Com sinceridade cortante, Elton Fiebig explica por que luta para representar a FPJudô na comissão de atletas da CBJ

O tetracampeão mundial veterano afirma que respeita o Baby como pessoa e torce muito para ele como atleta, mas entende que ele não tem a isenção e a experiência necessárias para representar a maior potência do judô da América Latina

Gestão Esportiva
23 de outubro de 2020
Por PAULO PINTO I Artes FRANCISCO SANTOS
Curitiba – PR

As últimas semanas foram marcadas pela disputa dos atletas que farão parte da Comissão de Atletas Eletiva da Confederação Brasileira de Judô (CBJ) e, como era de se esperar, em São Paulo a temperatura subiu. Rafael Silva e Elton Fiebig estão em campanha e literalmente colocaram fogo no feno.

Extraoficialmente Baby é visto como candidato da CBJ, enquanto oficialmente Elton é o candidato da Federação Paulista de Judô.

Nesta semana a Budô ouviu Rafael Silva e o peso pesado destacou que ninguém sabe ainda quais serão os candidatos ao pleito que deve ocorrer até 15 de março, já Elton afirma que, independentemente de quais sejam os candidatos, ele defende a independência de São Paulo, enquanto seu oponente defende interesses da CBJ.

“Antes de mais nada quero deixar claro que não existe nenhuma rixa pessoal entre nós. Ele é uma grande pessoa, um excelente judoca e sempre torço para ele quando defende São Paulo e o Brasil. Estamos disputando uma eleição para uma função meramente eletiva. Não sei como o processo se deu em outros Estados, mas em São Paulo formaram uma comissão de professores, atletas e diretores da federação que me indicaram para representar o Estado. Eu já estava no processo quando surgiu a novidade do Baby, tanto é que o apoiei e fiz campanha para ele nas redes sociais, mas o fiz acreditando que ele estava se candidatando para a eleição de atletas olímpicos e não à comissão de atletas. Em 40 anos filiado à FPJudô esta foi a primeira vez que fui indicado para um cargo eletivo e eu não podia deixar de aceitar o convite feito por todos estes judocas que me apoiam.”

Surpreso com a repercussão da campanha, Fiebig comemora o apoio expressivo que recebe da comunidade, mas reclama da pressão feita por membros da alta cúpula da CBJ, que deveriam manter-se isentos.

“Até o Baby entrar no processo tudo estava calmo, mas bastou o Rafael candidatar-se que a pressão começou. O primeiro a me interpelar foi o Robnelson Ferreira, gestor executivo da CBJ, que não deveria participar deste processo. Ele disse que eu não estava apto a participar do pleito, pois não estava inscrito no Zempo; e eu disse que isso era um problema técnico deles e não meu. Sou pentacampeão mundial veterano e coleciono uma série de medalhas em competições mundiais, continentais, nacionais e estaduais. Lembrei ao dirigente que no último mundial realizado em Cancun, pela FIJ, conquistei o bronze e se a CBJ não mantinha o cadastro dos atletas em dia eu não podia fazer nada”, afirmou o peso pesado.

Sobre os candidatos que disputarão o pleito em março, Elton fez questão de afirmar que tem opinião formada e sabe muito bem por que está participando.

“Eu não preciso saber quais são os candidatos que disputarão a eleição da CBJ. Estou nessa briga para defender os interesses de São Paulo. Quem sabe o que é melhor para o judô paulista é a diretoria da FPJudô. Se for eleito, lutarei para defender a posição adotada por nossa diretoria. Tenho posição formada sobre isso. Penso que São Paulo, o Estado com maior representatividade nos tatamis, precisa exercer maior protagonismo político.”

Avaliando o cenário sob o ponto de vista da gestão e do atleta, Fiebig entende que a CBJ precisa voltar a ser administrada profissionalmente e com isenção.

“Como já falei antes, sou federado há 40 anos. O Rafael é do Mato Grosso, foi para o Paraná e posteriormente veio para São Paulo, onde se aperfeiçoou no Projeto Futuro. Hoje está no Clube Pinheiros e defende o lado dele como atleta. Mas é a CBJ que viabiliza o supersalário que ele recebe e é lógico que ele vai defender quem o está apoiando. Ele tem vínculos com a CBJ e avalio que sua candidatura é antiética. Candidatei-me e todo este processo está sendo arcado por mim. Nunca recebi nada da CBJ e estou pagando todas as despesas. Minha campanha é fundamentada no ideal de defender e apoiar uma entidade com a qual tenho um vínculo de quase meio século”, disse o peso pesado. Ele acredita que, se São Paulo participar do sufrágio de março e vencer, o Brasil inteiro será beneficiado.

