22 de dezembro de 2024
Com a morte de Ricardo D’Elia, o karatê de São Paulo perde uma de suas maiores referências
Após dois longos anos de luta incansável contra o câncer, a maior autoridade da modalidade no Estado de São Paulo faleceu na manhã de domingo.
MEMÓRIA
29/01/2018
Por PAULO PINTO I Fotos BUDÔPRESS e ARQUIVO
São Paulo – SP
Membro da geração de ouro do karatê brasileiro, sensei José Ricardo Ortiz D’Elia, integrante das seleções paulista e brasileira nas décadas de 1970 e 1980, tornou-se também uma das principais figuras no cenário da gestão da modalidade em São Paulo. Sua morte ocorreu na manhã deste domingo.
Nascido em 10 de julho de 1947, em Ribeirão Preto (SP), começou no karatê aos 14 anos, após a perda prematura de seu pai. Depois de conquistar inúmeros títulos nacionais e internacionais e ter-se tornado uma das maiores referências técnicas da modalidade em São Paulo e no Brasil, Ricardo D’Elia edificou sua vida e a de sua família seguindo essencialmente os ensinamentos do karatê.
Posteriormente tornou-se empresário, mas o karatê continuou a fazer parte de seu dia a dia, até que ao lado de outros karatecas, em 13 de setembro de 1974, fundou a Federação Paulista de Karatê (FPK).
Reverenciado e respeitado por todos, D’Elia sempre esteve ao lado das administrações da FPK, defendendo os interesses dos atletas, cobrando coerência e austeridade da gestão.
Para José Carlos Gomes de Oliveira, presidente da FPK, o falecimento do mestre D’Elia deixa uma grande lacuna na modalidade.
“O professor D’Elia foi meu técnico na seleção brasileira, mas sua autoridade sobre toda a nossa geração transcendeu os limites dos tatamis. Na área técnica era um gigante, transmitia enorme segurança e sabia tirar o melhor de todos. No campo pessoal ele sempre deu exemplo de caráter, conduta e retidão. Cobrava postura e comprometimento de todos aqueles que ostentavam a faixa preta, mas nos tratava como parte de sua família”, disse o dirigente.
José Carlos destacou a importância de D’Elia na administração, e principalmente nos momentos decisivos da gestão.
“Ele sempre foi muito fiel aos princípios da nossa modalidade e era extremamente ético quando o tema envolvia a gestão. Neste sentido sempre tive nele um grande colaborador. Toda vez que o tema era mais complexo ou mais delicado, eu recorria a ele. Até onde eu sei, ele colaborou na administração de quase todos os dirigentes da FPK”, lembrou Zeca.
O dirigente paulista falou da imensa alegria pela homenagem prestada ao colega na última temporada.
“No ano passado inauguramos o novo centro de treinamento da federação paulista, em Campos do Jordão. Nosso CT foi batizado com o nome dele. Pudemos prestar esta homenagem e isto o deixou muito feliz e emocionado. O Centro de Treinamento Professor Ricardo D’Elia FPK é apenas uma pequena forma de expressar a gratidão que a nossa geração e toda a comunidade karateca do Estado de São Paulo têm por ele”, enfatizou o mandatário da FPK, que finalizou destacando o legado deixado por D’Elia.
“Como karateca, como pai de família e como amigo ele foi um grande homem. Foi bem-sucedido profissionalmente e o grande legado que deixa é o amor e o comprometimento que dedicou a tudo que fez.”
Um homem iluminado
Na despedida do grande amigo Ricardo Ortiz D’Elia, Kazuo Nagamine, presidente da Federação Paulista de Karatê-Dô Tradicional e presidente da JKA de São Paulo, falou sobre seu encontro com o amigo que, em sua visão, foi uma pessoa iluminada.
“Ricardo Zelão D’Elia, nos conhecemos no “infame exame” e igualmente “infame curso de profissionais”, segundo dizia nosso colega de curso Ennio Vezzuli, levado a cabo lá nos idos de 1972, sob a regência de Okuda sensei, nos moldes do seu congênere lá no Japão. Segundo o próprio Okuda sensei, tinha de ser mais duro que o de lá. Tínhamos de esforçar-nos mais do que os outros, pela oportunidade”, explicou Kazuo, que lembrou a amizade de longos anos.
“De lá para cá sempre nos falávamos. Nossos encontros eram fortuitos e não constantes, entretanto, o que foi construído no suor e convivência daqueles tempos permaneceu incólume na amizade ao longo dos tempos, não necessitando da frequência dos encontros físicos para a certeza da comunhão espiritual.
Estivemos juntos por ocasião da ascensão dele à liderança da FPK, uma década após sua fundação, uma vez que desde o final do curso de instrutores eu já me deslocara ao interior objetivando cumprir meus desígnios de contribuir para o desenvolvimento do karatê-dô por esta parte do Estado, além de Okuyama sensei em Ribeirão Preto, igualmente integrante do grupo de instrutores proveniente do curso anteriormente referido.”
Kazuo Nagamine enfatizou a importância de Ricardo D’Elia no desenvolvimento da educação física e no contexto fitness em São Paulo.
“Desnecessário dizer da contribuição imensa que D’Elia deu à educação física pelos empreendimentos que capitaneou e também ao karatê do Brasil. Todos sabemos o quanto, na sua inquietude, trabalhou e inovou nessas áreas e tantas outras. Acima de tudo quero lembrar de sua personalidade desafiante e ao mesmo tempo dócil pela gentileza, respeito e educação no trato com as pessoas com quem se relacionava. Um amigo querido”, pontuou.
Nagamine destacou a importância da família na vida de D’Elia e o cuidado na formação de seus filhos e entes queridos.
“Sempre enaltecendo seus familiares, dignos de orgulho em nossas conversar recentes, não somente pelos seus feitos, mas pelo caráter e dignidade que tinha conseguido transferir na educação oferecida. Qualidades imprescindíveis ao ser humano e que foram enaltecidas pelo rigor dos treinos em nosso Caminho (Dô). A dívida contraída (giri) para com o karatê-dô percebida por ele se transforma em algo impagável, dignifica o ser humano que a assume como credor.”
Kazuo Kawano Nagamine se despediu do amigo e evocou o sentimento da verdade no coração.
“Não perdemos Ricardo Ortiz D’Elia, o Zelão. Sua contribuição em vida permanecerá como um legado, cabendo a cada um de nós dignificá-lo não somente pela lembrança, mas pelas ações e continuidade. Com o sentimento da Verdade no Coração (kokoro), meus cumprimentos à família e profunda reverência à D’Elia sensei, que sempre me tratava carinhosamente por amigo Nagamine”.
José Ricardo Ortiz D’Elia deixa a esposa Regina Oliveira D’Elia, os filhos Luciano, Caio e Leonardo, noras e netos.