Em encontro promovido pelo COB, atletas cobram mais participação

Tiago Camilo, presidente da comissão dos atletas do COB, pede maior entendimento do cenário olímpico e sugere mudanças na gestão.

Preocupados com os numerosos problemas na gestão nas confederações esportivas e cientes das dificuldades financeiras para o ciclo olímpico, atletas brasileiros começam a mobilizar-se em busca de maior espaço nas decisões do esporte. Nesta quinta-feira (4 de abril), dirigentes e atletas de quase todas as confederações olímpicas estiveram na sede do Comitê Olímpico do Brasil (COB) para tratar do tema e pleitear mudanças.

Nenhuma decisão efetiva foi tomada, mas o primeiro encontro – convocado pelo próprio COB – serviu para os esportistas apresentarem suas preocupações. O tema “gestão” foi o mais citado.

“Neste primeiro momento a gente precisa entender o que acontece em cada confederação. O que mais foi abordado foi gestão, gestão técnica e de recursos”, disse o judoca Tiago Camilo, presidente da comissão de atletas do COB. “É uma realidade e uma direção do esporte mundial. Não se faz mais o que se fazia há 20 anos. A gente tem de mudar.”

Um novo modelo de governança deverá ser buscado, mas isso não quer dizer que mudanças profundas aconteçam, especialmente no curto prazo. Isso porque cada confederação tem total autonomia.

Apesar de nenhuma decisão efetiva ter sido tomada no primeiro encontro do gênero, Tiago Camilo saiu esperançoso. “A gente está vendo o que acontece no Brasil, por problemas de administração. O brasileiro não aguenta mais isso. O que não faz bem a gente tem de mudar”, afirmou o judoca.

Atletas aprovam iniciativa do COB

Se depender dos atletas, a iniciativa de participar de uma reunião com as confederações e o Comitê Olímpico do Brasil (COB) para promover a troca de ideias será repetida mais vezes. Ao longo do encontro atletas de diferentes modalidades pediram a palavra e dividiram questões que afetam a todos.

Rafaela Silva, judoca campeã olímpica nos Jogos Rio 2016, esteve presente e aprovou a experiência. “Gostei bastante. É uma oportunidade para falarmos sobre a nossa rotina e qualquer tipo de problemas que possa aparecer para este ciclo”, disse a atleta carioca. “O judô já tem uma comissão de atletas que nos escuta bastante. Levamos à comissão qualquer problema que tenhamos e ela encaminha à direção da confederação”, disse a judoca.

Para a Rafaela, a preparação que resultou no ouro nos Jogos Rio 2016 e os trabalhos para Tóquio 2020 permanecerão iguais, mesmo com uma diminuição de investimentos.

“Eu não acho que o judô do Brasil vá sofrer tanto em relação a investimentos. Já fiz três viagens internacionais neste ano para competições, então não estou sentindo diferença”, disse Rafaela. “A Olimpíada anterior foi no Brasil. A visibilidade e o investimento foram maiores. A gente já sabia que a visibilidade ia diminuir após os Jogos. Mas estamos trabalhando da mesma forma para alcançar nossos resultados em Tóquio 2020.”

Campeã olímpica no salto em distância em Pequim 2008, Maurren Maggi considerou a iniciativa uma das melhores do COB. “Foi uma iniciativa sensacional, na qual todos os presidentes de confederações e os melhores atletas de cada modalidade puderam se expressar e discutir”, disse a saltadora.

Representante do Time Brasil nos Jogos Rio 2016 no wrestling, Joice Silva destacou a importância do encontro. “Fiquei muito feliz com esta iniciativa, acho que foi muito proveitoso e espero que aconteça mais vezes. Essa proposta é perfeita para estreitar a distância entre COB, atletas e confederações. Ouvir mais as sugestões é bom até porque o objetivo é comum. Acho que isso vai aproximar e ajudar a resolver os problemas. Cada confederação tem sua questão, mas ela pode ser a mesma de outra. Gostei muito, estou muito satisfeita e saindo daqui bem feliz”, afirmou Joice.

