ITKF e CBKT chancelam a 22ª edição do Goshin-dô realizada em Alto Paraíso de Goiás

Sensei Iko Trindade e os shihans Gilberto Gaertner, Sérgio Bastos, Ugo Arrigoni e Eckner Cardoso © IG

Edição realizada no Cerrado mostrou que o Goshin-dô é mais do que um simples encontro. É uma celebração da harmonia entre corpo, mente e espírito, em sintonia com a energia vibrante da natureza.

Paulo Pinto / Global Sports
25 de abril de 2024 / Curitiba (PR)

A 22ª edição do Goshin-dô realizada de 12 a 14 de abril na cidade de Alto Paraíso de Goiás reuniu cerca de 50 faixas-pretas. Após 21 anos de existência, o tradicional encontro do karatê ITKF mudou a sede de Setiba, no Espírito Santo, para o Estado de Goiás.

Grupo de karatecas fazendo meditação na cachoeira © IG

Organizada pelo Instituto Goshin-dô, esta edição do tradicional encontro teve a chancela da International Karate Federation (ITKF) e da Confederação Brasileira de Karatê-dô Tradicional (CBKT), entidades que no encontro foram representadas pelos presidentes Gilberto Gaertner e Sérgio Bastos. Após o passamento do shihan Watanabe, o Instituto Goshin-dô passou a ser presidido pelo sensei Ulisses Damasceno, o anfitrião do evento.

Encerramento do encontro no novo Wata Dojô © IG

O Goshin-dô – um shotyugueiko com outras abordagens e enfoques – teve seu formato idealizado em 2002 pelos shihans Tasukê Watanabe e Gilberto Gaertner, com a colaboração de outros renomados professores. Segundo seus criadores, trata-se de uma forma de treinamento inspirada no trabalho do sensei Hiroshi Shirai, à qual se acrescentaram outros pilares, como a meditação, a integração dos participantes com a natureza e o seminário científico. Shihan Shirai é um importante mestre japonês do karatê tradicional Shotokan, radicado na Itália, onde estabeleceu uma das escolas do karatê tradicional mais importantes da Europa Ocidental.

Aula ministrada pelo professor Eckner © IG

Acima de tudo, o Goshin-dô é um encontro vivenciado na natureza e o treinamento ocorre em ambientes inusitados, diferentes de um dojô convencional. Devido à característica do evento, não se utiliza o karatê-gi e a troca de conhecimentos e experiências entre os participantes é um dos pontos relevantes.

Sob o Tori, localizado na entrada do novo Wata Dojô da Chapada dos Veadeiros, Jéssika Oliveira, Iko Trindade, Clóvis Astrissi e Gilberto Gaertner © IG

Após a morte do sensei Watanabe em 2020, realizaram-se três eventos na praia de Setiba, mas, por questões operacionais, o Goshin-dô foi transferido para Alto Paraíso de Goiás. O dojô original do sensei Watanabe foi desmontado com toda sua estrutura, transportada e remontada em Goiás com todo cuidado e esmero pelo sensei Ulisses Damasceno e seus colaboradores. No dojô de Alto Paraíso está também o museu do sensei Watanabe, com vários documentos e troféus, inclusive a icônica taça do IIº Campeonato Mundial de Karatê 1972, realizado em Paris, França, quando o karatê ainda era regido por uma única entidade mundial, a World Union of Karate-Do Federation (WUKO). No dojô de Alto Paraíso repousam as cinzas dos senseis Tasukê Watanabe e Yasutaka Tanaka.

Sensei Ulisses Damasceno, o presidente do Instituto Goshin-dô e anfitrião do encontro © IG

Realizado em três dias, o Goshin-dô 2024 começou no dia 12 de abril com a palestra do shihan Eckner de Pereira Cardoso Sobrinho. No dia 13 as aulas foram conduzidas pelos shihans Gilberto Gaertner e Ugo Arrigoni Neto, e os senseis Antônio Carlos Walger e Ivan Menezes.  A agenda foi concluída à noite com o encontro científico conduzido pelo sensei Iko Trindade e sensei Guaracy Tanaka.

