Benefícios da prática do karatê no combate à obesidade

A prática do kumitê combina estímulos aeróbicos e anaeróbicos, elevando o gasto calórico e favorecendo a queima de gordura corporal © Depositphotos

Disciplina estruturada e de alta intensidade, o karatê se consolida como ferramenta eficaz no enfrentamento da obesidade e na promoção de saúde integral.

Por Carlo Victorelli
Curitiba, 17 de junho de 2025

A obesidade é uma das condições de saúde mais preocupantes do século XXI, afetando milhões de indivíduos em todo o mundo. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a obesidade é um dos mais graves problemas de saúde que temos para enfrentar. A estimativa é de que, até 2025, 2,3 bilhões de adultos estejam acima do peso, sendo 700 milhões desses com obesidade, caracterizada por um índice de massa corporal (IMC) acima de 30.

No Brasil, a situação também é alarmante. Essa doença crônica aumentou 72% nos últimos treze anos, saindo de 11,8% em 2006 para 20,3% em 2019, conforme dados da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel). A prevalência de obesidade é semelhante entre homens e mulheres, embora nas mulheres ela diminua com o aumento da escolaridade.

Entre crianças brasileiras de 5 a 9 anos, 12,9% apresentam obesidade, enquanto a taxa é de 7% entre adolescentes de 12 a 17 anos.

Esses números refletem um estilo de vida sedentário e o aumento do consumo de alimentos ultraprocessados. Diante desse cenário, a prática de atividades físicas como o karatê surge como uma alternativa eficaz no combate à obesidade, contribuindo tanto para a saúde física quanto para o bem-estar mental e social dos praticantes.

Obesidade: um problema global

A obesidade é caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, geralmente medido pelo índice de massa corporal (IMC). De acordo com estimativas para 2025, aproximadamente 55,4% da população brasileira estará com excesso de peso, sendo a prevalência ligeiramente maior entre os homens (57,1%) do que entre as mulheres (53,9%). Esses números refletem uma tendência crescente e preocupante que requer uma abordagem integrada de saúde pública.

A obesidade é impulsionada por fatores como mudanças nos hábitos alimentares e no estilo de vida. A maior disponibilidade de alimentos ultraprocessados, ricos em calorias e pobres em nutrientes, combinada com o aumento do sedentarismo, tem contribuído significativamente para a expansão dessa condição. Além disso, aspectos socioeconômicos desempenham um papel relevante, pois populações com menor nível de escolaridade têm menos acesso à informação e às ferramentas necessárias para adotar um estilo de vida saudável.

A intensidade dos movimentos no kumitê contribui para a redução da gordura visceral e melhora da sensibilidade à insulina © Depositphotos

Os impactos da obesidade não são apenas individuais, mas também coletivos. Esse problema é um dos principais fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes tipo 2, hipertensão e doenças cardiovasculares. A previsão é que esses problemas aumentem a carga sobre os sistemas de saúde pública, demandando investimentos significativos em prevenção e tratamento.

No Brasil, iniciativas como o Vigitel (Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas) fornecem dados essenciais para a formulação de políticas públicas. Essas políticas devem incluir não apenas intervenções individuais, mas também esforços comunitários e governamentais para reduzir a prevalência da obesidade.

Por fim, é crucial enfatizar que o combate à obesidade exige uma abordagem multidisciplinar. Isso inclui a promoção de atividades físicas regulares, como o karatê, que oferece benefícios significativos tanto no controle do peso quanto na melhoria da saúde geral. Aliada à educação alimentar e à conscientização sobre a importância de um estilo de vida ativo, a prática do karatê pode desempenhar um papel crucial na reversão das taxas crescentes de obesidade no Brasil e no mundo.

Efeitos aeróbicos e anaeróbicos

O karatê é uma arte marcial amplamente reconhecida por seus benefícios abrangentes à saúde, combinando técnicas de socos, chutes e movimentos defensivos. Essa prática promove não apenas o desenvolvimento físico, mas também mental, integrando disciplina, autocontrole e resiliência emocional. A versatilidade do karatê faz dele uma opção atrativa para indivíduos que buscam aliar diversão, disciplina e resultados concretos em suas condições de saúde física e psicológica.

Além disso, sua capacidade de envolver praticantes em diferentes níveis de aptidão física o torna acessível e inclusivo para diversas faixas etárias e condições de saúde (WILMORE; COSTILL, 2005).

A prática do karatê é particularmente eficaz para aqueles que desejam melhorar sua condição física e combater o excesso de peso. Isso ocorre devido à combinação natural de atividades aeróbicas e anaeróbicas nos treinos, o que proporciona uma série de benefícios significativos. Movimentos rápidos e intensos, como chutes, socos, esquivas e bloqueios, elevam consideravelmente a frequência cardíaca, aumentando o gasto energético e promovendo a queima de calorias. A intensidade desses movimentos, quando realizada de maneira consistente, favorece a redução do percentual de gordura corporal e melhora a composição corporal de maneira sustentável (FRANCHINI; TAKITO; NAKAMURA, 2009).

