Kata como legado: o fomento da cultura do judô forjando campeões e unindo gerações

Pódio geral com representantes das três primeiras colocadas: Associação de Judô Alto da Lapa, Sociedade Esportiva e Recreativa Alvi Celeste e Associação Yamazaki de Judô © Maria Clara Melo

Com 13 anos de trabalho contínuo, a equipe da SER Alvi Celeste transformou o kata em instrumento de excelência técnica, formação humana e união entre gerações.

Por Paulo Pinto / Global Sports
Curitiba, 28 de abril de 2025

Mais do que uma competição, a Copa São Paulo de Kata 2025 foi um encontro de gerações, culturas e tradições em torno da essência do judô. Em meio a duplas formadas por toris e ukes vindos de diversas regiões do Brasil e até da Argentina, a equipe da Sociedade Esportiva e Recreativa Alvi Celeste brilhou ao conquistar o vice-campeonato, coroando uma trajetória de 13 anos de dedicação ao kata como ferramenta de formação técnica e humana.

Liderado pelo professor kodansha shichi-dan (7º dan) Wagner Antônio Vettorazzi, o projeto de São Caetano do Sul reafirma que o verdadeiro legado do judô transcende medalhas: ele se constrói no caráter, na união e na continuidade dos princípios que moldam campeões dentro e fora dos tatamis.

Juízes e atletas perfilados para o rei inicial © Maria Clara Melo

Realizada no Ginásio Poliesportivo Municipal Adib Moises Dib, em São Bernardo do Campo, a edição deste ano da Copa São Paulo de Kata reuniu duplas de alto nível técnico, consolidando o evento como o maior desta modalidade no país.

Comandada pelo sensei Wagner Vettorazzi, a equipe da Sociedade Esportiva e Recreativa Alvi Celeste conquistou o vice-campeonato ao superar fortes adversários de vários estados brasileiros. “Participamos com todos os atletas do trabalho de formação, onde o mais novo tem 13 anos e o mais velho, 62 anos. Tenho muito orgulho dessa equipe!”, comemorou o chefe da equipe sul-caetanense.

Wagner Vettorazzi e Diogo Nascimento executando o ju-no-kata © Maria Clara Melo

É desse trabalho contínuo que surgem as duplas que representam São Caetano do Sul em competições de grande porte, como Jogos Regionais, Jogos Abertos, Campeonatos Paulista e Brasileiro, além de eventos internacionais, como Pan-Americanos e Mundiais. Entre os principais nomes da equipe estão Taluan Nogueira, Carlos Pereira, Raquel Palasio, Ivy Vettorazzi e Vitória Silva.

São Caetano do Sul sempre teve uma tradição no estudo do kata, mas o novo modelo implantado em 2012 reforçou essa prática, valorizando a verdadeira essência do kata: o aprimoramento técnico e a transformação social. A partir desse projeto, jovens a partir de 12 anos puderam integrar os treinamentos, impulsionando também a formação de equipes competitivas para representar a cidade em eventos importantes.

Eduardo Barbosa e Gabriel Metestaine, campeões do ju-no-kata dangai, formam uma dupla já consagrada no cenário nacional, com o título brasileiro conquistado em 2023 e o vice-campeonato em 2024 © Maria Clara Melo

O envolvimento dos pais foi outro marco desse processo. Através do ju-no-kata, muitos foram convidados a participar dos treinos, inicialmente sem judogi, e acabaram se integrando de forma definitiva. Esse movimento, que começou de maneira simples, culminou na participação ativa de alguns desses pais na Copa São Paulo, onde subiram ao pódio e contribuíram diretamente para a conquista histórica da SER Alvi Celeste.

Após 13 anos de trabalho árduo e dedicado, o resultado obtido neste ano representa um capítulo inesquecível na história do judô de São Caetano do Sul.

Marcelo de Oliveira Gomes e Cristiane Neander Gomes, campeões do ju-no-kata misto dangai, formam uma dupla dentro e fora dos tatamis; ele com 48 anos, ela com 44, atualmente diretora do departamento de judô do Alvi Celeste © Maria Clara Melo

Treinamento diário

A equipe da SER Alvi Celeste treina todos os dias, com foco especial no desenvolvimento do kata às segundas-feiras, das 18h30 às 21h30, no Complexo José Tortorello (antiga Associação Desportiva São Caetano).

