22 de dezembro de 2024
Interventor atropela estatuto em assembleia fundamentada em vícios
Intimidando dirigentes contrários aos desmandos em curso, interventor consegue aprovar um estatuto que desrespeita dispositivos previstos na Lei 9.615 e o Código Civil de 2002.
Para desespero e sofrimento dos atletas, profissionais da área técnica e filados como um todo, o caos instituído na modalidade pela cúpula da Confederação Brasileira de Taekwondo e por um interventor parcial e faccioso está muito longe de acabar.
Atendendo a uma ordem judicial, no dia 10 de abril Carlos Alberto de Carvalho, interventor designado pela Justiça, realizou assembleia geral extraordinária que, de forma imparcial e isenta, deveria fazer pequenas correções estatutárias. Mas o que vimos foi uma assembleia repleta de vícios e manobras que visam a conduzir Yeo Jun Kim à presidência da entidade.
Além dos absurdos praticados na confecção de novo estatuto, o edital de convocação foi redigido em dissonância com o que prega a lei do esporte. A assembleia geral extraordinária foi um espetáculo grotesco, no qual o interventor desrespeitou fundamentos básicos, impedido inclusive que o plenário da AGE definisse quem iria secretariá-la, e este direito é soberano.
Buscando intimidar presidentes das federações, cuja maioria não apoia o grupo que está à frente deste processo, Carlos de Carvalho nomeou funcionários da CBTKD para compor a mesa gestora. Desta forma, o superintendente Valdemir José de Medeiros foi nomeado secretário da AGE. Mesmo tendo impeditivos legais, por determinação do interventor e não por escolha da AGE como deveria ser, Juliano Tomé Crapanzani ocupou lugar na mesa como advogado do interventor. Além de ser testemunha do Ministério Público Federal contra o ex-presidente, Juliano Tomé mantém total ligação com a Federação Mineira de Taekwondo, entidade autora do processo que afastou a diretoria da entidade e originou esta assembleia. Juliano Tomé jamais poderia estar na mesa e conduzir os trabalhos. Michel Assef Filho, advogado da CBTKD, e José Mota Leal Filho, secretário geral da entidade, também fizeram parte da mesa
Se Michel Assef é advogado da CBTKD, por que Juliano Tomé ocupou lugar na mesa? Por quais motivos o interventor colocou seu advogado pessoal na mesa da assembleia que discutiria detalhes do estatuto?
Carlos de Carvalho cometeu uma série de erros e lançou o taekwondo numa nova aventura judicial, já que provavelmente Adriana Sucena Monteiro Jara Moura, a juíza titular da 16ª Vara Civil, não aceitará os vícios e armadilhas impostos pelo grupo que pretende firmar-se no comando da modalidade em conluio com funcionários e dirigentes que buscam perpetuar-se no poder visando a cargos que proporcionam altos salários providos pela Lei Agnelo-Piva.
Seguindo o roteiro de ilicitudes denunciadas antecipadamente pela Budô, o grupo capitaneado por Juliano Tomé transformou o estatuto da CBTKD numa colcha de retalhos que atende aos interesses da facção que provavelmente tomará a entidade de assalto e devolverá seu controle a um dirigente proveniente da Coreia do Sul. Alguém que certamente cometerá na confederação brasileira os mesmos desmandos que vêm sendo praticados há duas décadas na federação paulista e resultaram em várias ações judiciais.
Como interventor, Carlos de Carvalho possuía poderes para conduzir a assembleia, mas deveria definir quem iria secretariá-la por meio do voto e com a participação das federações. O interventor foi questionado por vários dirigentes estaduais, mas de forma intransigente e elevando o tom de voz ignorou os apelos e esbravejou: “A escolha do secretário cabe à minha pessoa, e quem não estiver de acordo que reclame com a juíza que me designou para o cargo”. No fim, a jornalista Carla Sofia Flores acabou secretariando Valdemir Medeiros que, alegando cansaço, solicitou ajuda da assessora de imprensa.
Em assembleias realizadas em entidades sub judice vimos a presença de representantes do Ministério Público ou do Judiciário. No caso do taekwondo o interventor conduziu o processo de maneira autoritária e unilateral. O pior foi a forma inexorável como transcorreram a discussão e a aprovação do novo estatuto que, no fim das contas, foi metido goela abaixo dos dirigentes estaduais que não estavam de acordo.
Maria Lúcia Ferracioli é membro do STJD e, além de ter exercido atividade na AGE, dá expediente na CBTKD, e este é mais um flagrante do desrespeito da diretoria às determinações judiciais. Como membro do STJD e por estar envolvida no processo que afastou o ex-presidente Carlos Fernandes, ela não poderia fazer parte da CBTKD. Recentemente concedeu entrevista ao Globo Esporte e disse que é funcionária da entidade. Como se não bastasse, na AGE foi convidada a participar do grupo de funcionários que avaliaram as propostas apresentadas, num flagrante jogo de cartas marcadas. É um absurdo nomear três funcionários que não deveriam estar nesse processo, ao invés de permitir que democraticamente a assembleia escolhesse os membros que fariam a avaliação das propostas.
