Juíza rejeita preliminar e após ouvir testemunhas deverá estabelecer data para novas eleições na CBTKD

Carlos Fernandes, ex-presidente da CBTKD

Ação promovida por Carlos Fernandes expõe fraudes e vícios do processo que elegeu Alberto Cavalcanti Maciel Júnior e deu início a uma gestão fundamentada em desmandos e ilicitudes jurídicas na Confederação Brasileira de Taekwondo

Gestão Esportiva
10 de setembro de 2018
Por PAULO PINTO I Fotos BUDÔPRESS e ARQUIVO
Rio de Janeiro – RJ

Poucas semanas após a importante conquista de Maicon Siqueira nos Jogos Olímpicos Rio 2016, o taekwondo brasileiro sofreu um grande golpe com a decisão judicial que afastou Carlos Fernandes do comando da Confederação Brasileira de Taekwondo (CBTKD).

A partir daquela data desenrolou-se o processo de desconstrução de uma das 12 modalidades olímpicas que conquistaram medalhas para o Brasil nos jogos.

Com a saída de Fernandes, a CBTKD tornou-se presa fácil de um grupo que há muito tempo estava à espera de uma oportunidade para praticar toda espécie de ilicitudes que resultassem em vantagens pessoais.

Encabeçado por Valdemir José de Medeiros, ex-superintendente da CBTKD, o grupo promoveu uma eleição fundamentada em vícios em junho de 2017 e elegeu Alberto Cavalcanti Maciel Júnior. O ex-técnico da seleção brasileira também é secretário de Esportes do Estado do Amapá e quase não fica no Rio de Janeiro, deixando o comando da entidade nas mãos de seus subordinados e, em especial, de Valdemir José de Medeiros, ex-superintendente demitido no ano passado que atua como preposto do presidente até mesmo em audiências públicas.

Inconformado com o desfecho de um pleito absurdo, Carlos Fernandes, ex-presidente da CBTKD, moveu ação contra a entidade e, após ler os autos, a juíza de direito da 4ª Vara Cível do Rio de Janeiro, Andréia Florêncio Berto, entendeu a gravidade dos fatos e deu procedimento à ação.

Carlos Fernandes com Chungwon Chue, presidente da World Taekwondo Federation (WTF) no Rio de Janeiro

Na entrevista abaixo o ex-presidente da CBTKD mostra que não se dobrou e que está mais vivo que nunca na luta por seus direitos e pelo destino do taekwondo brasileiro.

Quais são as principais reivindicações de sua ação contra a Confederação Brasileira de Taekwondo (CBTKD)?

São três objetivos: que seja feita justiça, que os responsáveis por toda esta barbaridade e conjunto de fraudes jurídicas paguem pelo que fizeram, e que haja um sufrágio isento que reconduza o taekwondo brasileiro à normalidade.

Mas o que você busca exatamente?

Fraudaram o processo, com o objetivo de me afastar do pleito. Contaminaram todo o procedimento eletivo de uma entidade que recebe verba pública e, de quebra, desobedeceram a um dos principais dispositivos da Lei Pelé, impedindo que houvesse voto dos atletas.

Qual é o resultado prático da decisão proferida por Andréia Florêncio Berto, a juíza da 4ª Vara Cível do Rio de Janeiro?

Nota-se que a juíza não se deixou levar pelos pedidos e manobras concebidas pelos defensores da ré, que pretendem abafar e arquivar o processo de investigação. A magistrada separou as coisas e compreendeu claramente os motivos que nos levaram a mover esta ação. Em decisão precisa e acurada determinou que os fatos sejam aclarados, o que certamente deve ter tirado o sono daqueles que, de forma primária e tosca, vilipendiaram todo o processo e desdenharam da Justiça, já que o processo eletivo em questão foi fruto de uma decisão judicial.

Se não houve fraude, porque o jurídico da CBTKD está fazendo de tudo para arquivar essa ação?

O certo seria fazer esta pergunta ao Michel Asseff Filho, o advogado da confederação, ou ao seu provável assessor Valdemir Medeiros. Mas sei que talvez haja gente grande envolvida nesse processo, e não me surpreenderei se a polícia e a magistrada descobrirem que havia peixe grande apoiando esta fraude.

Quais dirigentes foram responsáveis pela impugnação de sua chapa na eleição de 2017?

Foram muitos, conforme consta nos autos. Mas o mais estarrecedor foi constatar que os poucos dirigentes que existiam naquele momento eram manipulados e comandados pelos funcionários da entidade. O alto escalão da equipe que formei corrompeu dirigentes, contaminou o processo, invalidou a inscrição de minha chapa e ainda conduziu outra chapa que não preenchias os requisitos necessários para participar do pleito. Um caso raro, no qual literalmente vimos a banana comendo o macaco.

Por que fizeram isto?

Primeiro para se perpetuarem no poder e segundo porque temiam a minha volta. Estes elementos sabem que jamais fui refém de ninguém, nunca me ajoelhei para os inimigos ou fiz acordos para levar vantagem. Fui eleito fazendo campanha limpa e não entrando pela janela, e tudo que prometi eu cumpri à risca. Existem algumas pessoas neste grupo que para se manter à frente da CBTKD passam até por cima da mãe.

As testemunhas arroladas em sua petição conhecem a verdade e podem explicar de que forma o processo foi conduzido?

Sim. Elas foram obrigadas a participar da trama que culminou na eleição do atual presidente. Estou certo de que se manterão fiéis aos seus princípios e exporão a verdade. Com isto eu acredito que a juíza Andréia Florêncio Berto terá subsídios necessários para restaurar a ordem, estabelecer nova data para a eleição e punir o grupo que tomou a Confederação Brasileira de Taekwondo de assalto.

