2 mostra o percentual de distribuição dos praticantes em relação ao local de prática do judô na somatória dos três Estados pesquisados: escola do ensino fundamental (50,4%); projetos sociais (21,5%); clubes e/ou associações (15%); academias (11%) e outros locais (2,1%).

Na figura 3 vê-se a distribuição dos praticantes de judô em escolas públicas (28,1%) e privadas (71,8%) na somatória dos três Estados. Para a contagem geral de praticantes nos dois sistemas escolares, foram considerados os praticantes do ensino primário (pré-escolares), ensino fundamental I e II, bem como ensino médio.

Discussão

O Paraná apresentou o maior percentual de praticantes no ambiente escolar, corroborando aspectos da cultura regional, devido à grande proporção da população nikkey, bem como políticas estratégicas por parte da Federação Paranaense de Judô e da capacitação de professores para tal objetivo.

Já no Estado do Rio de Janeiro, que apresentou o menor percentual, identificou-se grande proporção de projetos sociais atuantes fora do âmbito escolar, além de menor presença de nikkeys. Vale ressaltar que a observação in loco do Estado evidencia a existência de uma liga esportiva de judô muito atuante e com significativa representatividade entre os professores e praticantes, que por sua vez não contribui para um projeto único de desenvolvimento do judô.

Prof. Rafael Borges tem a palavra no curso do sensei Okada

A maior rede de escolas que trata o judô de forma exemplar e cada vez mais atrelada ao seu corpo docente e integrada à proposta educacional da modalidade foi o SESI-SP. A segunda rede de escola que se destacou foi o colégio Objetivo, no Estado de São Paulo, porém com uma proposta de trabalho não sistematizada e não unificada, diferente da identificada na rede SESI-SP.

Apesar de as escolas aparecerem em primeiro lugar no quesito local da prática do judô, em sua maioria elas não estão filiadas às federações e, com raríssimas exceções, seus praticantes também não participam do circuito federativo.

Jumpei Igarashi, Hirotaka Okada, Alessandro Puglia e Rafael Borges

Os projetos sociais aparecem em segundo lugar, com uma diferença de 6 pontos percentuais acima de clubes e associações, que durante décadas constituíram a maioria e participaram decisivamente do desenvolvimento e expansão do judô nacional. Apesar da presença menos significativa, sua importância no cenário do judô de alto rendimento ainda se mostra de fundamental importância, uma vez que essas entidades conseguem apoiar tecnicamente e sustentar seus atletas, mantendo assim o imprescindível processo de massificação da modalidade.

O tipo de escola reflete-se no perfil de praticantes. Na escola pública o grupo de maior participação concentra-se no ensino infantil, já nas escolas privadas este grupo está no ensino primário (pré-escola). Identificou-se que a maioria das escolas mantém o judô como modalidade extracurricular, ou seja, desenvolvida fora dos denominados eixos temáticos recomendados para a disciplina de educação física, mesmo que constem como conteúdos a serem ministrados preconizados nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) da educação física. Isso confirma que grande parte dos professores de judô não possui qualificação acadêmica para lecionar no ambiente escolar. O fato de a grande maioria das escolas incluir o judô na modalidade extracurricular também expõe a estratégia adotada pelos profissionais autônomos, variando entre: locação de espaço, prestação de serviço terceirizado, comodato e, o mais comumente encontrado nas escolas públicas, projetos sociais que se inserem em propostas e programas individuais de cada escola. Alguns municípios já apresentam propostas de ações mais desenvolvidas para atender a esse objetivo, com fundamentação legal de leis municipais que suportam o apoio à prática esportiva como um todo.

Rafael Borges observa e orienta judocas no seminário do prof. Okada realizado em Curitiba

Apesar de os resultados não terem sido coletados diretamente, verificou-se junto aos organizadores locais (federações estaduais), bem como pela pesquisa in loco, que a maioria dos professores de judô não possui nenhuma acreditação legal que o considere oficialmente “professor de judô”, seja mediante certificados diversos ou diplomas de curso superior na área de licenciatura. Isso remete a uma pergunta naturalmente feita por diretores a mantenedoras de escolas: o que qualifica a uma pessoa ser professor de judô? Essa realidade e questionamento expõem um importante assunto a ser debatido pela comunidade judoísta nacional, independentemente de filiação esportiva (federações ou ligas), no que tange, principalmente, ao tema “professor de judô.”

Falta uma política do judô nacional ou de uma entidade associativa independente que reúna e agregue todos os denominados “professores de judô”, para qualificar, organizar e regulamentar a atuação dele. Considerando-se a quantidade estimada de praticantes de judô no Brasil – 2 milhões –, pode-se estimar mediante inferências estatísticas que o Brasil possui aproximadamente 22 mil professores atuantes. Tal quantidade e tal perfil de atuação profissional têm ganhado importância no meio laboral, pois é visto que o trabalho com o judô destinado a crianças dentro de escolas tem-se demonstrado o meio mais efetivo, se não o principal, para que o professor tenha uma remuneração.

Diversas hipóteses já foram aventadas, desde o mapeamento de servidores concursados atuantes em escolas públicas e que acumulam alguma vivência no judô, com o intuito de reciclarem seus conhecimentos na modalidade a partir de uma entidade associativa da categoria, até ações pontuais de algumas federações para desenvolver esse tipo de atuação, como vem fazendo a Federação Paranaense de Judô.

Conclusão

O Brasil destaca-se no cenário mundial em diversas áreas, não só por ser o quinto maior país do mundo em área e o quinto em população, mas provavelmente por ser o primeiro em número de praticantes de judô. Esta pesquisa, apesar de limitada a três Estados e com poucos recursos para tal execução, identificou importantes resultados e achados, entre eles que, se considerada a quantidade total de praticantes de judô registrados no denominado circuito federativo, a grande maioria está praticando fora do ambiente escolar. Todavia, constata-se que a maioria dos praticantes de judô está dentro do ambiente escolar, mesmo que a maioria das escolas ainda não ofereça o judô em sua grade curricular ou extracurricular.

Francisco de Carvalho cumprimenta Rafael Borges por sua atuação e protagonismo no cenário acadêmico

Desta forma, novas pesquisas necessitam ser executadas para aprofundamento de questões sobre o desenvolvimento do judô no ambiente escolar, porém, já foram encontrados argumentos iniciais, de que existe a necessidade de uma entidade que auxilie o desenvolvimento do judô dentro dele, suportando-o com orientações legais e estratégicas em prol do objetivo maior do judô: a educação do praticante. Talvez essa entidade possa ser a mesma que associe todos os professores de judô, permitindo que essa categoria profissional seja mais bem orientada, capacitada e, no futuro, regulamentada de acordo com as leis vigentes.

O professor doutor Rafael Borges é graduado em licenciatura e bacharelado em educação física (PUC-Campinas); bacharel em ciências da nutrição (Metrocamp); mestre e doutor pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); especialista pela Universidade Gama Filho e professor de judô e jiu-jitsu.

Hirotaka Okada, Rafael Borges e Jumpei Igarashi no Consulado geral do Japão de São Paulo