Os professores Renato Mazzoni e Fabiano Ferreira são responsáveis por auxiliar nesse trabalho de formação, especialmente entre os atletas mais jovens, preparando-os para posteriormente integrarem a equipe de competição.

Marco Cezário e Pedro Veras, dupla terceira colocada no ju-no-kata dangai, formam uma parceria de gerações; Pedro, de 16 anos, e Marco, médico cirurgião de 47 anos, começou no ju-no-kata, se apaixonou pela prática e subiu ao pódio duas vezes, também conquistando medalha no ju-no-kata misto ao lado da esposa Shirley Cezário, de 48 anos, enfermeira; o casal iniciou no judô incentivado pelo filho Saulo Cezário, que também competiu no nage-no-kata dangai masculino © Maria Clara Melo

Além dos treinos no complexo, os atletas também mantêm uma rotina diária de atividades na própria SER Alvi Celeste, em vários horários. Todos os treinamentos são abertos ao público e gratuitos, oferecidos por meio do Programa Esportivo Comunitário (PEC), mantido pela Secretaria de Esporte, Lazer e Juventude (SELJ) da Prefeitura de São Caetano do Sul, e contemplam crianças, jovens e adultos.

Uma luz de esperança para o judô

À frente de uma equipe que alia a experiência de judocas com experiência internacional à energia renovadora de jovens atletas da classe Sub 13 e de pais que abraçaram a prática do kata, o professor Wagner Antônio Vettorazzi faz uma reflexão profunda sobre a realidade do kata e o trabalho de formação desenvolvido em sua equipe.

Carlos Pereira e Taluan Nogueira executando o Kodokan Goshin Jutsu © Maria Clara Melo

“O trabalho que nós estamos fazendo é, para mim, um sinal e também uma luz de esperança de que o judô não vai morrer. Digo isso porque, nesses meus 53 anos nos tatamis, encontrei grandes professores — alguns já falecidos — que expressavam o mesmo temor: o de que o nível técnico do judô competitivo, o shiai, está cada dia mais fraco. E essa fragilidade pode, em última instância, levar o judô a perder a dinâmica, a beleza e a plasticidade que sempre caracterizaram a nossa modalidade”, analisou o sensei que prosseguiu refletindo sobre a importância do kata.

Cristiane Neander Gomes, 44 anos, e Maria Vitória Silva, 18, formam a dupla campeã do ju-no-kata feminino © Maria Clara Melo

“Muitos de nós, praticantes de kata, entendemos que, quando um judoca afirma que não pratica o kata porque não gosta, isso é, na verdade, uma inverdade. Na maioria das vezes, ele não pratica porque não tem capacidade de se aprofundar em uma ação técnica tão específica. Estudar e praticar o kata é extremamente complicado: é difícil, cansativo e, muitas vezes, maçante. Mas, em contrapartida, proporciona um entendimento muito mais amplo não apenas da técnica em si, mas da pureza do judô. Acredito que, ao fomentar o estudo do kata, estamos permitindo que o shiai também evolua tecnicamente e, com isso, possa seguir adiante.”

“As medalhas atestam que sua equipe está no caminho certo e atingindo o objetivo maior: fomentar a cultura judô por meio do kata, hoje praticada até mesmo por crianças.”

Vettorazzi explicou que sua visão se fundamenta na natureza do kata como verdadeiro pilar do judô: a forma tradicional e estruturada de ensino da modalidade, composta por sequências pré-determinadas de movimentos e técnicas. Cada kata foi criado para transmitir princípios fundamentais da arte, como a aplicação correta de força, equilíbrio, tempo e distância, além dos valores filosóficos que permeiam o judô. Existem vários tipos de kata, cada um com um objetivo de ensino específico, como o nage-no-kata (técnicas de projeção) e o katame-no-kata (técnicas de controle no solo).

Roberto Paquola Júnior e Júlio Moreira, dupla vice-campeã no nage-no-kata sub 15 © Maria Clara Melo

“Fui competidor e adoro a competição do shiai, mas se focarmos somente no shiai, não vamos chegar a lugar algum. Realizo esse trabalho há 13 anos, mas estudo kata desde o início da minha trajetória no judô. Quanto às escolas e equipes que seguem essa linha, percebo que as pessoas só passam a dar credibilidade quando um atleta vai para um mundial — o que para nós já é uma realidade. No entanto, valorizo imensamente conquistas como este vice-campeonato da Copa São Paulo, em que ficamos atrás apenas da Associação de Judô Alto da Lapa, a principal e mais laureada escola de kata do Brasil, detentora de vários títulos mundiais.”

