15 de novembro de 2024
Pela primeira vez na história dirigentes estaduais se unem em torno de um mesmo propósito e pedem socorro à CBJ
Atoladas em dificuldades para sobreviver à quarentena imposta pela pandemia da covid-19, federações unem-se para pedir ajuda financeira da Confederação Brasileira de Judô
Gestão Esportiva
21 de junho de 2020
Por PAULO PINTO I Fotos BUDOPRESS e ARQUIVO
Curitiba – PR
Enquanto vêm suas limitadas fontes de receita sumirem por falta de competições e outros eventos, as federações estaduais unem forças para buscar ajuda de quem mais pode contribuir: a Confederação Brasileira de Judô. Pela primeira vez nos 41 anos de existência da entidade nacional dirigentes de todos as regiões trabalham em conjunto. A iniciativa, não por acaso, partiu das federações mais bem estruturadas que, embora não imunes às dificuldades, sabem que para as coirmãs menores, a ajuda, é questão de vida ou morte.
Em pelo menos meia dúzia de reuniões virtuais líderes estaduais apresentaram reivindicações, discutiram formas de contornar dificuldades e redigiram um documento com seus pleitos endereçado ao presidente da CBJ, Sílvio Acácio Borges. Além de recursos da Lei Agnelo Piva, a confederação recebe verbas de instituições privadas, o que lhe dá disponibilidade financeira, pois não tem gastos com eventos e competições neste período em que todas as atividades estão suspensas.
O clima agora é de expectativa. Há dirigentes francamente otimistas e outros mais reservados, ou até céticos. O dirigente máximo do judô brasileiro já acenou com algumas medidas para socorrer as federações, o que deixou alguns satisfeitos e outros, nem tanto.
O documento
No documento encaminhado ao presidente da CBJ, o grupo identificado como Entidades de Administração Regional do Desporto (Federações Estaduais de Judô) relata que a decisão de pedir ajuda à entidade nacional “com muita preocupação e solidariedade ao cenário jamais visto em nosso Brasil e no mundo por conta da crise sanitária e seus reflexos principalmente na área econômica”, foi tomada em reuniões por videoconferência nas quais se discutiram os impactos da pandemia.
Os signatários da carta dirigida a Sílvio Acácio Borges lembram que a decretação de estado de calamidade pública pelo Congresso Nacional permite a tomada de medidas excepcionais e torna menos rígidas as regras para aprovação de gastos. “Ainda, a nosso ver, nosso líder maior deve revestir-se de sensibilidade para analisar as questões postas sob a ótica do estado de calamidade pública que certamente, se não eram permitidas, atualmente a realidade será outra, ponderando bom senso, sabedoria e razoabilidade em benefício de nossas federações”, especificam os dirigentes.
E acrescentam: “Se os eventos esportivos estão temporariamente suspensos/cancelados até julho/2020, crível se falar em direcionar esses valores não gastos como espécie de ajuda de custo, por mais simples que seja, de auxílios e incentivo.”
No entender dos dirigentes estaduais, contratos celebrados com patrocinadores podem ser revistos, assim como a aplicação de verbas de origem federal desde que o colegiado assim decida. “É preciso ter coragem e sensatez ao ponto de, se somos nós, presidentes de cada federação, que em colegiado aprovamos ou não as contas de nossa confederação, por que não aprovarmos em conjunto um plano de ajuda de custo às federações?”, argumentam.
Antes de enumerar uma série de propostas para concessão de auxílio, o documento redigido pelos dirigentes estaduais, que inclui um quadro demonstrativo das despesas médias mensais de cada federação, deixa claro que a circular 09/2020 da CBJ, prometendo apoio por meio de projetos oriundos da Lei de Incentivo, “não atende o caráter emergencial que as federações necessitam para superar as consequências do atual momento”.
Avaliação dos dirigentes estaduais
“Mais do que recursos para situações emergenciais, precisamos que o esporte se una e encontre saídas para conviver com está nova realidade.” A afirmação é de Fernando Moimaz, presidente da Federação Mato-Grossense de Judô (FMTJ), que justifica sua integração ao movimento dos presidentes das federações: “Somos um País grande, com realidades e necessidades diferentes, mas o sentimento que nos move no momento é de união para discutirmos esta realidade”.