Aula ministrada pelo sensei Ugo Arrigoni © IG

No dia 14, as aulas foram ministradas pelos shihans Gilberto Gaertner e Sérgio Bastos. O encerramento foi precedido de uma vivência de ritmo e música com o maestro Paulo Emílio e coroado com depoimentos emotivos sobre o passado e o futuro do Goshin-dô. A 23ª edição, programada para 2025, promete ser ainda mais inspiradora e acolhedora.

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Avaliações do Goshin-dô 2024

O professor doutor Gaertner avaliou positivamente o evento e enalteceu o trabalho realizado pelo sensei Ulisses e pelo comitê organizador local, responsáveis pela transferência da sede do dojô e pela realização do Goshin-dô, com a colaboração inestimável do Felipe e demais membros da equipe, além do pessoal da comunicação e do professor Átila, responsável pela logística, hospedagem e alimentação no Restaurante Bom F’ass.

“Em meio às paisagens deslumbrantes de Alto Paraíso de Goiás, os participantes experimentaram uma conexão profunda com o meio ambiente, enquanto aprimoravam suas técnicas e compartilhavam experiências.”

“Agradeço aos professores que abrilhantaram o evento com seu conhecimento e a todos os faixas-pretas que vieram de várias regiões do País e participaram brilhantemente do Goshin-dô 2024. Alto Paraíso de Goiás possui uma natureza exuberante, com vegetação e fauna típicas do Cerrado e incontáveis cachoeiras que embelezam o local. Por último faço agradecimento especial também aos proprietários da Estância Jacy por terem cedido um espaço extremamente acolhedor, muito bem cuidado e com lindas cachoeiras.”

Treino realizado na cachoeira © IG

O shihan hachi-dan (8º dan) destacou que o 22º Goshin-dô não foi apenas um encontro de karatecas, mas uma imersão na essência do karatê e na energia revitalizante da natureza. Em meio às paisagens deslumbrantes de Alto Paraíso de Goiás, os participantes experimentaram uma conexão profunda com o meio ambiente, enquanto aprimoravam suas técnicas e compartilhavam experiências.

O egrégio troféu de Campeão Mundial de Kumitê conquistado pelo sensei Watanabe conquistou em 1972 em Paris © IG

“Longe dos limites tradicionais dos dojôs, o Shotyugueiko ganhou nova dimensão, com a meditação, a integração com a natureza e o intercâmbio de conhecimentos tornando-se pilares fundamentais do evento. Inspirado no legado do sensei Hiroshi Shirai e enriquecido por décadas de evolução, o Goshin-dô é mais do que um simples encontro: é uma celebração da harmonia entre corpo, mente e espírito, em sintonia com a energia vibrante da natureza. É uma experiência que transcende os limites do karatê-dô tradicional, alimentando a alma dos participantes e renovando o compromisso com a arte marcial e com o mundo ao nosso redor”, concluiu Gaertner.

Legado Watanabe

Sensei Ulisses Damasceno avaliou que o Goshin-dô 2024 cumpriu sua missão ao oferecer conhecimento técnico e didático, além de um ambiente novo e prazeroso. “Com cerca de 50 participantes entre professores e praticantes, o evento não deixou a desejar, e apontou nova direção para o legado do sensei Watanabe”, disse o anfitrião.

Aula ministrada pelo professor Ivan Menezes © IG

Faixa preta yon-dan (4º dan), Ulisses Damasceno foi aluno de mestre Watanabe desde 1976. Em 1984 deixou Porto Alegre (RS) e foi morar com Tasukê em Goiânia. “O acompanhei até seu falecimento e fiquei responsável pela logística do Goshin-dô em todas as edições realizadas no balneário de Setiba. Considerado um filho por ele, exerci a vice-presidência do Instituto Goshin-dô e nos eventos eu ficava responsável pela logística, enquanto ele cuidava da área técnica.”

A cachoeira da Estância Jacy © IG

Sensei Ulisses reafirmou que o Goshin-dô sempre teve a CBKT e a ITKF como parceiros, sendo que sensei Gilberto Gaertner participou diretamente da criação do instituto. “Com o falecimento do mestre passei a organizar o evento e só pude fazê-lo graças à parceria das duas entidades, que ajudaram a organizar e a viabilizar a parte técnica.”