Para sensei Vettorazzi, mais importante do que os resultados é o fato de que as medalhas confirmam que sua equipe trilha o caminho certo e cumpre o objetivo maior: fomentar a cultura do judô por meio do kata, hoje praticada até mesmo por crianças.

Diogo do Nascimento e Raquel Palasio terceiros colocados no nage-no-kata yudansha misto © Maria Clara Melo

“Este resultado motivou toda a equipe. Ministrar aulas de kata não é fácil. É necessário criar instrumentos para manter o grupo motivado e inserir a ludicidade em um ambiente que, à primeira vista, não parece permitir isso — mas se não for assim, eles desistem. O nage-no-kata, por exemplo, é muito exigente: envolve muitas quedas e técnicas difíceis de executar. Por isso, considero-me privilegiado por estar colhendo os frutos desse trabalho. Sei que não posso deixar isso subir à cabeça, mas também não posso diminuir essa conquista, principalmente porque formamos uma equipe que lutou e vibrou muito para ser bem-sucedida. Tenho a convicção de que, com este vice-campeonato e o reconhecimento da Revista Budô — a principal e mais importante publicação especializada do Brasil —, nossa equipe alcançará um novo patamar.”

Com histórico no circuito nacional, Eduardo Barbosa e Maria Vitória Silva, campeões do nage-no-kata dangai misto, conquistaram o terceiro lugar no Campeonato Brasileiro de 2024 © Maria Clara Melo

Vettorazzi concluiu reforçando a importância da prática do kata na formação do judoca. “O kata tem um papel essencial no desenvolvimento integral do praticante. Por meio do estudo sistemático e estruturado, aprimoramos a precisão técnica, corrigindo a postura, o deslocamento e a execução dos movimentos. Simultaneamente, ampliamos nossa compreensão dos princípios que fundamentam cada técnica, assimilando não apenas a forma, mas o propósito de cada ação. O treinamento de kata também desenvolve a sensibilidade e o timing, indispensáveis para a correta percepção do momento oportuno de aplicação das técnicas. Exige disciplina e concentração, reforçando o respeito ao parceiro, a atenção aos detalhes e a busca constante pela excelência. Muitos dos fundamentos assimilados no kata reverberam na prática do randori, enriquecendo a capacidade de adaptação e resposta em situações de combate, ao mesmo tempo em que preservam a essência filosófica e tradicional do judô. Sua prática representa, portanto, não apenas uma ferramenta técnica, mas um instrumento de formação ética e de transmissão dos valores que sustentam a arte criada por Jigoro Kano.”

Equipe

A equipe de São Caetano do Sul foi composta pelos judocas: Ariadne Alfaro Rio, Carlos Alberto Pereira, Cristiane Neander Gomes, Diogo Heitor do Nascimento, Edson da Silva Mello Junior, Eduardo Augusto Scarante Barbosa, Erick Akira Harakaki, Fernanda Fernandes Amigo, Fernanda Vitória Queiroz Teixeira Amorim, Gabriel Alves Metestaine, Gabriel Mosca Vieira, Guilherme Miguel Carreira, Gustavo Henrique Almeida Alves, João Pedro Sabino de Moraes, Julio Cesar Aires Moreira, Lucas Andrade Pereira, Marcelo de Oliveira Gomes, Marco Antonio Cezário de Melo, Maria Clara Mosca Vieira, Maria Vitória Deimondes da Silva, Pedro Silva Veras, Raquel Gardini Sanches Palasio, Roberto Cezar Paquola Junior, Saulo Felix Cezário de Melo, Shirley Felix Cezário de Melo, Taluan Nogueira, Wagner Vettorazzi e Willy Freitas Santana.

https://www.originaltatamis.com.br/

A visão dos medalhistas: o kata como instrumento de formação e legado

Parte fundamental da conquista histórica do vice-campeonato na Copa São Paulo de Kata 2025, os atletas da Sociedade Esportiva e Recreativa Alvi Celeste não apenas representaram São Caetano do Sul nos tatamis, mas também simbolizaram o êxito de um projeto que tem no kata seu principal instrumento de formação técnica, ética e humana.

