Profissionais da Educação Física se posicionam sobre seu papel no combate à pandemia de covid-19

O profissional de EF é descrito como trabalhador da saúde © CDC

Um dos objetivos é reiterar a legitimidade da atuação da categoria nas ações de combate à epidemia e da inclusão dos profissionais na lista de prioridades para vacinação

Gestão
Por Américo Valdanha, Alexandre Drigo, Sebastião Gobbi e Nelson Leme
11 de fevereiro de 2021
Curitiba (PR)

Em carta aberta à população e autoridades, o presidente do CREF4/SP, Nelson Leme, e os delegados Américo Valdanha, Alexandre Drigo, Sebastião Gobbi, da mesma regional, reiteram o reconhecimento social e científico da atuação do profissional de Educação Física e sua presença essencial no contexto do combate à pandemia da covid-19.

O objetivo do documento é, principalmente, evitar desencontros de informação, principalmente com o uso de termos inadequados, “como o de sugerir que tais profissionais, regulares no exercício legal de sua profissão e convocados pelo Plano Nacional de Vacinação Contra Covid-19, sejam tratados com descaso e como um fura-fila”.

Prof. Dr. Alexandre Janota Drigo © Budopress

A seguir, a íntegra da carta

Carta aberta esclarecendo sobre o profissional de Educação Física no contexto da imunização contra covid-19

O avanço da Campanha Nacional de Vacinação contra a covid-19 traz à tona em toda a população brasileira a esperança do retorno a uma rotina que, por senso comum, pode-se chamar de “normal”. Entretanto, o fato de não haver doses disponíveis de imediato a toda população exige do poder público uma definição de prioridade e o estabelecimento de um cronograma de vacinação.

Inevitavelmente, haverá discussões sobre, mas é preciso tal atitude para que possamos avançar de forma ordenada. Como não poderia ser diferente, as primeiras doses de vacina foram destinadas aos profissionais de saúde que atuam na chamada “linha de frente” do combate à covid-19. São profissionais, dentre as profissões da saúde, que lidam diretamente nos espaços de acompanhamento e internação dos serviços de saúde primaria, secundária e terciária, tanto no setor público, como privado.

Após essa etapa, seguiu-se a vacinação dos demais profissionais da saúde, uma vez que esses têm a função de atender à população no tocante à manutenção e melhora das condições de saúde individual e coletiva. Devido a isso, possuem maior possibilidade de exposição ao contágio por conta de suas atividades laborais.

Neste ponto, surgiram diversas indagações sobre a prioridade de alguns profissionais na campanha de vacinação. Assim, com este texto, esperamos contribuir para elucidar, não apenas no aspecto legal, mas principalmente no contexto de legitimação de atuação profissional, a presença de profissionais da saúde, particularmente os profissionais de Educação Física, na segunda parte da primeira etapa de vacinação.

Primeiramente, é importante esclarecer que essas etapas, cumpridas nas unidades de vacinação dos municípios, é definida pelo “Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19” elaborado pelo Ministério da Saúde que, em seu anexo II (p. 89) e também no anexo II do 2º Informe Técnico – Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação Covid 19, também do Ministério da Saúde,  apresenta a população-alvo como trabalhadores da saúde, seguido da definição de quem esses são e as recomendações para o planejamento da ação de vacinação.

Hierarquicamente, o conteúdo do plano nacional está presente no Documento Técnico da Campanha de Vacinação Contra a Covid-19, do governo do Estado de São Paulo, que apresenta em seu anexo I a “descrição dos grupos prioritários e recomendações para vacinação”.

Por sua vez, o Município de Rio Claro (SP) elaborou seu PMI – Plano Municipal de Imunização Contra a Covid-19 respeitando as orientações estaduais e federais, apresentando em seu anexo II a definição do público-alvo para a campanha de vacinação conforme o Plano Nacional de Imunização, 2021.

O profissional de Educação Física está descrito como “trabalhador da saúde” no documento federal e também nos documentos estadual e municipal.  Talvez haja um desconhecimento da maioria das pessoas, porém, desde a publicação da resolução nº 218 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) em 1997, a EF já é reconhecida como integrante da área da saúde, mesmo antes da lei nº 9.696, de 1º de setembro de 1998, que regulamenta a profissão de Educação Física (um avanço na defesa da sociedade, garantindo o seu direito de ser atendida por um profissional qualificado e eticamente balizado).

Nelson Leme da Silva Junior, presidente do CREF4/SP © Arquivo

No ano de 2008, a portaria nº 154 do Ministério da Saúde inseriu o profissional de Educação Física nas Equipes do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF). Cinco anos depois, a lei nº 12.864 incluiu a atividade física como fator determinante e condicionante de saúde. Em 2017, a portaria nº 2.022 do Ministério da Saúde possibilitou a inscrição de estabelecimentos que desenvolvem atividades físicas (como é o caso das academias de ginástica) no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES).

De maneira coerente, com a inserção do profissional de Educação Física no setor saúde, as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para os Cursos de Educação Física (resolução nº 6 de 2018 do Conselho Nacional de Educação) orienta a formação no sentido de que o futuro profissional de Educação Física possa “intervir academicamente de forma fundamentada, deliberada, planejada e eticamente balizada nos campos da prevenção, promoção, proteção e reabilitação da saúde”.

Em 2020, os profissionais de Educação Física foram reconhecidos pelo Ministério da Economia, na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), sob o código 2241-40, como “profissional de Educação Física na saúde”. É importante ressaltar que, para o exercício das ocupações descritas na CBO, requer formação superior em Educação Física e registro no Conselho Regional de Educação Física (CREF).

