A busca do judô positivo, o kaeshi-waza, a flexibilização do ippon e as lições de Dusseldorf

André Mariano arbitrando a final do peso meio-leve em Dusseldorf, entre o japonês Tagawa e o ucraniano Zantaraia

Na avaliação do árbitro André Mariano, a questão do kaeshi-waza (contra-ataques) está complicando o entendimento das novas regras para muitos árbitros.

Regras de Arbitragem – FIJ
01/03/2018
Por PAULO PINTO I Fotos GABRIELA SABAU/IJF
Curitiba – PR

Um dos principais nomes da atual geração de brasileiros que atuam com desenvoltura no world tour da Federação Internacional de Judô (FIJ), André Mariano considera a busca do judô positivo a principal meta da entidade. O kaeshi-waza, porém, é hoje o bicho papão da arbitragem mundial.

Professor kodansha (6º dan) e árbitro FIJ A, além de tricampeão brasileiro máster e life coaching, Mariano falou à Revista Budô após o Grand Slam de Dusseldorf, na Alemanha, disputado de 23 a 25 de fevereiro. E começou enfatizando a necessidade de os árbitros continuarem a praticar o judô durante toda a vida.

“Em todas as entrevistas destaco a importância de o árbitro treinar judô constantemente e obstinadamente. Aqueles que não podem vestir o judogi para fazer randori e até competir, por motivo de saúde ou qualquer tipo de restrição, deve praticar o kata, que é a essência do judô. Os que não puderem nem fazer isso têm a opção de estudar, assistir a vídeos, aprender as regras e praticar muita leitura”, explicou Mariano.

Para ele, existem várias formas de aprimoramento, seja treinando as técnicas por meio do gokio-waza, katame-waza, seja estudando as regras, assistindo a vídeos ou acompanhando as transmissões ao vivo dos eventos do World Judo Tour.

André Mariano observa o desempenho do português Fonseca e do belga Nikiforov, na disputa do bronze do meio-pesado

O árbitro FIJ A lembrou que a Federação Internacional de Judô disponibilizou um aplicativo que reúne todas as lutas dos árbitros que atuam no circuito mundial.

“A FIJ disponibilizou no App Store um aplicativo que congrega todas as lutas dos árbitros que atuam em seus eventos. Pode-se baixar este aplicativo no celular, digitar o nome do árbitro e de seu país de origem e assistir a todos os combates em que ele atuou. Esta é mais uma ferramenta para aprender e estar atualizado”, lembrou Mariano, que detalhou a rotina da arbitragem na Alemanha.

“Em Dusseldorf, no fim de cada dia eram feitas reuniões sobre aquilo que a comissão de arbitragem queria enfatizar. No primeiro dia pediram insistentemente para que déssemos atenção ao falso ataque e ao judô positivo, principalmente ao kaeshi-waza, lembrando que aquele que está contra-atacando não pode apoiar seu corpo no tatami para projetar o adversário. No segundo dia foi enfatizada a importância do ne-waza, pois muitas lutas e finais foram decididas no combate no chão. Entender o desenvolvimento da luta no solo é fundamental. Identificar detalhes – como onde começa e quando haverá a finalização – só é possível se o árbitro mantiver um grau de treinamento elevado. A FIJ exige que tenhamos conhecimento e sensibilidade suficientes para determinar quando o atleta está realmente focado na finalização e quando apenas está descansando em ne-waza”, detalhou.

Na opinião de Mariano, as inovações da FIJ estão sendo muito importantes para os supervisores de arbitragem no processo que visa a dinamizar a modalidade.

“Já contamos com a colaboração do Nil Adams, grande campeão mundial, que nos está auxiliando. Em Dusseldorf nos apresentaram Udo Quellmalz, grande campeão alemão que em breve figurará no quadro de supervisores de arbitragem da FIJ. A proposta da entidade é utilizar toda a experiência que os grandes ex-atletas acumulam no processo de modernização da arbitragem”, disse.

Reiterando a necessidade da busca do judô efetivo, Mariano concluiu sua fala abordando a flexibilização do ippon.

“No mais é a busca do judô positivo. A comissão da FIJ lembra sempre que, para beneficiar os atletas que querem lutar e buscam esse objetivo, devemos aplicar as regras do primeiro ao último segundo de luta. Quanto à flexibilização do ippon, é importante saber que agora não é mais necessário enterrar o adversário nos tatamis. As quedas em que os lutadores rolam sem interrupção também valem ippon, seja rolando de um ombro para o outro, seja rolando da nuca para a coluna sacral, seja de cima para baixo ou de baixo para cima. É muito importante que os judocas entendam que, agora, as técnicas em que rolam sem interrupção, anteriormente classificadas como wazari, passam a ser consideradas ippon”, concluiu Mariano.

A qualidade dos atletas depende das características da arbitragem

É um equívoco pensar que árbitros e atletas ocupam espaços isolados. Por dividirem o mesmo cenário, são dependentes da qualidade técnica uns dos outros, fazendo com que bons atletas propiciem o surgimento de bons árbitros. Da mesma forma, árbitros atualizados e bem preparados proporcionam atletas mais capacitados para conquistar vagas nos pódios.

Na avaliação de Ney Wilson, gestor técnico da seleção brasileira de judô, a qualidade da equipe passa diretamente pelo nível técnico da arbitragem nacional.

“Quando vamos falar do desenvolvimento do judô brasileiro precisamos pensar na evolução de todas as áreas da CBJ: atletas, treinadores, árbitros e organização de eventos. Caso contrário, teremos um desequilíbrio. Portanto, manter nossos árbitros nos certames internacionais é de fundamental importância para o desenvolvimento técnico da CBJ”, explicou o dirigente.

Ney Wilson concluiu salientando como a atuação dos árbitros brasileiros no World Judo Tour agrega qualidade ao trabalho de toda a comissão técnica.

“Com uma arbitragem atualizada, mantemos nossos atletas e treinadores atualizados, influenciando até o treinamento e o melhor preparo dos nossos atletas olímpicos”, finalizou o gestor técnico da CBJ.