“Se o Estado de São Paulo participar da eleição para a CBJ e vencer, tenho certeza absoluta de que todos os Estados ganharão. Hoje não se sabe direito nem quem é o presidente da CBJ. O que ele fez de positivo para ocupar lugar de destaque no judô brasileiro? Nunca o vi de kimono em toda a minha vida nos tatamis. Sei apenas que foi um árbitro de pouca expressão, que fez uma gestão muito criticada em Santa Catarina e, estando no comado da CBJ, não deu suporte nem ao seu próprio Estado. É isso que escutamos dos nossos colegas catarinenses. Antes dele tivemos um presidente empreendedor, que elevou a modalidade a outro patamar, e é exatamente isso que defendo: lutarmos para mudar o quadro atual, e para tanto precisamos de um gestor com larga experiência, dinâmico e capacitado”, enfatizou Fiebig.

“Não podemos esquecer que o sensei Chico, por exemplo, é um dirigente extremamente acessível e sempre dedicou grande atenção aos atletas. O próprio Baby foi sempre favorecido por ele, quando estava no início da carreira. O professor Francisco sempre atuou nos bastidores para apoiar o judoca que veio do Paraná, pois sabia do potencial do Rafael Silva, e ele estava certo.”

Sobre os critérios que Fiebig adotará para escolher seu candidato, o judoca que é federado pela Vila Sônia foi enfático, claro e objetivo.

“Desculpe, mas sou fechado com São Paulo e acho que foi por este motivo que fui indicado pela grande maioria dos professores. Não preciso saber quais serão os candidatos, mesmo porque, a esta altura todos sabem quem vai lançar chapa em março. Mas, sob um ponto de vista técnico e estrutural, penso que São Paulo tem condição de fazer aquilo que foi pelo Japão no passado, para nivelar mais a modalidade em nosso País. Lá atrás o Instituto Kodokan enviou professores para os principais países com a intenção de fazer o judô crescer mundialmente, e penso que é exatamente isso que nossos dirigentes pretendem fazer no Brasil. Fora isso, acho que já passou da hora de esses dirigentes impedirem São Paulo de ocupar a gestão da CBJ. Não pode haver mais isso de judô brasileiro e judô paulista. Temos de parar com esta divisão que só interessa aos dirigentes que há décadas estão no poder nos Estados, fracionando a modalidade em benefício próprio. Então, se tiver de me fundamentar em algo para escolher meu voto, olharei para a história e para aquilo que foi feito pelo Japão, pois é isso que nós precisamos no Brasil.”

Elton insistiu que possui experiência de sobra para atuar junto aos 26 atletas que irão compor a comissão. “Com certeza, um dos principais motivos de estar concorrendo ao pleito é pode equilibrar um pouco a eleição, pois todos nós sabemos que a CBJ exerce grande pressão sobre os atletas. Minha intenção é evitar que os mais novos sejam manipulados pelos dirigentes ou sejam influenciados pelas estrelas da seleção, que já mostraram que serão tendenciosos.”

Sobre gestões futuras, Fiebig lembrou que não existe apenas o alto rendimento. “Olhando a distância nota-se claramente que a CBJ está praticamente voltada para o alto rendimento e o judô de verdade não é isso. Hoje temos o judô escolar como segmento de extrema importância para os professores que vivem do ensino da modalidade. Temos o judô social praticado em clubes e condomínios. Temos a iniciação, que é a ponta de tudo e é a mola propulsora da modalidade. Outro importante segmento hoje é o judô adaptado e paralímpico, mas a CBJ investe quase todos os recursos apenas no alto rendimento, e isso precisa ser revisto, antes que percamos mais espaço. Voltando para competição, temos ainda o kata e o veteranos, modalidades que praticamente foram impulsionadas e fomentadas pela FPJudô. Até hoje a CBJ não possui um departamento de kata e de judô veterano efetivamente atuantes. O protagonismo nessa área é quase exclusivo de São Paulo”, avaliou o pentacampeão mundial.”

“Aliás, há muitos anos São Paulo mantém comissões exclusivas de kata e veteranos e até poucos meses atrás tudo referente à área técnica e competitiva estava nas mãos do Matheus Teotônio. Sem contar que, durante a pandemia, a CBJ não fez absolutamente nada pelas federações estaduais, pelos clubes e muito menos pelos atletas; e todos sabem que entidade possui recursos para ajudar os Estados”, completou Fiebig.

 

O professor João Gonçalves jamais admitiria que um atleta do Pinheiros votasse contra a FPJudô.”

