Técnica refinada e mente afiada: o legado de Kenkichi Fukushima

Mestre em ne-waza e estrategista refinado, Fukushima deixou um legado que ultrapassa gerações e ainda inspira praticantes em todo o mundo.

Por Paulo Pinto / Global Sports
Curitiba, 24 de abril de 2025

Discípulo direto de Jigoro Kano, fundador do judô, o professor kodansha kyuu-dan (9º dan) Kenkichi Fukushima (1889–1966) deixou um legado que transcende gerações. Mestre exigente e inovador, ele contribuiu de forma decisiva para a consolidação do judô como arte marcial, método educativo e esporte de alto rendimento. Seu nome continua a ser reverenciado nos tatamis pela precisão técnica, pela visão estratégica e pela ênfase na formação integral do ser humano.

Fundador da escola de judô que leva seu nome, Fukushima soube como poucos aliar tradição e renovação. Suas lições continuam moldando o judô moderno — e não apenas pelo aspecto técnico, mas pela profunda visão filosófica que orientava sua prática e seu ensino.

Mais do que força: Fukushima defendia a técnica como essência do judô

Ao longo de sua trajetória, Fukushima destacou-se pelo domínio de técnicas de projeção como o-soto-gari, uchi-mata, kata-guruma e harai-goshi, além de ser referência incontestável no ne-waza, com ênfase no controle e na precisão de imobilizações como kuzure-kami-shiho-gatame e yoko-shiho-gatame.

Mais do que um repertório técnico refinado, seus ensinamentos refletiam uma abordagem integral do judô, em que o aprimoramento mental e a leitura estratégica do combate ocupavam lugar central. Essa visão completa do Budô não apenas formou campeões, mas inspirou gerações de professores e praticantes ao redor do mundo — consolidando Fukushima como um dos pilares técnicos e filosóficos da tradição kodokan.

Técnica refinada e didática inovadora

Fukushima estruturou seu estilo sobre os pilares do Judô Kodokan, priorizando a execução correta dos movimentos, a eficiência nos golpes e o uso inteligente da energia. Era defensor convicto da máxima “vencer sem ferir” — um princípio que aplicava tanto nos nage-waza (técnicas de projeção) quanto no ne-waza (trabalho de solo).

Entre os golpes que caracterizavam seu tokui-waza, destacavam-se o o-soto-gari e o uchi-mata, arremessos de projeção clássicos que ele executava com fluidez e precisão. No solo, dominava com autoridade o kuzure-kami-shiho-gatame e o yoko-shiho-gatame, imobilizações que exigem leitura corporal e timing apurado.

Fukushima também era conhecido por suas combinações e contra-ataques, entre eles o kata-guruma e o harai-goshi, aplicados com astúcia e controle, sempre priorizando a eficácia e a economia de força.

Formador de campeões e de consciências

Mais do que formar campeões, Fukushima formou gerações de judocas conscientes, respeitosos e estrategistas. Seus ensinamentos ultrapassavam os limites do dojô. Ensinava que o verdadeiro combate era interno, e que cada treino era uma oportunidade de aprimoramento pessoal.

Seu legado permanece vivo não apenas nos registros históricos ou nas técnicas reproduzidas, mas principalmente no modo de pensar o judô. Uma prática que exige mais do que força: exige mente, alma e propósito.

O espírito de Fukushima nos tatamis de hoje

Seus alunos levaram adiante esse espírito, perpetuando seu método e sua filosofia. Muitos deles se tornaram referências técnicas, dirigentes e instrutores — e todos, sem exceção, reconhecem em Fukushima a figura de um mestre completo: firme, generoso e à frente de seu tempo.

Em uma era na qual o judô se moderniza e busca equilíbrio entre tradição e competitividade, o nome de Kenkichi Fukushima ressurge como bússola ética e técnica. Sua vida, obra e visão continuam inspirando judocas de todas as idades, reafirmando que a verdadeira essência do judô não está apenas em vencer o adversário, mas em transformar a si mesmo.