Com as academias fechadas e aulas e treinos suspensos em todo o Estado, Moimaz entende que se deve buscar a volta da normalidade diante das novas condições e confia nos órgãos e profissionais da saúde no Brasil, “que poderão orientar-nos para que o esporte retorne às suas atividades com segurança”. Ele acredita que a população ainda não está segura e lembra que é necessário aguardar a decisão das autoridades.
E conclui: “A CBJ tem-se revelado muito solidária e preocupada diante desta realidade e está empenhada na busca de alternativa de apoio às federações, mostrando-se presente neste momento de crise. Temos feito reuniões online com frequência com os presidentes e a equipe técnica”.
Adjaílson Fernandes Coutinho, presidente da Federação Paraibana de Judô (Fepaju), enfatiza que as entidades estaduais, com suas atividades paralisadas, têm amargado sérias dificuldades para arcar com seus custos operacionais e de manutenção, diante das restrições sanitárias impostas pelas autoridades públicas no combate ao coronavírus.
“Diante dessa trágica situação, as federações elaboraram uma pauta de proposituras, solicitando auxílio da CBJ para superação desta crise”, conta. “E o professor Sílvio Acácio acenou positivamente e se dispôs a buscar soluções viáveis em conjunto com as gestões estaduais.”
Coutinho descreve o cenário do judô na Paraíba como bastante trágico, decorrente do acúmulo de dívidas, com as escolas e academias aterrorizadas com o severo quadro financeiro que o momento apresenta. “Todos estamos cientes das dificuldades”, arremata, “mas acredito nesse esforço comum entre federações e a CBJ.”
Até mesmo para São Paulo a situação está muito complicada. “O impacto que sentimos deve-se ao fato de não conseguirmos realizar nenhum evento, com exceção do credenciamento técnico”, afirma Francisco de Carvalho Filho, presidente da Federação Paulista de Judô (FPJudô).
Ele lembra que a federação tem compromisso com as associações e os professores que fizeram suas inscrições e pagaram suas taxas anuais. “Teremos, portanto, dois anos problemáticos: este, porque não conseguimos realizar eventos e o próximo, quando teremos de oferecer uma contrapartida para todos que pagaram suas taxas”, prevê o dirigente.
Francisco de Carvalho acredita que a CBJ será sensível aos pedidos das federações, uma vez que são subscritos pela quase totalidade dos presidentes. “A CBJ deverá sinalizar com aquilo que for possível, lógico, a exemplo do que o Comitê Olímpico do Brasil está fazendo. A confederação certamente tem recursos para tanto, provenientes da iniciativa privada e dos projetos com a Secretaria Especial do Esporte, segundo fomos informados.”
Moisés Gonzaga Penso, presidente da Federação Catarinense de Judô (FCJ), considera a atitude dos dirigentes estaduais mais do que uma simples iniciativa para combater dificuldades, um posicionamento real como gestores de entidades para solicitar apoio da CBJ num momento muito importante. “Acredito que a CBJ entenda que as federações são a parte mais importante do judô nacional e que, até por uma obrigação institucional, tem de ouvir e procurar atender as demandas das federações dentro daquilo que a lei e a gestão financeira permitem. Acho que a CBJ não vai se furtar disso porque é quase uma obrigação da entidade.”
Penso informa que o governo do Estado pode liberar as aulas em julho e que nesse mês a FCJ possa realizar seu primeiro evento. E acrescenta: “A federação, apesar do momento crítico e porque estamos conseguindo fazer uma gestão financeira muito equilibrada, tem conseguido honrar seus compromissos e manter sua estrutura de pessoal. Mas, se o judô não voltar logo e não conseguirmos fazer eventos até o fim de agosto, teremos problemas muito sérios”.
No Amapá, a maioria dos clubes não se dedica exclusivamente ao judô e depende das mensalidades para sobreviver. Como tudo está parado desde março, as dívidas com aluguel e pagamento de outros serviços se acumulam, informa Antônio Jovenildo Viana, ex-presidente da Federação Amapaense de Judô (FAJ). Por isso ele apoia o pleito dos dirigentes estaduais à CBJ. “Aguardamos um posicionamento positivo por parte da confederação”, diz. “Contamos com uma atitude que possa amenizar a situação dos Estados.”
Para Delfino Batista da Cunha Filho, presidente da Federação de Judô do Estado do Acre, o momento atual exige ações rápidas e assertivas para minimizar os prejuízos decorrentes da pandemia.
