As medalhas do judô em Paris e a intervenção imposta pela CBJ na Federação Paulista de Judô

Anunciando sua saída do comando da entidade, em seu pronunciamento, Sílvio Acácio sugeriu que foi o melhor dirigente da CBJ © Global Sports

Estado que conquistou três medalhas individuais e três por equipes mistas em Paris está sob intervenção, vítima de uma perseguição política recorrente e sem precedentes por parte da CBJ.

Por Paulo Pinto / Global Sports
16 de agosto de 2024 / Curitiba, PR

No dia 11 de agosto, antes mesmo do encerramento dos Jogos Olímpicos de Paris, o presidente da Confederação Brasileira de Judô (CBJ) deu um depoimento fundamentado em mentiras e em seu caráter egótico e personalista.

Uma das pérolas proferidas por Sílvio Acácio Borges referia-se ao rendimento da equipe em Paris. “Estava, sim, em nosso planejamento estratégico nos tornarmos, oficialmente, uma das cinco potências mundiais do judô. Conseguimos!” Ele só não disse que antes do embarque da delegação ninguém projetava o Brasil com mais de uma ou duas medalhas na modalidade, com base nos resultados obtidos nas competições do World Tour da Federação Internacional de Judô (FIJ).

Outra afirmação mentirosa do dirigente: “Mudamos internamente após Tóquio 2020 e apostamos em uma renovação. Para isso, alargamos a boca do funil de entrada na seleção, triplicando, assim, a possibilidade de surgirem ainda mais novos talentos como os já gerados após a Rio 2016. E o resultado apareceu já nos primeiros dias de competição em Paris”.

Sim, é verdade, houve mudança, mas ele não mudou absolutamente nada. A mudança aconteceu porque Paulo Wanderley Teixeira, presidente do COB, convocou Ney Wilson da Silva para assumir um posto no Comitê Olímpico do Brasil e dividir, com o professor Kenji Saito, a diretoria de esportes do COB.

Com isso, finalmente, o alto rendimento pôde experimentar mudanças por meio do professor paulista Marcelo Theotônio, que era responsável pelas classes sub 18 e sub 21 e permitiu a participação de jovens atletas na seleção brasileira.

Outra mentira que chega a ofender milhares de professores anônimos, que fazem o trabalho incansável e até ingrato de formar atletas para o alto rendimento, diz respeito ao fomento das novas gerações. Vejam a coragem do dirigente: “Ao mostrarmos esta belíssima conquista em Paris, evidenciamos, também, tudo o que foi feito internamente, desde tornar a entidade referência em gestão, ética e transparência, até os cuidados com os nossos atletas, das categorias iniciais aos veteranos.”

A CBJ não cria e não cuida de absolutamente nada. Não fomenta coisa nenhuma. Muito pelo contrário, aproveita-se do trabalho desenvolvido por abnegados professores nos pequenos dojôs, em clubes e até mesmo em projetos sociais. Silvio Acácio se descola da realidade com enorme facilidade, e sua assessoria não consegue trazê-lo para a realidade.

Na verdade, são importantes clubes do País, como o Esporte Clube Pinheiros, Sogipa, Minas Tênis Clube e Clube de Regatas Flamengo, entre outros, que pagam altos salários para os atletas da seleção brasileira e mantêm o coração do judô e do esporte olímpico batendo com força e segurança. Não a CBJ.

Diferentemente de seu antecessor, que, enquanto presidiu a CBJ, jamais utilizou a figura de um medalhista para se autopromover, Sílvio Acácio está sempre nas fotos após conquistas em mundiais e olimpíadas © Kulumbegashvili Tamara / IJF

Sobre ser referência em gestão, somente uma mente doentia como a de Sílvio Acácio Borges poderia brincar com algo tão sério. O dirigente já esqueceu as marcas deixadas por ele que sempre serão lembradas. Ele perdeu o Centro Pan-Americano de Judô, o maior centro de treinamento de judô das Américas, situado em Lauro de Freitas, na Bahia. De quebra, o dirigente perdeu todos os patrocinadores herdados da gestão de Paulo Wanderley Teixeira. Empresas como a Petrobras, Bradesco, Scania, Infraero, Mizuno e Cielo deixaram os tatamis depois que a CBJ perdeu espaço na Rede Globo devido às trapalhadas de Sílvio Acácio, que acabaram implodindo o marketing da entidade.

Outro absurdo cometido pelo dirigente foi a série de besteiras absolutamente desconectadas da realidade: “Um olhar para o judô em todos os segmentos, do educacional/mental ao formativo/técnico, apoiando e respeitando a autonomia das 27 federações estaduais.”

Desde quando a CBJ faz algo nos âmbitos educacional e mental? Muito pior foi a mentira do presidente sobre as áreas formativa e técnica. Quando foi que a confederação formou um único atleta? Quem ensina judô é sempre um professor, e quem faz a lapidação técnica é o técnico ou treinador, nos clubes. O dirigente mente sem o menor pudor, desrespeitando os profissionais que realmente fazem esse trabalho.

Vamos finalizar esta breve análise sobre o infeliz discurso proferido pelo presidente da CBJ destacando e reiterando a sua mentira mais acintosa: “Apoiando e respeitando a autonomia das 27 federações estaduais.” Quando foi que Silvio Acácio apoiou as federações estaduais? Nem mesmo durante a pandemia ele o fez. O que ele faz, e nem se esforça para esconder, é dar benesses aos dirigentes que apoiam incondicionalmente toda e qualquer iniciativa tomada por ele. Estes, sim, são beneficiados.