A cerimônia de abertura contou com a presença de Marcus Rinco, prefeito de Alto Paraíso de Goiás © IG

Sobre a mudança para Goiás, o professor yon-dan explicou que a decisão teve origem na memória afetiva de sua história com o mestre. “Entendi que seria melhor transferir o instituto para Alto Paraíso, na Chapada dos Veadeiros, onde teve início uma bela aventura entre o mestre e eu, quando morávamos em Goiânia. Logo me fixei no local, enquanto o mestre se mudou para Brasília. Aqui funciona a academia Watanabe, fundada em 1991 por mim e meu irmão, onde guardamos toda a memória do mestre numa espécie de museu. Encerramos um ciclo em Setiba e demos continuidade ao projeto, agora na Chapada dos Veadeiros.”

Treino de eixo, equilíbrio e endurece psicológico © IG

Para sensei Ulisses essa continuidade foi o compromisso que assumiu com seu mestre ainda vivo, de manter sua memória e seus ensinamentos. “Desmontamos o dojô de Setiba com auxílio dos karatecas Cristina e Cshuster, que moram lá, e montei outro exatamente igual, num terreno ao lado da nossa academia e que pertence ao meu irmão Átila, também faixa preta, aluno do sensei desde os 13 anos.

Memória viva

Sensei Guaracy Tanaka lembrou que a mudança sempre traz consigo uma dose de desconforto, especialmente quando se está acostumado ao que parecia ser perfeito. “O Goshin-dô, com seus renomados mestres japoneses, sempre se destacou como um evento de artes marciais verdadeiramente excepcional. Era mais do que um simples treinamento; era um espaço de acolhimento e autoaprimoramento, onde se podia abrir a mente para o novo e abraçar as inovações científicas que moldavam o caminho das artes marciais.”

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“Com a partida de Tasukê, uma grande lacuna se abriu, deixando-nos a todos sentir sua ausência física. No entanto, algo surpreendente aconteceu. Seu legado não apenas sobreviveu, mas floresceu, mantendo a essência do Goshin-dô intacta, a ponto de podermos sentir sua presença, como se ele estivesse conosco.”

Cerimônia de abertura © IG

“Em 2024,” pontuou Guaracy, “testemunhamos uma mudança significativa: o evento deixou as areias de Setiba e adentrou as terras de Alto Paraíso de Goiás, onde Tasukê havia deixado sua marca ao longo da vida. Apesar da mudança de cenário, a essência do Goshin-dô permaneceu inalterada. Sair da praia e adentrar a mata e as cachoeiras trouxe nova dimensão ao treinamento, conectando-nos mais profundamente com a natureza e proporcionando um ambiente propício à evolução pessoal.”

Professores Iko Trindade e Gilberto Gaertner © IG

Embora a ausência de Tasukê seja profundamente sentida, na avaliação de Guaracy Tanaka, o evento continua vibrante e vivo, exatamente como ele desejou antes de partir. “Agora cabe a nós manter essa chama acesa, garantindo que seu legado jamais seja esquecido e que sua dedicação a nós seja honrada por meio de nossa própria dedicação ao evento.”

Shihans Ugo Arrigoni e Eckner Cardoso © IG

“O verdadeiro significado de Oss Itetsu, expressão que descreve a personalidade de Tasukê segundo o mestre Masatoshi Nakayama, torna-se evidente: é o compromisso inabalável de perseverar, adaptar-se e prosperar, independentemente das circunstâncias”, concluiu o doutor em saúde mental, fisioterapeuta e acupunturista, faixa preta san-dan, que segue os caminhos trilhado por seu pai, shihan Yasutaka Tanaka, juu-dan (10º dan) da ITKF.

Nova geração

Em sua primeira participação no Goshin-dô, a lutadora cearense de Karate Combat na primeira liga profissional de karatê full-contact Jéssika Sthefanie Maciel de Oliveira considerou a experiência incrível.