“Não está sendo fácil para nenhum dos presidentes de federação”, pondera. “Vejo como alternativa correta uma ajuda de custo aos companheiros, haja vista que estamos diante de um colapso econômico. Vamos levar algum tempo voltar à normalidade do judô no Acre.”
Marcelo Ornelas da Cruz França Moreira, presidente da Federação Baiana de Judô (Febaju), considera o movimento dos dirigentes um marco na história do judô brasileiro. “A CBJ nos tem recebido com muita sensibilidade, sempre buscando ações de apoio às federações, como o projeto de suporte às entidades apresentado na última quarta-feira (10/06)”, disse. “O presidente Silvio Acácio tem sido um grande líder neste momento tão difícil que estamos atravessando e a parceria com a CBJ é fundamental para superarmos as consequências pós-pandemia.”
Entre as ações promovidas pela Febaju em âmbito interno, ele enumera isenção temporária das mensalidades dos clubes, desconto na inscrição no credenciamento técnico e no exame de faixa preta; criação de plataforma para cursos a distância e aconselhamento psicológico para atletas e professores.
As federações unirem-se para buscar seus direitos é uma atitude muito positiva, na avaliação do presidente da Federação de Judô do Estado de Roraima (FEJURR), Paulo Cézar de Oliveira Ferreira. Ele não esconde a tristeza por “estar de mãos atadas” e não poder ajudar os professores que estão fechando suas academias por total impossibilidade de mantê-las. “Ainda estamos aguardando uma decisão da CBJ. Os documentos com nossas proposituras já foram entregues à presidência e creio que estejam em análises para uma definição que nos seja favorável”, diz.
O dirigente de Roraima espera que a resposta da confederação venha com brevidade, pois a situação se agrava a cada dia que passa. Embora as atividades no Estado estejam suspensas, a federação divulga estudos em vídeos, “para manter os judocas atualizados no conhecimento e em movimento”.
O presidente da Federação de Judô de Mato Grosso do Sul (FJMS), José Ovídio Duarte da Silva, elogia os novos mecanismos de interação que aproximam as federações e permitem que todas se conheçam melhor. Ele está bastante otimista em relação à Confederação Brasileira de Judô e diz que seu presidente, Sílvio Acácio, recebeu as reivindicações estaduais “com um olhar construtivista e se pôs a trabalhar com a equipe da CBJ, na busca de trazer a luz aos anseios das federações”.
Depois de lembrar que a CBJ já tem um “projeto que vislumbra a ajudar as federações se os torneios e campeonatos voltarem acontecer”, o dirigente sul-mato-grossense revela que, apesar de seus filiados enfrentarem dificuldades devido à quarentena, a FJMS “vem de uma gestão financeira controlada, cumprindo com seus compromissos em dia”.
Para Antônio Luiz Milhazes Filho, presidente da Federação Alagoana de Judô (Faju), a união dos dirigentes estaduais em torno de um objetivo comum, “num momento inédito e devastador”, foi bastante interessante, mas ele lamenta a morosidade do processo. “Acho que houve um alongamento das discussões, e entraram algumas colocações que não estavam na pauta emergencial e poderiam ter sido postergadas. E o socorro às federações torna-se imediato e célere. Em virtude das inúmeras reuniões, só se fez postergar essas decisões e de concreto nada foi conquistado. Mas a nossa federação esteve presente, estive lá representando o Alagoas, até em respeito aos outros colegas.
Segundo Milhazes, a Faju por enquanto está conseguindo pagar suas contas, mas ele teme pelos próximos meses. “Particularmente falando, a prática do judô no ano 2020, em Alagoas, está condenada. Não teremos prática nenhuma, pelo menos esse é o prognóstico pessimista que eu faço.” E lembra que em abril enviou um relatório de suas necessidades à CBJ, a pedido da própria entidade, mas ainda não obteve retorno.
Tibério Maribondo do Nascimento, presidente da Federação de Judô do Estado do Rio Grande do Norte (FJERN), observa que as seis reuniões não se limitaram a elaborar uma proposta de algumas ajudas imediatas, mas serviram também para avaliar pontos que podem ser discutidos no futuro, “de repente até na próxima gestão”.
“Estamos num momento de esperar sem ansiedade e com muita responsabilidade”, revela o dirigente potiguar. “Temos uma funcionária em home office e nossas obrigações com ela têm sido cumpridas regularmente. Nossa federação não deve nada e tem todas as suas contas em dia.”