Representando diferentes gerações e trajetórias dentro do judô, alguns dos medalhistas compartilham a seguir suas percepções sobre a prática do kata e o impacto dessa experiência em seu desenvolvimento como judocas e cidadãos. Seus depoimentos reforçam que o verdadeiro legado construído pela equipe ultrapassa as conquistas esportivas, fortalecendo o fomento da cultura do judô e assegurando a continuidade dos princípios que moldam gerações dentro e fora dos tatamis.

Marco Cezário e Shirley Cezário, dupla terceira colocada no ju-no-kata misto dangai © Maria Clara Melo

O kata na formação técnica e mental dos competidores

Vice-campeão pan-americano de kata, Taluan Nogueira, de 28 anos, destacou que a prática do kata sempre o ajudou a compreender melhor os fundamentos teóricos do judô, principalmente no que diz respeito à aplicação eficiente das técnicas utilizando o mínimo de esforço, princípio essencial da modalidade. Além disso, ressaltou a importância do kata no aprimoramento da postura e da base, aspectos que sempre o auxiliaram como atleta. Para Taluan, pequenos detalhes que fazem toda a diferença muitas vezes só são perceptíveis ou treinados no kata. Ele afirmou que esse tipo de treinamento e competição contribuiu de forma significativa para o aperfeiçoamento de suas técnicas, da postura e da concentração, uma vez que no kata o mínimo detalhe é decisivo para a excelência da execução.

Pódio do ju-no-kata dangai misto © Maria Clara Melo

Carlos Alberto Pereira, de 30 anos, também vice-campeão pan-americano de kata, reforçou a importância do trabalho focado nos fundamentos do judô. Segundo ele, o kata desenvolve de maneira repetitiva a forma correta de cada técnica, abrangendo aspectos como kumi-kata, kuzushi, tsukuri e kake, o que proporciona uma compreensão mais profunda dos movimentos. Carlos relatou que, ao intensificar os treinos de kata, observou uma grande evolução nas técnicas aplicadas no randori, justamente pelo domínio dos princípios técnicos exigidos. No aspecto mental, ele destacou que a prática contínua do kata fortalece a confiança, a segurança e a concentração, já que o desafio constante de buscar a perfeição técnica impõe um alto grau de foco e disciplina.

Marcelo de Oliveira Gomes, Cristiane Neander Gomes, Marco Cezário e Shirley Cezário exibem as medalhas conquistadas na Copa São Paulo de Kata 2025 © Maria Clara Melo

Do apoio à prática: como o kata transformou a dinâmica familiar

Entre os pais que se envolveram tão profundamente com o judô a ponto de se tornarem atletas de kata, Marcelo de Oliveira Gomes, campeão da Copa São Paulo de Kata 2025 e esposo de Cristiane Neander Gomes, relatou que essa trajetória provocou uma transformação pessoal intensa, dentro e fora do dojô.

Segundo ele, o processo lhe ensinou que o verdadeiro caminho está no entendimento, permitindo superar tanto as dificuldades quanto as próprias limitações. Cada desafio enfrentado trouxe lições valiosas e impactou de maneira decisiva sua jornada de crescimento. Marcelo ressaltou que, em relação à família, as experiências compartilhadas no judô fortaleceram ainda mais seus laços, trazendo mais compreensão, paciência e união.

Pódio do nage-no-kata yudansha masculino, com Taluan Nogueira e Carlos Alberto Pereira como vice-campeões; Wagner Tadashi Uchida e Paulo Roberto Ferreira como campeões; e Fabiano Rodrigues de Barros e Wagner João Mariano na terceira colocação © Maria Clara Melo

“Essas vivências nos aproximaram e nos fizeram perceber o quanto é importante estar unido, apoiando uns aos outros com amor e respeito. Sou grato por tudo que o judô e essa caminhada nos proporcionaram. Cada passo, cada lição, me ajudou a ser uma pessoa melhor, mais consciente e mais conectada com o que realmente importa: o amor, a compreensão e a união da nossa família”, destacou.