Professores cearenses no Goshin-dô 2024 © IG

“Ter participado de um evento no qual não tinha de ficar focada numa competição, mas somente aproveitar cada troca de técnicas e de vivências que vou levar para a minha vida foi realmente muito interessante. Essa experiência me modificou internamente, pois voltei a incluir o espírito de karatê na minha rotina. Hoje ao treinar vem imediatamente à minha mente zanshin Sthefanie, presença e consciência. Ou seja, voltei mais motivada para a minha rotina, principalmente em levar essa arte que tanto amo para os esportes de contato. Eu sempre disse que o karatê era minha raiz, mas após a experiência na Chapada dos Veadeiros acrescento que o karatê é uma raiz que me une àquilo que há de divino dentro de mim.”

Jéssika Oliveira, faixa preta sho-dan, é atleta da Academia Askace de Fortaleza e vai defender o cinturão do Karate Combat em junho. Sua preparação mental para o evento está sendo realizada pelo doutor Gilberto Gaertner, que também atua como psicólogo do esporte.

Migração oportuna

Para o conceituado professor baiano Eckner de Pereira Cardoso Sobrinho, o Goshin-dô 2024 saiu da praia de Setiba e migrou para as cachoeiras de Alto Paraíso de Goiás, porém manteve a sua essência, fundamentada no pensar, estudar e praticar o karatê-dô tradicional. “Além de fomentar o clima de confraternização e amizade entre karatecas de várias gerações, o evento permite que os mais experientes transmitam o conhecimento para os mais novos que, por sua vez, dão aos mais velhos a certeza de que a tradição continua”, expôs o Profissional de Educação Física, pós-graduado em treinamento desportivo e fisiologia do exercício, diretor da Academia Piatã Fitness e hachi-dan (8º dan), membro dos shihankai da ITKF.

Samurais históricos

O professor Iko Trindade avalia que o Goshin-dô significa autoaprimoramento, o seu momento e o seu caminho. Para ele, a abordagem tradicionalista do karatê-dô enfatiza fortemente o desenvolvimento pessoal, de maneira similar ao Ethos dos samurais históricos.

Professor Gilberto Gaertner com a atleta Jéssika de Oliveira © IG

“Eram renomados guerreiros não só por suas habilidades em combate, mas também por sua dedicação ao cultivo do autocontrole, alcançado mediante práticas como a meditação e a respiração consciente. Além disso, eles valorizavam a caligrafia, utilizando kanjis para criar obras de arte, poesia e textos que refletiam ensinamentos profundos, integrando assim diversas expressões culturais em sua jornada de aprimoramento.”

Durante o Goshin-dô, segundo Trindade, observa-se um forte componente de conexão com a natureza, que é vivenciado por meio do treinamento ao ar livre, compartilhado entre amigos e momentos de meditação em ambientes naturais. Além disso, há um espaço para discussões que envolvem aspectos científicos, buscando uma compreensão mais ampla do ser humano e de sua interação com o mundo.

Urnas nas quais repousam as cinzas dos shihans Tasukê Watanabe e Yasutaka Tanaka © IG

A 22ª edição do encontro Goshin-dô ocorreu na Chapada dos Veadeiros, consolidando esse evento como um marco importante para o karatê-dô tradicional no Brasil. Sua idealização ocorreu há quase três décadas por mestres conhecidos, como Tasukê Watanabe, Hiroshi Shirai e Gilberto Gaertner, com o objetivo de promover a integração de diferentes aspectos do ser humano por meio da prática do karatê-dô.

“Acredito que o Goshin-dô oferece uma oportunidade ímpar para o autoconhecimento e o desenvolvimento pessoal, além das competições e da prática nos dojôs, fazendo dele um dos eventos mais significativos para a comunidade do karatê-dô tradicional do Brasil”, concluiu Trindade que é faixa preta roku-dan (6° dan), profissional de educação física, especialista em treinamento esportivo, mestre em Saúde Pública e doutor em Saúde Coletiva. Trindade é também vice-presidente e diretor Científico da CBKT e diretor executivo do Iko-Dô escola de karatê tradicional.

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