Após 11 horas discussão, o interventor aprovou um estatuto desconexo da realidade. O advogado rondoniense José Antônio Soares Silva consignou em ata que o estatuto contém vícios e desrespeita inúmeros dispositivos da Lei 9.615 de 1988, bem como o Código Civil de 2002. No que refere às exigências legais e mais especificamente às regras e ao processo eleitoral constantes nas disposições transitórias, o novo estatuto não atende ao processo democrático, sendo insuficiente para a segurança e a legalidade do procedimento eleitoral anunciado para o dia 24 de abril.
Qual estatuto valerá no pleito?
Ficou indefinido quem poderá votar e como será formado o quórum. Os pré-requisitos não ficaram claros, e muito menos qual estatuto será observado para esta eleição, gerando dúvida se serão adotadas as regras do estatuto de 2007 ou as do estatuto de 2017. Por vários argumentos e fundamentos, este processo é questionável, já que o estatuto passa a valer somente após o assentamento da ata no registro público.
Outro ponto é que o novo estatuto ainda não passou pelo crivo do Comitê Olímpico do Brasil, que primeiro fará a devida análise para depois dar a carta de anuência. É o COB que controla a verba pública repassada às entidades e presta contas ao TCU. A normatização estatutária das entidades olímpicas está implícita no próprio estatuto do COB.
Outro acontecimento espetacular na assembleia foi a proposta no mínimo acintosa apresentada por Júnior Maciel, que, se dizendo representante da Federação do Estado do Amapá e candidato ao pleito, propôs a realização da assembleia geral ordinária eletiva em seu Estado, arcando com as despesas de viagem, alimentação e hospedagem de todos os dirigentes. Mas a proposta foi amplamente rejeitada.
Outro fato importante é que a juíza titular da 16ª Vara Civil, Adriana Sucena Monteiro Jara Moura, determinou que após a realização da assembleia o estatuto fosse apresentado a ela para apreciação.
Diante de todas estas variantes, como o interventor pôde ter estabelecido a próxima segunda-feira, 17 de abril, como prazo para inscrição das chapas que concorrerão ao pleito?
Como podem passar por cima da determinação da juíza? Todos os atos de uma instituição têm de ser feitos dentro das normas estatutárias e nem sabemos se o judiciário e o COB validarão o novo estatuto da entidade. Qual é o motivo de tanta pressa e por que fazer as coisas no atropelo?
O amadorismo e a inexperiência jurídica mostrados pelos gestores da CBTKD nos levam a crer que a juíza Adriana Sucena Monteiro ainda terá muito trabalho pela frente e dificilmente se livrará do imbróglio capitaneado por Chang Seon Lim e Yeo Jun Kim, presidentes das federações de Minas Gerais e São Paulo. Foram essas entidades que deram origem ao processo que culminou nesta assembleia anômala que escarneceu da legislação esportiva, acercando-se do surreal.
Se analisarmos o retrospecto dos dirigentes asiáticos que paralisaram o taekwondo no Brasil, veremos que ambos se perpetuam no poder em seus Estados. Chang Seon domina o taekwondo mineiro há exatos 33 anos, enquanto Yeo Jun Kim comanda o taekwondo paulista há 17 anos. Quanto tempo mais ambos pretendem fazer o taekwondo brasileiro refém de suas ambições?
Ao todo 22 dirigentes de federações com direito a voto participaram da AGE: Wistefaneo Mota da Costa (Alagoas), Alberto Maciel Júnior (Amapá), Ademar Inácio Lamoglia (Distrito Federal), Fábio Marques da Conceição (Espírito Santo), José Ricardo Favorito (Goiás), Diego Guimarães Ribeiro (Maranhão), Hélio Ribeiro da Costa (Mato Grosso), Fábio de Sena Costa (Mato Grosso do Sul), George Cláudio de Oliveira (Piauí), Rivanaldo Ferreira de Freitas (Rio Grande do Norte), Alexandre Bech Monquilhot (Roraima), Allan Fábio Siqueira (Santa Catarina), Pedro da Silva Araújo (Tocantins), Francisco Fábio Gomes (Ceará), Marcelino Soares Barros (Minas Gerais), Márcio de Souza Hernandez (Paraíba), Ricardo Luís Zimmer (Paraná), Itassi da Silva Camargo (Acre), Yeo Jun Kim (São Paulo), Rodrigo Veiga Gennari (São Paulo), Lécio Júnior Mizael (Minas Gerais) e José Antônio Soares (Rondônia).