Quem são estas pessoas que testemunharão?

No momento são: Juliano Tomé, advogado interventor; Carlos Carvalho, interventor nomeado pela Justiça; e Gláucia Maria, membro da comissão eleitoral.

Mesmo sendo demitido Valdemir José de Medeiros representa o presidente da CBTKD em audiências públicas e compromissos oficiais. Como isto pode acontecer?

É simples. Acho que existe um acordo entre eles. A meu ver, o Valdemir Medeiros foi o grande vencedor desta eleição. Conseguiu fazer acordos nos bastidores e deu uma rasteira nos dois grandes candidatos que brigavam na época: Yeo Jun Kim, de São Paulo, e eu. Ardiloso, ele correu por fora e lançou uma chapa encabeçada por Alberto Cavalcanti Maciel Júnior, ex-técnico da seleção que não conhece absolutamente nada de gestão. Prova disso é que a equipe de advogados que defendem a CBTKD até hoje é a mesma que eu contratei. Após as denúncias feitas pela revista Budô eu soube que o Valdemir José de Medeiros foi forçado pelo Sérgio Lobo (COB) a sair de cena. Ele recebeu uma indenização gigantesca, mas continua agindo nos bastidores. Na verdade, quem manda hoje na CBTKD é o Jorge Bichara, atual diretor de esportes do Comitê Olímpico do Brasil, mas todos comentam que é o Valdemir Medeiros que faz as manobras no jurídico da CBTKD.

Desde quando o Valdemir Medeiros ocupa cargos na gestão da confederação?

Ele já passou por quatro gestões e acredito que esteja há quase 20 anos na entidade. Ele foi diretor financeiro na gestão do mestre Yon Min Kim.

Qual é o fato preponderante no processo eleitoral da CBTKD, e o que isto pode ocasionar para o futuro da modalidade?

Olhando pelo lado do rendimento, posso afirmar que o taekwondo brasileiro parou no tempo e no espaço, e como exemplo comparo as medalhas que obtivemos no último ciclo olímpico com o que conquistamos até aqui no ciclo atual. Tivemos inúmeras medalhas em mundiais e um pódio na Rio 2016, além de um titulo inédito de campeão olímpico da juventude, enquanto no ciclo atual ainda estamos zerados. No campo pessoal o agravante é que no lugar do Júnior Maciel eu teria vergonha de ter sido eleito desta forma. Teria vergonha de ver um parceiro meu jogado aos leões. Fui eu que proporcionei o comando da seleção ao Maciel. Ele me traiu de forma vergonhosa, por vaidade e ganância, e consequentemente traiu toda a comunidade taekwondista. Outro ponto importante é que como ex-técnico da seleção brasileira ele deveria ter sido o primeiro a sair em defesa dos atletas e facultar a eles a possibilidade de participarem do pleito, mas não fez por saber que sua casa já estava pronta.

E sobre o futuro da modalidade?

A qual futuro você se refere? Você acredita que com estes vândalos agindo nos bastidores da CBTKD a modalidade terá algum futuro? Nunca antes houve uma distribuição e venda de diplomas tão expressiva em tão pouco tempo numa gestão como nessa. Eles estão mantendo-se à frente do processo fazendo negociações e aumentando a graduação daqueles que os pressionam ou por troca de favores.

Já é possível fazer um balanço da gestão Júnior Maciel?

É uma gestão de proveta que nasceu de seis meses, ainda está entubada e até hoje aguarda alta para sair da CTI. Todos comentam que o Maciel se tornou refém dos abutres que o colocaram na presidência. Dizem que o Valdemir e o Bichara o mantêm de mãos atadas e de joelhos. Tanto é que o Valdemir tem sido o representante da CBTKD em audiências públicas e demais compromissos. É vergonhoso ver a que ponto chegamos e estarrecedor ver o silêncio amedrontado de alguns. A gestão do Maciel me lembra aquela novela O Bem-Amado, em que o Odorico Paraguaçu tinha seus cúmplices e queria a todo custo inaugurar um cemitério. Os presidentes de federações, atletas e técnicos têm de entender que a CBTKD existe para servir e não para ser servida.

Você crê que após ouvir as testemunhas a juíza convocará novas eleições?

Eu creio na verdade e na justiça divina, que é a maior de todas. Já disse antes que a magistrada mostrou em sua decisão que possui ampla percepção dos fatos e muita coragem. Os depoimentos serão contundentes e não deixarão margem a dúvidas sobre o processo eletivo. Tenho plena convicção de que a justiça será feita. Lembro ainda que o outro processo, que corre na 16ª Vara Civil, não acabou e foi para Brasília, pois entendemos que também ouve manobra na assembleia estatutária.

Qual é a postura dos presidentes das federações estaduais?

Em sua maioria os dirigentes estaduais são pessoas sérias, não se deixam enganar e estão atentos. Acredito que não se contaminarão com as falsas promessas dos atuais gestores da CBTKD. Quase todos já estão vendo e entendendo o que aconteceu de fato nas eleições de 2017. As federações precisam ser protegidas, apoiadas e incentivadas e não serem enganadas ou terem seus territórios invadidos. Acredito que se a juíza de direito da 4ª Vara Cível, Andréia Florêncio Berto, mantiver a busca pela verdade em breve a nossa modalidade estará livre destes elementos e poderá voltar a focar grandes objetivos e metas, para atletas, técnicos e mestres, mirando Tóquio 2020 e Paris 2024.

Cópia da decisão proferida por Andréia Florêncio Berto, a juíza da 4ª Vara Cível do Rio de Janeiro, fornecida por Márcio de Souza Hernandez, advogado de Carlos Fernandes