Picciani decretará que atletas tenham 1/4 dos votos nas confederações

Leonardo Picciani exibe a Cartilha de Governança em Entidades Esportivas, lançada nesta segunda-feira (02 de abril)

A portaria que regulamenta os artigos 18 e 18-A, dará maior transparência e maior representatividade aos atletas, assim como aconteceu com o COB

Gestão Esportiva
03/04/2018
Por DEMÉTRIO VECCHIOLI/UOL I Fotos MINISTÉRIO DO ESPORTE
Brasília – DF

Leonardo Picciani vai deixar o Ministério do Esporte até o fim da semana, não sem antes assinar uma portaria ministerial que promete ser o grande ato de sua passagem de quase dois anos pela pasta. No texto, ele vai regulamentar o artigo 18-A da Lei Pelé. Nas assembleias das confederações, a participação de atletas na comparação com as federações precisará ser igual à que já existe no COB: um voto de atleta para cada três de federações. Ou seja: cerca de um quarto dos votos da assembleia.

A informação sobre a portaria foi dada ao Olhar Olímpico pelo próprio Picciani. “Vamos editar a portaria que regulamenta os artigos 18 e 18-A, dando maior transparência, maior representatividade aos atletas, no mesmo modo que aconteceu com o COB. Mas regulamentaremos por força de portaria ministerial, que se expandirá a todas as entidades de administração do esporte”, afirmou o ministro ao blog. Ele entregará o cargo para poder concorrer à reeleição como deputado federal do MDB/RJ.

Os artigos 18 e 18-A da Lei Pelé foram tema de amplo debate em 2013, quando a ONG Atletas pelo Brasil, então liderada pela ex-jogadora de vôlei Ana Moser, conseguiu que passasse no Congresso e fosse editada pela presidente Dilma Rousseff uma Medida Provisória modificando o texto da lei. Ali, por exemplo, a reeleição de presidentes de confederações ficou limitada a dois mandatos, entre outras coisas.

Também foi incluída a exigência de participação de atletas na assembleia das confederações, mas em um texto genérico, que dependeria de portaria ministerial. O texto da Lei Pelé ficou assim: “(somente poderão receber recursos da administração pública federal direta e indireta as confederações que estabeleçam em seus estatutos a) participação de atletas nos colegiados de direção e na eleição para os cargos da entidade”.

Desde então, as confederações abriram espaço para os atletas, mas cada uma a seu modo. A Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA), por exemplo, inicialmente tinha um voto de atleta com peso um, contra 27 votos de federações com peso seis. No ano passado, o peso foi equiparado, mas apenas um atleta vota, contra as mesmas 27 federações. Na Confederação Brasileira de Vôlei (CBV), em março os atletas, que tinham direito a dois votos, conseguiram dobrar o espaço para quatro, ainda que pretendessem 10.

Picciani e o secretário da ABCD, Luiz Celso Giacomini e Rogério Sampaio, secretário nacional de Esportes de Alto Rendimento

Consequências

Ao blog Olhar Olímpico, Picciani afirmou que a portaria determinaria os atletas fazendo parte de 1/3 do colégio eleitoral. Mas o Olhar Olímpico apurou que na verdade a conta é: os atletas terão direito a 1/3 dos votos das federações. Ou seja: em uma confederação com todos os 27 estados/distrito federal filiados, seriam nove votos de atletas – até 1/4 do colégio eleitoral, portanto – num universo de pelo menos 36 membro (clubes e árbitros também têm voz, quase sempre pequena). Hoje, só as confederações de vela (voto universal a todos os atletas), atletismo (15 atletas) e basquete (10) cumprem o determinado com relação aos atletas.

Mas isso não significa exatamente que os atletas terão 1/3 da força das federações, como acontece no COB, por exemplo. É que o texto da Lei Pelé permite que as entidades determinem pesos diferentes para os votos, de um a seis. Assim, não será ilegal que numa confederação com 27 federações, os nove atletas tenham votos que, somados, equivalham a de uma federação e meia. Vai da cada uma determinar esse peso.

Também ao Olhar Olímpico, Picciani disse que as confederações olímpicas e paraolímpicas – e também os comitês olímpicos (COB), paraolímpico (CPB) e de clubes (CBC), além da CBDU (desporto universitário) e CBDE (desporto escolar) – terão 90 dias para regulamentar as determinações da nova portaria, que vai também abranger outras questões de transparência.

A adequação não é exatamente obrigatória, como tudo que consta na Lei Pelé e na Lei Piva. Porém, quem não se adéqua deixa de ser apto a receber os recursos das loterias federais. Ou seja: não consegue sobreviver. A exceção, há muitos anos, é a Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Ao regulamentar a 18-A por meio de portaria, Picciani passou à frente dos deputados da Comissão do Esporte da Câmara, principalmente o ex-judoca João Derly, que tramitam um projeto de lei que deveria seguir no mesmo caminho. A atual versão do PL, porém, é até um pouco mais ampla, determinando não só 1/3 dos votos para os atletas, mas também 1/3 dos votos para os clubes. As federações ficaram com outro 1/3 do colégio eleitoral das confederações, apenas.

Mas, pelo que apurou o blog, não há base legal para que a portaria ministerial faça essa inclusão dos clubes – como ela também não pode eliminar a diferenciação de peso dos votos. Tudo isso precisa passar pelo Congresso. No ano passado, a Atletas pelo Brasil foi à Câmara e combinou com o deputado Rodrigo Maia, presidente da Casa, uma agenda para que temas como esse fossem votados.

Legado

Ex-líder do governo Dilma na Câmara, Leonardo Picciani desembarcou no governo Temer assim que o então vice-presidente assumiu a Presidência da República. Nos quase dois anos à frente do ministério, teve que lidar com um orçamento enxuto e preferiu investir o pouco que tinha em eventos não-olímpicos, como Mundiais de Natação e Vôlei de Praia Militares e Mundial de Stand-Up Paddle.

Seu grande plano era viabilizar o Parque Olímpico do Barra, criando uma autarquia especialmente para isso, a AGLO. Apesar do orçamento de R$ 150 milhões para este ano, o plano falhou. O velódromo foi pouco utilizado (ainda que tenha recebido um Mundial Paraolímpico no mês passado), o centro de treinamento da Arena Carioca 2 não foi implantado e a Arena Carioca 1 só vingou porque não cobra aluguel dos clubes cariocas que jogam o NBB. A Arena do Futuro (handebol) e o Estádio Aquático, que deveriam ter sido desmontados até julho do ano passado, seguem como fantasmas que assombram o legado olímpico.

Assim, especialmente nos últimos meses, Picciani tem investido em pautas de interesse dos atletas e da opinião pública. Primeiro, cobrou que o COB aprovasse a participação de 12 atletas em sua assembleia – Picciani emitiu uma carta pública nesse sentido, logo após as confederações aceitarem só cinco cadeiras para atletas. Depois, firmou com o COB o TAC que passou a exigir uma série de ações de transparência por parte do comitê.

Agora, nessa reta final do mandato de Picciani, o ministério lançou uma campanha contra o assédio às mulheres atletas e prepara a portaria que regulamenta a 18-A.

“Pudemos manter o funcionamento do ministério com um orçamento muito menor do que se teve nos anos anteriores. Fizemos integralmente o Bolsa Atleta, na área de esporte educacional renovamos o chamamento do segundo tempo, lançamos o Seleções do Futuro e Brincando com o Esporte. Reduzimos as despesas administrativas mais de 15 milhões de reais”, destacou o ministro, citando os legados de sua gestão, quando questionado pelo Olhar Olímpico.