Pódio do kodokan goshin jutsu, com Ygor Lima Marson e Sidney Massayuki Fukayama como vice-campeões, Wagner Tadashi Uchida e Roger Tsuyoshi Uchida como campeões, e Carlos Alberto Pereira e Taluan Nogueira na terceira colocação © Maria Clara Melo

Cristiane Neander Gomes, campeã da Copa São Paulo de Kata 2025 em duas categorias e esposa de Marcelo, também compartilhou o impacto do judô em sua vida. Para ela, a prática se transformou em uma verdadeira paixão pessoal. A cada treino, o judô a ensina a ser uma pessoa melhor e a encarar os desafios da vida com novos olhos, mostrando que, apesar das limitações, é possível ir além do que se imagina — basta acreditar em si mesmo. Cristiane fez questão de ressaltar o papel fundamental do sensei Wagner Vettorazzi nesse processo, afirmando que, com sua dedicação e sensibilidade, ele abriu caminhos para que todos pudessem acreditar em seu próprio potencial. Dentro da família, o judô também criou uma conexão ainda mais forte, fortalecendo a união e o orgulho mútuo.

Ariadne Alfaro e Willy Freitas Santana do Bushikan Dojô de Santo André, dupla terceira colocada no nage-no-kata misto dangai © Maria Clara Melo

“As trocas de experiências, os aprendizados compartilhados e, principalmente, o apoio mútuo, fizeram com que nos tornemos ainda mais unidos e orgulhosos uns dos outros. Tudo isso nos fortaleceu não só como praticantes, mas como família. E por isso, sou eternamente grata”, afirmou.

Novas gerações: a descoberta do kata e a convivência com a experiência

Entre os jovens talentos da equipe, Júlio César Aires Moreira, vice-campeão da Copa São Paulo de Kata 2025, destacou que o que mais aprecia na prática do kata é a possibilidade de identificar e corrigir os próprios erros com naturalidade e aprendizado.

Pódio do nage-no-kata classe dangai misto com Lavínia Gaspar Carvalho e Lucas Henrique Silvério Gomes vice-campeões, Eduardo Augusto Scarante Barbosa e Maria Vitória Deimondes da Silva campeões, e Ariadne Alfaro e Willy Freitas Santana terceiros colocados © Maria Clara Melo

“O que eu mais gosto é o contato, cair, olhar e falar ‘opa, isso aqui está errado’ ou ‘errei nisso, errei naquilo’.” Para ele, conviver com atletas mais velhos é uma oportunidade enriquecedora, pois permite absorver conhecimentos acumulados em muitos anos de treino, o que contribui para sua evolução como atleta e como judoca.

Roberto Paquola Júnior, também vice-campeão da Copa São Paulo de Kata 2025, reforçou a importância do kata não apenas como prática técnica, mas como instrumento de preparação para o shiai, o judô competitivo.

Duplas do ju-no-kata dangai masculino Eduardo Barbosa e Gabriel Metestaine, Marco Cezário e Pedro Veras, com sensei Wagner Vettorazzi © Maria Clara Melo

“O que eu mais gosto no kata é que ele nos ensina não só a prática, mas também a usar as formas do kata no treinamento para o shiai.” Roberto afirmou se sentir privilegiado por treinar ao lado de colegas mais velhos e experientes, reconhecendo que essa convivência acelera seu aprendizado e aprimora seu desempenho nos tatamis.

Pódio do ju-no-kata dangai feminino com Gabriela Minami de Barros Hirakawa e Karina Ritomi Nakanishi Ronsisvalle vice-campeãs, Cristiane Neander Gomes e Maria Vitória Deimondes da Silva campeãs, e Maristela Helechyj e Taisa Mercês Móris terceiras colocadas © Maria Clara Melo

Dedicação e legado: como o kata molda vidas dentro e fora dos tatamis

Conciliando uma rotina profissional exigente com a prática do judô, Marco Antônio Cezário de Melo Júnior, médico cirurgião, relatou que a prática do kata se tornou um dos pilares para manter seu equilíbrio físico e mental. Segundo ele, o que mais o motiva a perseverar na disciplina é justamente sua dupla função: exercitar o corpo e a mente de forma intensa, em uma atividade que ele compara ao Pilates, mas com a riqueza filosófica única do judô. Marco treina o ju-no-kata junto com sua esposa, experiência que considera extremamente gratificante, especialmente pela evolução conjunta na harmonia e na sincronia dos movimentos, mesmo com diferenças de tamanho, peso e idade.