Agora, ele ter o desplante de afirmar que respeita a autonomia dos estados é a maior sem-vergonhice dita por ele, que é, de longe, o dirigente que mais perseguiu e penalizou toda e qualquer pessoa que discordasse de suas loucuras, e não me refiro apenas aos dirigentes estaduais. Que o diga Maurício Carlos dos Santos, executivo da MCS, agência que, por mais de uma década, foi responsável pela negociação entre patrocinadores, CBJ e a FIJ – Federação Internacional de Judô. Foi a agência que trouxe Grand Slams e Grand Prix ao Brasil. Após uma série de problemas criados pelo dirigente, o executivo da MCS abriu mão do contrato que possuía com a entidade.

Fazemos questão de lembrar que a parceria entre a MCS e a CBJ projetou a entidade no cenário esportivo nacional de tal forma que, por volta de 2015, a Confederação Brasileira de Judô assumiu a liderança no ranking das confederações nacionais no quesito patrocínio vindo das iniciativas pública e privada. Hoje, a CBJ não possui um único patrocinador e faz parte do pelotão das entidades medíocres na captação de recursos.

Discurso falso e inconsistente

Na verdade, os atletas olímpicos que conquistaram as medalhas na competição individual em Paris surgiram em pequenos dojôs do interior e do litoral paulista. Posteriormente, migraram para grandes clubes, onde foram brilhantemente lapidados por técnicos com expertise nas principais competições mundiais e nos Jogos Olímpicos.

Se contabilizarmos as medalhas da competição por equipes mistas de forma individual e as somarmos aos pódios da disputa da classe sênior, os judocas paulistas voltaram de Paris com sete medalhas.

Além disso, o professor Marcelo Theotônio, gestor técnico da CBJ, é paulista. Os judocas Rafael Macedo e Leonardo Gonçalves, que compuseram a equipe mista do Brasil, são de São Paulo, elevando ainda mais o número de representantes do Estado em Paris. Outro importante dirigente paulista no CBJ é o renomado professor kodansha Edison Minakawa, gestor de arbitragem da CBJ.

Contudo, nada é capaz de fazer com que o presidente da CBJ se sensibilize e pare de perseguir e punir seus adversários políticos, que, aliás, nem mais fazem parte da gestão. Paulatinamente, ele destruiu todas as lideranças que não o apoiaram no último pleito eleitoral. Entre elas, citamos os dirigentes Luiz Iwashita, do Paraná; Alessandro Puglia, de São Paulo; e Adjaílson Coutinho, da Paraíba. Estados que tiveram a gestão interrompida até que seus desafetos fossem, de alguma forma, destituídos dos cargos. No Pará, Estado em que o novo presidente declarou abertamente apoio à oposição, o judô está parado desde a eleição de 2021. Silvio Acácio desrespeitou até decisões judiciais, não permitindo que César Luiz Vieira assumisse de fato o mandato para o qual fora legalmente eleito.

180 dias

Passaram-se quase 180 dias, meio ano inteiro, e o judô do Estado de São Paulo, a locomotiva do judô no Brasil, está sob intervenção em função dos desvios comportamentais de um dirigente que, por onde passou, deixou uma marca indelével de ódio, vingança e destruição.

Um exemplo claro do despreparo administrativo de Sílvio Acácio foi a sua conturbada passagem pela presidência da Federação Catarinense de Judô (FCJ). Durante seu único mandato, marcado por perseguições intermináveis e revanchismo contra professores que considerava inimigos, ele demonstrou uma gestão fundamentada em práticas de nepotismo e favorecimento pessoal. Entre outras coisas, negava promoção de graus para os alunos dos professores que não endossavam os absurdos praticados por ele. Assim que assumiu a FCJ colocou seu primo Cláudio Almeida como membro do Conselho Fiscal da FCJ. Quando assumiu a presidência da CBJ, continuou a utilizar sua posição para beneficiar aliados próximos, e prejudicar aqueles que persegue, nomeando o professor Icracir Rosa seu sócio na Associação Colón de Judô como presidente da importante Comissão de Graus da CBJ. Além disso, elegeu seu advogado, Rodrigo Pereira, como membro do Conselho Fiscal da CBJ. Rodrigo, além de ser seu aluno desde a infância, na época era presidente de outra academia de propriedade de Sílvio Acácio, a Associação Seidô-Kan de Judô, em Jaraguá do Sul (SC). No fim, sua maldade e incoerência administrativa voltaram-se contra ele mesmo, levando-o a ser banido da presidência da FCJ. Por onde passa, Sílvio Acácio deixa profundas marcas de desrespeito, perseguição e má gestão.

Momento de capitalizar

Os judocas paulistas fizeram a lição de casa em Paris, e agora chegou o momento de a FPJudô capitalizar-se institucionalmente, explorando o melhor resultado da história em Jogos Olímpicos, e com isso aumentar exponencialmente o número de filiados (pessoas físicas e jurídicas), pois o judô paulista saiu de Paris com sete medalhas, algo absolutamente inédito e que jamais havia acontecido.

Todavia, os gestores da entidade estão com mãos e pés atados em função da ingratidão de um dirigente que tem até mesmo a coragem de trazer para si os louros de uma conquista que não foi dele e na qual não teve protagonismo algum. Foi apenas um mero coadjuvante inexpressivo.

Alguém que, se tivesse ficado quieto, passaria despercebido. Ou será que até as medalhas do judô em Paris foram conquistadas por ele, e nós não fomos avisados?

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