Isabel Swan, integrante da comissão de atletas do COB e da Confederação Brasileira de Vela (CBVela), reforçou a importância de maior participação dos atletas. “Entendo que o envolvimento dos atletas na gestão é de fundamental importância. Eles têm de conhecer melhor a sua confederação e federação para realmente poder participar e contribuir. O atleta vive muita coisa e pode passar isso para a confederação. Tive três campanhas olímpicas, algumas com apoio e outras sem, e acredito que posso contribuir muito, assim como todos que aqui estão. Nossa voz é importante, principalmente entendendo e participando no processo. Não adianta criticar, temos de entender o processo de gestão para depois propormos soluções”, disse.

Dirigentes avaliam encontro

Na avaliação do presidente do Comitê Olímpico do Brasil, é preciso criar um novo modelo de gestão para o esporte olímpico.

“São muitas questões a serem pensadas”, declarou Carlos Arthur Nuzman. “A participação das comissões de atletas vai intensificar-se. Foi mostrado o modelo de do COB. Não quer dizer que seja perfeito, porque nada é perfeito.”

Paulo Wanderley Teixeira, vice-presidente do COB, pontuou que a gestão esportiva participativa é uma tendência mundial.

“A iniciativa provocada pelo presidente Nuzman é inédita e extremamente oportuna, mas observo que esta é uma tendência mundial. Vários comitês nacionais estão tendo a iniciativa do diálogo, enquanto outros estão sendo cobrados da necessidade de promover alguma forma de interlocução entre gestores, atletas e profissionais envolvidos.”

Para o vice-presidente do COB o momento exige mudanças e a união de todos em torno de soluções globais para o esporte olímpico brasileiro.

“A reunião de hoje foi um marco histórico para o esporte olímpico. As manifestações de ambas as partes – dirigentes e atletas – foram espontâneas e sinceras. Estou convencido de que a maioria dos atletas saiu com melhor imagem sobre as confederações. Com equilíbrio e sem radicalismos, devemos entender que as mudanças vieram para ficar e que adaptações serão necessárias. O momento exige mudanças e devemos exercer nossos mandatos com humildade, comprometimento e compartilhando experiências que apontem soluções e um novo momento para o desporto olímpico.”

Para Sílvio Acácio Borges, presidente da Confederação Brasileira de Judô, a busca de soluções e consenso foram a tônica do encontro.

“A reunião foi muito proveitosa e o posicionamento do Tiago Camilo, presidente da comissão dos atletas do COB, foi extremamente adequado e importante. O comitê fez uma apresentação com momentos importantes do esporte, no qual o judô teve grande destaque, o que ratifica o prestígio de nossa modalidade neste cenário. Entendo que o diálogo aberto pelo COB foi de extrema importância. Vimos dirigentes e atletas falando com muita coerência, e cito como exemplo o pronunciamento de Isabel Swan, da vela, no que tange à busca de um maior diálogo sem excessos e mantendo a estrutura hierárquica que nos trouxe até aqui.”

Nuzman pretende criar fóruns internacionais com atletas e dirigentes

Durante o encontro o presidente Carlos Arthur Nuzman afirmou que pretende promover dois fóruns internacionais no Brasil. O primeiro seria de atletas e o segundo, de dirigentes de entidades esportivas.

“Vamos trazer atletas internacionais, campeões, medalhistas olímpicos e mundiais, que escrevem a história e são legendas do esporte, para junto com os atletas brasileiros podermos ter um grande e importante fórum. E também vamos fazer outro, com os presidentes de federações internacionais e dirigentes do mundo inteiro que se têm destacado, não só nas federações internacionais. O objetivo é trocar conhecimento, ampliar este horizonte que temos, que é o futuro do esporte brasileiro”, declarou Nuzman.