Pódio do nage-no-kata misto yudansha © Maria Clara Melo

“É um exercício que exige esforço. Sempre terminamos com aquela sensação gostosa de dever cumprido — e com uma boa dose de suor, que prova o trabalho físico envolvido”, comentou. Como médico, ele destacou os benefícios do kata para a saúde cardiovascular, para a mobilidade e para o controle do estresse, ressaltando que a cadência precisa e a natureza meditativa do kata funcionam como um antídoto contra a correria do dia a dia.

Para Marco, a disciplina aprendida no kata reflete diretamente na vida profissional, ensinando a agir com paciência e técnica — qualidades igualmente essenciais na prática médica, onde gestos simples exigem anos de refinamento. Compartilhar essa trajetória com a esposa e acompanhar o filho no judô competitivo, segundo ele, torna essa jornada ainda mais especial.

Pódio do nage-no-kata dangai feminino com Margareth Regina Felício Garcia da Silveira e Vívian Felício Guedes Garcia da Silveira vice-campeãs, Maria Eduarda Souza da Cunha e Jennifer Quezia de Faria Souza campeãs, e Maria Clara Mosca Vieira e Fernanda Fernandes Amigo terceiras colocadas © Maria Clara Melo

“O ju-no-kata é uma lição de adaptação e parceria — valores que transcendem o tatami. No fim, o kata não é apenas um exercício ou uma tradição: é uma forma de manter o corpo ativo, a mente serena e os laços familiares ainda mais fortes”, completou.

Shirley Felix Cezário de Melo, enfermeira, reforçou a importância da prática do kata em sua rotina intensa e desafiadora. Ela relatou que o ju-no-kata a ajuda a manter o equilíbrio emocional, a disciplina e a capacidade de tomar decisões rápidas, qualidades fundamentais tanto no tatami quanto no ambiente hospitalar. Praticante há três anos, Shirley destacou que, mesmo diante de todas as responsabilidades, o kata lhe proporciona clareza mental, autocontrole e foco, valores essenciais para sua vida pessoal e profissional. Além disso, ela ressaltou a importância de compartilhar essa jornada com seu filho e seu marido, o que representa uma motivação a mais para continuar evoluindo.

Pódio geral com as três equipes primeiras colocadas na Copa São Paulo de Kata 2025 © Maria Clara Melo

“Aprender e reforçar os valores do judô, como respeito, persistência e disciplina, me inspira a seguir crescendo como atleta, mãe, esposa e profissional”, afirmou. Para Shirley, o kata é mais do que uma prática física: é um caminho de autoconhecimento e fortalecimento interno que impacta diretamente todas as áreas de sua vida.

Pilares da história: a construção e a força de um projeto vencedor

Entre os membros mais antigos da equipe, Renato Mazzoni, faixa preta go-dan (5º dan), profissional de Educação Física, psicopedagogo e psicomotricista pela ABA (Análise do Comportamento Aplicada ao Transtorno do Espectro Autista), destacou que acompanha o trabalho do sensei Wagner Vettorazzi há mais de três décadas, desde seus primórdios com crianças até a consolidação atual do projeto. Segundo Renato, a força e a referência da equipe na formação de praticantes de kata repousam sobre uma base multifacetada, onde dedicação e persistência são pilares fundamentais. No entanto, ele enfatiza que o sucesso vai além da aplicação constante de esforço, abrangendo uma visão estratégica e uma abordagem holística da formação de atletas.

Feliz pela conquista inédita, sensei Wagner Vettorazzi ergue o troféu de vice-campeão da Copa São Paulo de Kata 2025 © Maria Clara Melo

O investimento na formação desde a base, iniciando o projeto com crianças, reflete uma perspectiva de longo prazo, plantando as sementes do sucesso futuro. Essa formação desde a infância não apenas aperfeiçoa a técnica, mas também internaliza valores como disciplina, respeito e trabalho em equipe, criando um alicerce sólido para o desenvolvimento de atletas de alto rendimento e para a construção de equipes coesas.

Renato Mazzoni destacou ainda a importância da construção de uma forte cultura de equipe e união ao longo dos anos, promovida pela liderança de Vettorazzi. O ambiente de apoio mútuo e colaboração, baseado em valores compartilhados, potencializa o desempenho individual e coletivo, transformando o grupo em uma unidade resiliente. A influência do sensei vai além do ensino técnico, abrangendo a transmissão de conhecimento e filosofia, moldando atletas não apenas em suas habilidades físicas, mas também na compreensão mais profunda da arte marcial.

