Encontro de dirigentes estaduais da educação física mostra caminhos e a aponta a falta de comando nacional

Dirigentes focam a união e o diálogo no enfrentamento do momento mais difícil da educação física

Dirigentes regionais reúnem-se virtualmente para debater saídas para as dificuldades causadas pelo isolamento social durante a pandemia e constatam a necessidade de ações integradas

Gestão Esportiva
25 de julho de 2020
Por PAULO PINTO e ALMIR SILVA  I Fotos ARQUIVO e BUDOPRESS
Curitiba – PR

A falta de iniciativas de âmbito nacional foi uma das maiores preocupações apontadas pelos presidentes de quatro Conselhos Regionais de Educação Física que se reuniram virtualmente no dia 7 de julho para debater questões que envolvem os profissionais da área. Depois do encontro, realizado em forma de webinar, esses líderes contaram à Budô como estão atuando para contornar as dificuldades surgidas com o isolamento social durante a pandemia da covid-19 e recomendaram ações para fortalecer a representação da categoria.

Nelson Leme da Silva Júnior, presidente do CREF4-SP

Nelson Leme da Silva Júnior, presidente do CREF4-SP, lamentou que o Conselho Federal de Educação Física (CONFEF) tenha preferido cuidar, durante a pandemia, de temas burocráticos, como regimento eleitoral e prorrogação de mandato. E apontou o distanciamento da entidade do centro de decisão nacional, sem contato com o Executivo e o Legislativo em Brasília. “É notório que profissões com mais interlocução com os poderes conseguiram maior sucesso nas suas demandas neste período”, exemplificou.

Já o presidente do CREF12-PE, Lúcio Francisco Antunes Beltrão, referiu-se ao CONFEF como “um pouco omisso” e reclamou da ausência da entidade em Brasília. “É muito ruim estar ausente nas grandes discussões de esporte, saúde, educação, segurança pública, entre outras políticas transversais. Temos de incluir a educação física de maneira imprescindível”, argumentou.

Lúcio Francisco Antunes Beltrão, presidente do CREF12-PE

O descaso do CONFEF diante dos problemas que a convid-19 trouxe para os profissionais foi outro alvo de críticas. “No caso específico de Santa Catarina, não observei em nenhum momento qualquer ação que contribuísse para minimizar as dificuldades pelas quais passamos. Tampouco identifiquei atitude concreta em nível federal”, desabafou Irineu Wolney Furtado, presidente do CREF3-SC.

A mesma indiferença foi relatada por José Edgar Meurer, presidente do CREF2-RS, além da falta de representatividade. “Na minha opinião, a educação física deveria integrar as grandes discussões que ocorrem em Brasília, principalmente aquelas relacionadas ao esporte, à saúde e à educação, entre outros tantos temas importantes”, especificou.

Irineu Wolney Furtado, presidente do CREF3-SC

Entre as providências mais imediatas para superar a situação atual, Meurer citou, em primeiro lugar, união e diálogo, “Precisamos estar unidos para que a pandemia não se torne um problema maior do que já é, irreversível. O sistema CONFEF/CREFs deveria estar atento ao que passam professores de educação física, treinadores e personal trainers, com as escolas e as academias fechadas. No Rio Grande do Sul, estamos buscando orientação técnica para despertar diferentes habilidades e manter os profissionais motivados e atualizados.”

Em busca de identidade forte

A união de forças em prol da educação física também foi mencionada por Nelson Leme, de São Paulo. “Devemos criar uma espinha dorsal forte que sustente nossa caminhada junto à sociedade. Temos de ser parceiros dos sindicatos de empregados e patronais e de outros segmentos ligados à categoria, além do CONFEF, para suprir nossas necessidades. Onde um não pode atuar, o outro ajuda. Por exemplo, os conselhos não atuam nas questões salariais, mas os sindicatos sim. Seríamos complementares, respeitando a competência de cada um.”