Treinos de kumitê favorecem a preservação da massa muscular durante o emagrecimento — fator essencial para o controle de peso a longo prazo © Depositphotos

Os treinos técnicos e de resistência do karatê contribuem para o fortalecimento muscular de forma abrangente. Durante as aulas, os praticantes trabalham de maneira integrada diversos grupos musculares, desde os membros inferiores, responsáveis pelos chutes, até os membros superiores e o tronco, que garantem estabilidade e potência nos golpes. Esse desenvolvimento muscular não apenas aumenta a força e a resistência física, mas também potencializa a taxa metabólica basal (TMB), permitindo que o organismo continue a queimar calorias mesmo em repouso. Essa característica é essencial para o controle de peso a longo prazo e para a prevenção de doenças relacionadas à obesidade (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2015).

Outro fator relevante é a variabilidade dos treinos no karatê, que incluem sequências de katas (movimentos predefinidos) e combates simulados, também conhecidos como kumitês. Essas atividades garantem um treinamento completo e desafiante, mantendo o corpo em um estado de alta demanda energética. A diversidade das práticas contribui para a motivação e o engajamento contínuo dos praticantes, aspectos cruciais para a adesão a longo prazo a um estilo de vida ativo. Estudos mostram que essa combinação de exercícios aeróbicos e anaeróbicos é uma das formas mais eficazes de alcançar a perda de peso de maneira saudável e sustentável (DISHMAN; HEATH; LEE, 2018).

Além dos benefícios relacionados à perda de peso, o karatê também melhora substancialmente a capacidade cardiorrespiratória. A execução de movimentos repetitivos e intensos promove o fortalecimento do coração e do sistema circulatório, reduzindo o risco de doenças cardiovasculares e outras condições associadas à saúde metabólica. O aprimoramento da eficiência do transporte de oxigênio no corpo também é um fator essencial para a prevenção de doenças e para o aumento da longevidade (ROSS; JANSSEN, 2001). Assim, a prática do karatê proporciona benefícios integrados que transcendem a simples atividade física, impactando positivamente na qualidade de vida dos praticantes.

Redução de gordura corporal

Diversos estudos demonstram que a prática de artes marciais, incluindo o karatê, desempenha um papel significativo na redução dos níveis de gordura corporal. Esse impacto positivo pode ser atribuído à alta intensidade dos treinos, que combinam movimentos rápidos e dinâmicos, e à variedade de exercícios que mantêm o corpo em um estado metabólico acelerado. Durante as sessões de karatê, há a combinação de atividades aeróbicas e anaeróbicas, que potencializam o gasto energético, promovendo um ambiente metabólico favorável à queima de gordura. Essa queima calórica continua mesmo após o término do treino, devido ao efeito conhecido como consumo excessivo de oxigênio pós-exercício (EPOC), amplamente documentado na literatura científica (Wilmore & Costill, 2005).

Os treinos típicos de karatê incluem técnicas como katas, kumites e kihons, querequerem esforço muscular intenso e repetitivo. Essas atividades não apenas elevam a frequência cardíaca, mas também recrutam diversos grupos musculares, o que aumenta a eficiência metabólica e contribui para a redução do tecido adiposo.

Estudos realizados por Franchini et al. (2009) confirmam que as artes marciais, quando praticadas regularmente, podem levar a uma redução significativa no percentual de gordura corporal, com efeitos especialmente pronunciados em indivíduos que combinam essa prática com uma dieta equilibrada.

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Além disso, o karatê promove adaptações fisiológicas que favorecem a saúde metabólica, como o aumento da sensibilidade à insulina e a redução da gordura visceral, fatores críticos no combate à obesidade e às suas comorbidades (Ross; Janssen, 2001). A prática também ajuda a preservar a massa muscular durante o processo de perda de peso, o que é essencial para manter uma taxa metabólica basal elevada, conforme destacado por McArdle, Katch e Katch (2015). Assim, a prática regular do karatê não apenas reduz a gordura corporal, mas também melhora a composição corporal de forma geral, contribuindo para uma saúde mais equilibrada e sustentável.

Por fim, é importante destacar que a prática do karatê tem o potencial de engajar os praticantes de forma contínua, aumentando as chances de adesão a longo prazo.

Esse fator é essencial, considerando que a manutenção de uma rotina de exercícios consistente é um dos maiores desafios enfrentados por indivíduos em programas de controle de peso (Dishman, Heath e Lee, 2018). Em resumo, a prática do karatê não apenas combate a obesidade diretamente, mas também promove mudanças duradouras no estilo de vida, auxiliando na redução e na manutenção de níveis saudáveis de gordura corporal.

Benefícios psicológicos e sociais

A relação intrínseca entre obesidade e saúde mental é amplamente documentada na literatura científica, evidenciando como os indivíduos com obesidade frequentemente enfrentam desafios emocionais e sociais significativos. A estigmatização social e os preconceitos associados ao peso contribuem para sentimentos de exclusão, baixa autoestima e vulnerabilidade a transtornos psicológicos, como ansiedade e depressão. Nesse contexto, o karatê emerge como uma intervenção holística, atuando não apenas como uma prática física, mas também como um agente transformador de bem-estar emocional e integração social (BAUMAN et al., 2012).