Equipe da Sociedade Esportiva e Recreativa Alvi Celeste com as medalhas e o troféu de vice-campeão © Maria Clara Melo

A capacidade de adaptação contínua diante das mudanças no cenário esportivo e a busca incessante por aprimoramento garantem a relevância e a competitividade do projeto. Para Renato, o legado de conquistas e a reputação construída ao longo do tempo consolidam a iniciativa de Vettorazzi como uma referência incontestável na formação de equipes de kata.

“A dedicação e a persistência capturam a essência de um trabalho construído com paixão e visão de longo prazo, mas é a combinação de todos esses elementos que explica verdadeiramente a solidez e o impacto duradouro desse projeto”, concluiu.

Fabiano Ferreira, faixa preta ni-dan (2º dan) e profissional de Educação Física, também analisou os fatores que explicam o sucesso do projeto liderado por Wagner Vettorazzi. Para ele, o diferencial foi a iniciativa do sensei em incentivar a prática do kata já entre iniciantes, a partir da faixa amarela.

Fabiano destacou que, desde cedo, os praticantes são introduzidos de maneira lúdica ao kata, ajustando o modo de caminhar, o kumi-kata correto e a forma de cumprimento, antes mesmo de iniciarem as projeções propriamente ditas. Essa abordagem permite que os alunos se familiarizem progressivamente com as técnicas, memorizem os nomes, fortaleçam os laços com os colegas de treino e criem a possibilidade de formar duplas desde a base, o que futuramente pode se consolidar em parcerias competitivas.

“Assim tem sido, e o sensei Wagner, sempre com sua maneira carinhosa de ensinar e com o olho clínico de um grande conhecedor e estudioso do judô e seus katas, tem colhido os frutos de seu trabalho ao longo desses anos, tanto com os resultados nas competições quanto na formação de judocas com uma base sólida”, afirmou Fabiano.

Perpetuação da cultura e dos valores essenciais do judô

Mais do que um vice-campeonato na maior competição de kata do país, o que a equipe da Sociedade Esportiva e Recreativa Alvi Celeste conquistou foi a perpetuação dos valores essenciais do judô: a busca contínua pela excelência, o respeito mútuo, a superação de limites pessoais e a construção de laços verdadeiros dentro e fora dos tatamis.

O trabalho liderado pelo sensei Wagner Vettorazzi vai além da formação de atletas e da conquista de resultados expressivos: ele tem como eixo central o fomento da cultura do judô, preservando seus fundamentos técnicos, filosóficos e sociais e garantindo sua transmissão às novas gerações.

Ao semear o kata como instrumento de formação técnica e humana, Vettorazzi e seus alunos reafirmam na prática o princípio de Seiryoku Zen’yo — o melhor uso da energia — e de Jita Kyoei — a prosperidade e o bem-estar mútuos.

É nesse espírito que a história escrita em São Caetano do Sul transcende a conquista esportiva, tornando-se um exemplo de como o judô, quando vivido em sua essência, transforma indivíduos, famílias e comunidades para sempre.

Confira a classificação individual em todas categorias da Copa São Paulo de Kata, clicando AQUI.

Conquistas da vice-campeã

JU-NO-KATA DANGAI FEMININO
Cristiane Neander Gomes e Maria Vitória Deimondes – Campeãs

JU-NO-KATA DANGAI MASCULINO
Eduardo Augusto Barbosa e Gabriel Alves Metestaine – Campeões
Marco Antônio Cezário e Pedro Silva Vera – 3º Colocados

JU-NO-KATA DANGAI MISTO
Cristiane Neander Gomes e Marcelo de Oliveira Gomes – Campeões
Marco Antonio Cezário e Shirley Felix Cezário – 3º Colocados

KODOKAN GOSHIN-JUTSU
Carlos Alberto Pereira e Taluan Nogueira – 3º Colocados

NAGE-NO-KATA DANGAI FEMININO
Maria Clara Vieira e Fernanda Fernandes Amigo – 3ª Colocadas

NAGE-NO-KATA DANGAI MISTO
Eduardo Augusto Barbosa – Maria Vitória Deimondes – Campeões

NAGE-NO-KATA YUDAN MASCULINO
Carlos Alberto Pereira e Taluan Nogueira – Vice-campeões

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