De qualquer forma, ele está otimista quanto ao resultado da iniciativa dos dirigentes estaduais. “O presidente Sílvio mostrou-se muito receptivo desde que foi contatado, em abril, e o setor de projetos da CBJ nos solicitou que listássemos o que é mais importante, necessário e urgente. Estamos aguardando o posicionamento da confederação. Avalio que há boa possibilidade de as coisas acontecerem e espero que o presidente Sílvio tenha noção da responsabilidade que a CBJ tem de amparar as federações.”
Luiz Hisashi Iwashita, presidente da Federação Paranaense de Judô (FPrJ) considera “desesperadora” a situação do Paraná, onde se ensaiou uma reabertura, logo frustrada pelo aumento da contaminação. Ele acha positiva a união de dirigentes estaduais, que jamais se haviam reunido em torno de uma proposta. “Só não imaginávamos que usaríamos nossa força para tentar resolver algo tão emergencial e importante como o impacto da pandemia que asfixiou a nossa modalidade.”
“Sinceramente falando, eu esperava um posicionamento mais efetivo do presidente da CBJ”, desabafa o dirigente paranaense, “Na semana passada ele acenou com projetos de Lei de Incentivo e iniciativas de médio e longo prazos, nada que efetivamente nos auxiliaria, neste momento tão difícil. Espero que o presidente Sílvio Acácio Borges tenha noção da responsabilidade que a CBJ tem de estar amparando as federações de forma concreta e efetiva.”
Em Goiás, o cenário é praticamente igual ao dos outros Estados: poucos recursos financeiros, mas fazendo reuniões com técnicos e árbitros, lançando eventos virtuais e competições funcionais, e principalmente, mantendo o curso de formação de faixas pretas online.
Josmar Amaral Gonçalves, presidente da Federação Goiana de Judô (Fegoju), resume o que foi debatido nos encontros virtuais dos dirigentes: “Tivemos várias iniciativas e ideias e pensamos em projetos para auxílio emergencial às federações, coisas básicas como pagamento de aluguel das sedes e depósitos de tatamis e equipamentos advindos do PAF-CBJ.”
Para Gonçalves, a CBJ está fazendo sua parte. “Somente temos a parabenizar o presidente Silvio Acácio Borges e toda sua equipe, que foram pontuais e apresentaram de imediato um projeto por meio da Lei de Incentivo, que já está elaborado e com certeza será bem sucedido”, avalia, lembrando que em nenhum momento as reuniões tiveram objetivo político.
Georgton T. Burjar Moura Pacheco, presidente da Federação de Judô do Estado de Tocantins (Fejet) defende que a CBJ possui receitas que podem viabilizar a sobrevivência das federações. “Entendo que vivemos um momento histórico, no qual não cabem medidas paliativas e procrastinatórias. As cartas estão na mesa e o jogo precisa ser jogado”, disse à Budô o dirigente tocantinense.
Para ele, o bom desta situação, foi ver as grandes federações procurarem uma maneira de ajudar as menores, provocando a CBJ e mostrando que a união é a melhor maneira de obter resultados. “Não precisamos aceitar ajudas de maneira individualizada, deixando de evoluir no todo”, enfatiza.
Como federação mais nova do judô, a Fejet carece de tudo. “Todos os materiais – tatamis, equipamento eletrônico e acessórios – que recebemos na era Paulo Wanderley, via Ministério do Esporte, ficam guardados em minha chácara”, conta Ton Pacheco. “Não temos dinheiro para pagar aluguel ou sequer uma secretária. E o nosso contador trabalha por um valor simbólico.”
Márcio de Oliveira Almeida, presidente da Federação Espíritossantense de Judô (FEJ), considera muito positivas as reuniões dos dirigentes porque cada um pôde expor as peculiaridades de sua federação e chegar ao consenso no final. “Encaminhamos uma série de propostas a Confederação Brasileira de Judô, que deu retorno dentro do que esperávamos”, explica. “O presidente Sílvio foi bastante coerente nas colocações que fez, e as federações ficaram bastante satisfeitas, porque é um momento muito difícil que todos nós vivemos.”
E conclui: “Aqui no Espírito Santo fizemos um planejamento muito bem feito, estamos conseguindo controlar o caixa, temos dinheiro para enfrentar os próximos três meses sem dificuldade. Liberamos os clubes das mensalidades para pagamento somente no segundo semestre.”