A prática regular do karatê promove uma transformação que transcende o aspecto físico, incentivando os praticantes a superar limites e alcançar novos patamares de competência. Essa evolução é um processo cumulativo, que resulta tanto no aprimoramento técnico quanto no desenvolvimento de habilidades pessoais, como resiliência e autoconfiança. Por meio da superação de desafios intrínsecos às aulas – como o aprendizado de novos movimentos, a participação em competições ou a conquista de graduações de faixas – os praticantes desenvolvem um senso fortalecido de autoeficácia, elemento crucial para enfrentar adversidades em outras esferas da vida (BANDURA, 1997).

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As técnicas de respiração e concentração, frequentemente integradas aos treinos, desempenham um papel essencial na regulação do cortisol, conhecido como o hormônio do estresse. A redução desse hormônio está associada à diminuição da tensão muscular, fadiga mental e sintomas de esgotamento emocional. Assim, o karatê não apenas contribui para o equilíbrio hormonal, mas também melhora a capacidade dos praticantes de lidar com situações de pressão no cotidiano (SEYLE, 1976).

Outro aspecto do karatê é a atmosfera colaborativa que se estabelece durante as aulas. Essa dinâmica promove um senso de pertencimento e apoio mútuo entre os participantes, especialmente para aqueles que enfrentam o isolamento social devido à obesidade. Estudos apontam que o envolvimento em atividades grupais, como o karatê, fortalece laços interpessoais e reduz sentimentos de solidão, elementos cruciais para a saúde mental e o bem-estar geral (PUTNAM, 2000). Ademais, a interação com colegas e instrutores cria um espaço de acolhimento e encorajamento, reforçando a motivação e a adesão à prática.

O karatê também contribui para a construção de habilidades socioemocionais, como disciplina, empatia e controle emocional. Esses atributos não apenas facilitam a interação em contextos sociais, mas também auxiliam os praticantes a lidar de maneira mais eficaz com conflitos e desafios interpessoais. Assim, o impacto psicológico e social do karatê se estende para além do tatame, promovendo mudanças significativas e duradouras na qualidade de vida dos praticantes.

Karatê na prevenção de doenças associadas à obesidade

O karatê também está associado à prevenção de doenças crônicas relacionadas à obesidade, como:

  • Doenças Cardiovasculares: Fortalece o coração e melhora o fluxo sanguíneo, reduzindo significativamente o risco de eventos como infartos.
  • Diabetes Tipo 2: Aumenta a sensibilidade à insulina, auxiliando no controle glicêmico e na redução de gordura visceral.
  • Hipertensão: Combina exercícios e técnicas de respiração para equilibrar o sistema cardiovascular e reduzir a pressão arterial.

Conclusão

O karatê se apresenta como uma solução holística e eficaz para o combate à obesidade, oferecendo benefícios que vão além da perda de peso. Promove saúde física, emocional e social, tornando-se uma prática valiosa para indivíduos de todas as idades. O impacto positivo do karatê reflete não apenas no índice de massa corporal, mas também na construção de um estilo de vida equilibrado e saudável.

REFERÊNCIAS

ABESO – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA PARA O ESTUDO DA OBESIDADE E DA SÍNDROME METABÓLICA.
Mapa da Obesidade. Disponível https://abeso.org.br/obesidade-e-sindrome-metabolica/mapa-da-obesidade/. em: 16 jan. 2025.
BANDURA, A. Self-Efficacy: The Exercise of Control. New York: Freeman, 1997. em: Acesso BAUMAN, A.; MEROM, D.; BULL, F. C.; BUCHNER, D. M.; FIATARONE SINGH, M. A. Updating the Evidence for Physical Activity: Summative Reviews of the
Epidemiological Evidence, Prevalence, and Interventions to Promote “Active Aging”. The Gerontologist, v. 52, p. 34-47, 2012.
DISHMAN, R. K.; HEATH, G. W.; LEE, I.-M. Physical Activity Epidemiology. Human Kinetics, 2018.
FRANCHINI, E.; TAKITO, M. Y.; NAKAMURA, F. Y. Anthropometrical and physiological profiles of karate athletes. Sports Medicine, 2009.
MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Exercise Physiology: Nutrition, Energy, and Human Performance. Lippincott Williams & Wilkins, 2015.
PUTNAM, R. D. Bowling Alone: The Collapse and Revival of American Community. New York: Simon & Schuster, 2000.
ROSS, R.; JANSSEN, I. Physical activity, total and regional obesity: Dose-response considerations. Medicine & Science in Sports & Exercise, 2001.
EYLE, H. The Stress of Life. New York: McGraw-Hill, 1976.
ILMORE, J. H.; COSTILL, D. L. Physiology of Sport and Exercise. Human Kinetics, 2005.