Logo no início da pandemia no Brasil, o governo federal publicou a portaria nº 639 em 31 de março de 2020, a qual dispõe sobre a ação estratégica O Brasil Conta Comigo – Profissionais da Saúde, voltada à capacitação e ao cadastramento de profissionais da área de saúde para o enfrentamento da pandemia do coronavírus (covid-19). No § 1º, fica claro que “considera-se profissional da área de saúde aquele subordinado ao correspondente conselho de fiscalização das seguintes categorias profissionais: (…) item IV Educação Física”.

Vale a pena destacar que 74 mil profissionais de EF se cadastraram e tiveram acesso ao curso on-line de capacitação. Dentre profissionais de 14 profissões da saúde que realizaram seu cadastro, a educação física ficou entre as seis com maior número de profissionais dispostos a atuar no enfrentamento da pandemia.

Dentre todo o contexto apresentado, o CREF4/SP encaminhou um ofício aos três poderes: federal, estadual e municipal, sendo, respectivamente, aos ministérios da Saúde e da Educação, à Secretaria Estadual de Saúde e às 645 secretarias municipais de Saúde de São Paulo.

Cabe aqui destacar as respostas aos Ofícios do Conselho Regional de Educação Física da 4ª Região (CREF4/SP):

1) nº 0019/21 (0018508176), de 7 de janeiro de 2021, onde o Sr. ARNALDO CORREIA DE MEDEIROS, secretário da Secretaria de Vigilância em Saúde destaca:

Em consonância com o ofício enviado, ressalta-se a inclusão dos profissionais de educação física na categoria de trabalhadores da saúde.

2) n° 2112/20 que, em reposta, a Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo expressa:

“… que os profissionais de Educação Física também estarão contemplados na 1ª. fase do Programa Estadual de Imunização da COVID-19 como trabalhadores de saúde, devendo apresentar na unidade de saúde onde será realizada a vacinação o documento (carteirinha / CIP) que o vincule ao Conselho Regional de Educação Física (CREF) …”.

Prof. Dr. Sebastião Gobbi © Arquivo

Além do aspecto legal que envolve a presença do profissional de Educação Física na primeira etapa da Campanha Nacional de Vacinação contra a covid-19, poderíamos aprofundar em detalhes das questões bio-físico-químicas que envolvem a prática de atividade física regular orientada por um profissional habilitado em espaços de promoção de saúde e a relação dessas como parte da solução da covid-19, uma vez que a hospitalização é 34% menor entre pessoas fisicamente ativas.

De forma sucinta, com base em documentos elaborados pela Associação Brasileira de Academias e pelo Manifesto Internacional para a Promoção da Atividade Física no Pós-Covid-19: Urgência de uma Chamada para a Ação, apontamos alguns benefícios:

  • Reduz o processo inflamatório e melhora o processo imunológico;
  • Melhora as enfermidades crônicas (diabetes, hipertensão, obesidade);
  • Reduz o estresse, a ansiedade e a depressão;
  • Contribui com o equilíbrio do cortisol;
  • Produz antioxidantes que reduzem a gravidade de síndrome de estresse respiratório (séria complicação da covid-19);
  • Melhora a resposta imunológica às vacinas;
  • Pode trazer benefícios metabólicos e cardiorrespiratórios.

Por motivos como esses o governo federal publicou o decreto nº 10.344, de 8 de maio de 2020, que acrescenta ao decreto nº 10.282, de 20 de março de 2020, que regulamenta a lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, para definir os serviços públicos e as atividades essenciais:

Art. 3º….

  • 1º ……

LVII … academias de esporte de todas as modalidades, obedecidas as determinações do Ministério da Saúde.

Assim como no âmbito do governo federal, o governo do Estado de São Paulo reviu seu Plano de Quarentena autorizando os espaços das academias de esporte de todas as modalidades a funcionarem até a Etapa Laranja do Plano São Paulo, desde que respeitando as orientações sanitárias definidas pelo Conselho de Educação Física.

Dr. Américo Valdanha Netto © Arquivo

O profissional de Educação Física continua atuando para promover saúde para a população. Mesmo quando respeitadas as regras presentes nas recomendações da educação física frente à pandemia, o profissional de Educação Física, assim como outros profissionais de saúde, em sua atividade laboral está mais exposto à infecção.

O reconhecimento histórico do governo federal, Ministério da Saúde, Ministério do Trabalho, governo estadual e governos municipais se faz presente legalmente nos planos de vacinação contra a covid-19. O reconhecimento social e científico da importância da atuação do profissional de EF também se faz presente tendo sua atividade laboral reconhecida como essencial no contexto da pandemia.

Portanto, esperamos que não haja mais desencontros de informação, principalmente com o uso de termos inadequados, como o de sugerir que tais profissionais, regulares no exercício legal de sua profissão e convocados pelo Plano Nacional de Vacinação Contra Covid-19, sejam tratados com descaso e como um “fura-fila”. Nossa sociedade já está sofrendo demais com a pandemia e não podemos construir mais barreiras, principalmente por desconhecimento.

Prof. Dr. Américo Valdanha Netto
Profissional de Educação Física – CREF 061389-G/SP
Profissional Delegado CREF 4/SP

Prof. Dr. Alexandre Janota Drigo
Profissional de Educação Física – CREF 000839-G/SP
Profissional Delegado CREF4/SP

Prof. Dr. Sebastião Gobbi
Profissional de Educação Física – CREF 000183-G/SP
Profissional Delegado CREF4/SP

Prof. Nelson Leme da Silva Junior
Profissional de Educação Física – CREF 000200-G/SP
Presidente CREF4/SP

Todos os documentos citados neste texto podem ser encontrados AQUI