Elton explicou que respeita e entende que cada pessoa tem seu interesse e visão e vota em quem desejar. Isso é democracia. “Tudo isso me deixa muito chateado, porque todos os atletas dos ECP estão fazendo campanha para o Baby. Mas se o sensei João Gonçalves fosse vivo ele jamais admitiria que um atleta do clube não apoiasse a federação. Ele foi sempre um grande apoiador da entidade e sempre esteve ao lado da direção em todas as decisões que eram tomadas. Já falei que admiro o Baby como pessoa e como atleta, mas vejo sua postura com extrema tristeza, pois São Paulo o acolheu de braços abertos e agora ele põe uma chapa e vai contra os interesses de São Paulo. Todos os atletas do Pinheiros estão agindo em benefício próprio e não na mudança que o judô do Brasil necessita.”

Assim como fez com o Baby, a Budô perguntou como ele vê o fato de a CBJ monitorar o processo eletivo e a contagem dos votos no processo eletivo, e o judoca veterano condenou todo o processo.

“Vejo vários vícios e erros. O primeiro foi a votação dos atletas, pois entendo que isso deveria ficar a cargo das federações estaduais e nem a isso elas tiveram direito. A CBJ tentou determinar até quem poderia ou não se candidatar, pois foi isso que eles tentou fazer comigo. Depois determinou quem poderia votar, e acho isso uma aberração totalmente antidemocrática. A partir do momento em que o atleta paga anuidade na federação e na confederação e compete em qualquer categoria – e isso inclui o kata –, ele deveria ter direito a voto. Para coroar esse absurdo, a CBJ contratou uma empresa para conduzir o processo; e quem nos garante que o processo será isento?”, questionou Elton, para quem a CBJ está tentando enfiar o Baby goela abaixo dos judocas paulistas.

 

“Que me lembre, Rio Grande do Sul, Paraná e São Paulo apresentaram candidatos únicos. Eu havia sido indicado pela comunidade e pela direção da federação. Pessoas da própria CBJ dizem que o Sílvio Acácio foi especialmente a Lisboa para tratar desse tema com o Baby e demais atletas da seleção que se sujeitaram a esse desserviço. Isso é muito ruim para a modalidade. Em todos os anos que o professor Paulo Wanderley esteve à frente da CBJ, jamais ouvimos nada que maculasse a sua gestão. Depois que ele foi para o COB, volta e meia surgem problemas e boatos Ver a nossa seleção se envolvendo nisso é realmente vergonhoso”, lamentou Fiebig.

O voto do Rafael Silva não é um voto para São Paulo. É um voto para a CBJ.”

Cobramos o porquê de o peso pesado veterano afirmar com tanta ênfase que o Rafael Silva está a serviço do presidente da CBJ, e mais uma vez Fiebig usou de sua veemência assertiva.

“Além de vários delegados regionais estarem fazendo campanha a meu favor nas redes sociais, nesta semana até o vice-presidente da FPJudô afirmou publicamente que eu fui o candidato de consenso do judô paulista”, lembrou Fiebig, que expôs outro fato gravíssimo do comando técnico da seleção brasileira, durante o processo eletivo.

“Tenho o maior respeito e consideração pelo professor Jun Shinohara, supervisor técnico da seleção masculina, por tudo que conquistou como atleta e como técnico da seleção brasileira. Ele tentou fazer com eu desistisse do pleito e disse coisas que não dá nem para falar. Ele é meu professor e tem a opinião dele, assim como eu tenho a minha, mas penso que, dentro de um processo democrático, as opiniões e escolhas devem ser respeitadas. Respeito o ponto de vista dele, mas eu estou pensando no coletivo, enquanto ele vê apenas os interesses dele, que há mais de 20 anos é um dos altos salários da CBJ. Parece que agora está preocupado em perder o emprego. Só que a permanência dele e do Ney Wilson no comando da seleção está sendo extremamente nociva ao judô brasileiro. Já deu para esta turma que está à frente da seleção há décadas. Aliás, eles pintam um cenário ruim em São Paulo e eu acho que eles desconhecem totalmente a nossa realidade. Basta ver o quanto São Paulo inovou durante a pandemia, enquanto os demais Estados, com exceção do Paraná, quase nada fizeram. A CBJ tentou copiar algumas iniciativas desenvolvidas por São Paulo. Na verdade é que contra fatos não há argumentos. Eles tentam assegurar seus empregos em detrimento da qualidade técnica do alto rendimento.”

Elton também acentuou que, mesmo sem recursos, durante a pandemia, quando ninguém sabia o que seria do judô, as ações de São Paulo foram fundamentadas no espírito de união e no jita-kyoei, contando com a atuação de dirigentes, professores, técnicos, árbitros e atletas, que fizeram de tudo para manter a chama acesa.

“Num determinado momento todos nós ficamos desesperados, pois todos dependem das aulas para sobreviver, mas aos poucos fomos criando fôlego e tivemos um protagonismo gigantesco. Ajudamos até judocas do exterior. E para as gestões futuras sonhamos implementar grandes ações visando ao desenvolvimento do judô brasileiro. É justamente este pensamento que me fez assumir este compromisso perante a nossa comunidade.”