José Edgar Meurer, presidente do CREF2-RS

A posição de Irineu Wolney Furtado segue a mesma linha. “Vejo necessidade de ações voltadas efetivamente ao profissional e às entidades que prestam serviço na área. É preciso oxigenar o sistema em diferentes aspectos: melhor gestão, diálogo, inovação, transparência e respeito. O momento exige novas estratégias, pessoas dinâmicas, com diferentes habilidades, motivadas, acessíveis”, esclareceu o dirigente catarinense.

Muita coisa precisa mudar, na visão de Beltrão Neto. “Precisamos de pessoas inovadoras, habilidosas, sensatas, dinâmicas, motivadas, equilibradas, acessíveis e preparadas para dialogar com associações, sindicatos, parlamentares, ministros, imprensa e toda a sociedade”, enfatizou o presidente do CREF pernambucano. “É preciso humildade para reconhecer nossas falhas e muito trabalho para entregarmos bem mais às pessoas físicas e jurídicas que constituem nosso sistema.”

Almir Silva, mediador do encontro

A educação física é a única profissão que efetivamente promove saúde.”

A permanência de um único gestor no comando da entidade nacional ao longo de sua existência também gera, no mínimo, desconforto entre os dirigentes regionais.Pessoalmente, sou muito grato a todas as pessoas que contribuíram e que contribuem com a educação física, mas tenho convicção de que o CONFEF precisa de novas pessoas, novas práticas e novas ideias”, exemplificou Beltrão Neto. “A alternância é elemento fundamental da democracia. Muito tempo no poder desvirtua, leva à perda de foco. Temos de sair da zona de conforto.”

Alternância no poder foi a expressão usada igualmente por Nelson Leme, de São Paulo. “Qualquer gestão, por melhor que seja, tem suas limitações e não é o tempo que vai supri-las. A atual direção do CONFEF contribuiu, e muito, com a profissão, mas esgotou suas possibilidades. Hoje os profissionais sentem a anemia do Conselho Federal, instituição com regras obsoletas, com uma lentidão imensa em discutir os assuntos atuais. Há uma evidente crise de representatividade”, definiu.

Irineu Wolney Furtado acredita que a categoria poderia ter avançado muito mais nesses mais de 20 anos de CONFEF/CREFs. “A alternância, muito mais de que necessária, é salutar a qualquer governo ou comando. Então, um único gestor certamente foi mais prejudicial do que benéfico ao sistema.”

Nelson Leme da Silva Júnior na webinar

Além de defender a renovação diretiva, José Edgar Meurer a considera essencial para o crescimento de qualquer entidade. Ele recomendou o envolvimento de um número cada vez maior de profissionais com o CONFEF e com os seus conselhos regionais como caminho para crescimento da categoria e sua valorização diante tanto da sociedade quanto do poder público.

Momento de decisão

Para Nelson Leme da Silva, este é o momento mais difícil enfrentado pela educação física desde a regulamentação da profissão. “Em que pese o trabalho técnico desenvolvido pelos conselhos regionais, muitos governantes, preferiram ver nossa categoria como entretenimento. Penso que a pandemia será um divisor de águas, com a sociedade reconhecendo nossa profissão como da área da saúde, não só de direito mais de fato”, previu o dirigente paulista. Ele citou o reconhecimento, hoje, de que a falta de atividade física orientada gerou ou agravou diversas enfermidades neste período de isolamento social. “Educação física é a única profissão que efetivamente promove saúde.”

O presidente do CREF gaúcho tem praticamente a mesma opinião. “Nunca antes estivemos diante de uma situação em que podemos ser reconhecidos e valorizados como agentes de saúde essenciais e imprescindíveis para toda a população.” Apesar da falta de articulação nacional, José Edgar Meurer lembrou que os conselhos regionais estão bastante empenhados nessa luta. “No Rio Grande do Sul, por exemplo, batalhamos para que a Assembleia Legislativa aprove o PL 244/2020, que inclui a educação física no rol dos serviços essenciais em todo o Estado. Mas necessitamos do apoio dos profissionais registrados, para que possamos ganhar força e gerar o impacto que queremos.”

José Edgar Meurer durante o encontro

Na avaliação de Beltrão Neto, a maioria dos prefeitos, governadores, parlamentares e a própria sociedade ainda não vê os profissionais de educação física como essenciais à vida e à saúde física e mental. “Precisamos melhorar nossa comunicação e o diálogo com os diversos setores – imprensa, políticos e população em geral – para mudar essa visão”, assinalou o presidente do CREF12-PE.

Já Irineu Wolney Furtado (CREF3-SC) acha que está evidente a necessidade de união, inovação, construção coletiva e transparência para que aconteçam conquistas efetivas e duradouras. “O maior reconhecimento da profissão e da importância dos profissionais se efetivará a partir desses pressupostos. Em nível regional essa tarefa cabe aos conselhos regionais, mas entendo pertinente que exista uma articulação nacional, o que não é percebido hoje.”

Em busca de união

Entre os participantes da webinar, é unânime o reconhecimento da contribuição do encontro de dirigentes. “Toda troca de experiências é positiva, agrega e soma. Temos excelentes conselheiros em todos os CREFs do Brasil. Precisamos conectar essas pessoas e as boas práticas”, estimulou Beltrão Neto (CREF12-PE).

Irineu Wolney Furtado na webinar que reuniu quatro dirigentes estaduais

“O intercâmbio de ações exitosas faz com que a gestão avance de forma mais célere, os conselhos regionais de todo País possuem experiências bastante positivas, que deveriam ser mais bem aproveitadas pelo conselho federal. Mas isso infelizmente não acontece e precisamos mudar essa realidade”, acrescentou Irineu Wolney Furtado (CREF3-SC)

Nelson Leme concorda: “Não há gestão sem diálogo. Ouvir as iniciativas de sucesso dos dirigentes regionais é fundamental para a construção de um sistema forte, compromissado com as expectativas dos profissionais de educação física. Tenho incorporado várias ideias que surgem nas lives. A experiência dos presidentes Lúcio, Rogério Gonçalves (Bahia), Eduardo Branco (Paraná), Patrick Aguiar (Distrito Federal), Edgar e Irineu me fizeram refletir e adotar medidas que deram certo naqueles Estados”, relatou o dirigente paulista.

A falta de uma ação agregadora em nível federal também foi mencionada por José Edgar Meurer. “Os conselhos regionais, de maneira geral, estão em constante atualização dos seus procedimentos e das suas ações para que a gestão da educação física seja aprimorada. Para atingir resultados ainda mais positivos precisamos conectar não só conselheiros e servidores, mas boas práticas, conhecimento técnico e exemplos de sucesso”, recomendou o presidente do CREF2-RS.

Lúcio Francisco Antunes Beltrão representou os dirigentes do Norte-Nordeste

Outra unanimidade entre os participantes foi o sucesso das reuniões dos dirigentes feitas por meio de plataformas digitais. “Na minha visão, o ponto alto do encontro foi a troca de experiências de CREFs de diferentes regiões do Brasil mostrando como têm trabalhado de maneira exitosa pela educação física, apesar do momento difícil que estamos enfrentando”, constatou Lúcio Francisco Antunes Beltrão Neto (CREF12-PE).

“Entendo que o destaque foi a sinergia existente entre os presidentes participantes da webinar na luta pela superação do momento de dificuldade que todos enfrentamos, não só em relação a pandemia, mas também pelo momento de transição na profissão e na gestão do sistema CONFEF/CREFs”, prosseguiu Irineu Wolney Furtado (CREF3-SC).

Para Nelson Leme da Silva Júnior (CREF4-SP), somente ouvindo e debatendo é que se pode construir uma profissão ainda mais forte. “O encontro permitiu não só a troca de experiências, mas, sobretudo, deu voz ao profissional de educação física. Ouvir suas demandas e poder prestar contas foi importante. Ficou claro que é necessário um trabalho sincronizado no sistema, uma liderança forte.”

“Conseguimos mostrar que estamos unidos no nosso trabalho em prol da educação física”, atestou José Edgar Meurer (CREF2-RS). “Apesar de muitos estarem vivendo realidades completamente diferentes, sobretudo por causa do coronavírus, o momento é de união, pois só assim poderemos superar as dificuldades impostas pelo momento de transição em que a nossa profissão se encontra.”