09 de março de 2025

Até mesmo a arbitragem da Confederação Brasileira de Judô (CBJ), outrora referência mundial, foi reduzida a escombros por uma gestão marcada por incompetência, perseguição e desmonte sistemático das estruturas que sustentavam o alto nível técnico e administrativo do judô brasileiro. O setor que um dia elevou o nome do Brasil nos tatamis internacionais agora vive um cenário de terra arrasada.
Após oito anos à frente da entidade, Silvio Acácio Borges não apenas falhou em preservar a excelência construída por seu antecessor: ele a implodiu. O que antes era uma arbitragem respeitada e referência no continente, com brasileiros atuando nas finais dos mais importantes eventos do circuito internacional, hoje não passa de um reflexo opaco da decadência administrativa imposta pelo atual mandatário da CBJ.
Diante da evidente deterioração do setor, buscamos ouvir árbitros FIJ A e FIJ B que protagonizaram a última década de ouro da arbitragem nacional. Cientes dos riscos e retaliações que poderiam sofrer, alguns aceitaram conceder entrevista à Revista Budô. O que ouvimos foi estarrecedor: um retrato fiel de uma estrutura desmantelada, corroída por autoritarismo, nepotismo e descaso.
Os relatos são unânimes e incontestáveis. O setor interno da arbitragem, segmento que ironicamente serviu de trampolim para a ascensão de Silvio Acácio Borges, foi simplesmente destruída.
“O resultado disso? Um colapso na qualidade da arbitragem nacional, comprometendo não apenas a credibilidade da CBJ, mas, sobretudo, a justiça e integridade dos combates — pilares essenciais do judô.”
O cenário que se apresenta ao futuro presidente da CBJ não poderia ser mais desolador. Além de lidar com o caos administrativo herdado, caberá a ele a árdua missão de reconstruir uma das mais prestigiadas escolas de arbitragem do mundo, que até 2017, antes do desmonte causado por Borges, era referência incontestável dentro e fora do shiai-jô.
Com trajetória meteórica, em pouco mais de três anos Kamila Elisabete Lemos migrou da arbitragem nacional para FIJ A © Divulgação
Se a CBJ já vive tempos sombrios, a situação da arbitragem é a prova definitiva de que o atual presidente não apenas fracassou, mas arruinou deliberadamente um dos pilares mais sólidos do judô brasileiro. Para isso, manipulou narrativas, protegeu aliados e fabricou inimigos, transformando desafetos em alvos de perseguição em uma gestão marcada pelo despreparo, autoritarismo e um ego desmedido.
O que deveria ser um setor pautado pelo mérito e pela transparência tornou-se palco de favorecimentos obscuros e manipulações descaradas. Nos últimos anos, a CBJ abandonou os critérios técnicos, de competência e antiguidade na seleção de árbitros para atuações nacionais e internacionais, além de exames de certificação internacional. Em seu lugar, impôs um sistema que beneficia apadrinhados e integrantes de pequenos grupos políticos, em detrimento de árbitros capacitados e experientes.
A ingerência na arbitragem é tão evidente que a responsável por eventos da CBJ, Thiara Bertoli, assumiu o verdadeiro controle do setor, subjugando completamente o professor kodansha Edison Minakawa, coordenador nacional de arbitragem. Seu poder nos bastidores é tão grande que as convocações passaram a seguir um padrão absurdo: são sempre os mesmos nomes, dos mesmos estados, independentemente da competência, enquanto árbitros historicamente qualificados foram excluídos do circuito.
O resultado disso? Um colapso na qualidade da arbitragem nacional, comprometendo não apenas a credibilidade da CBJ, mas, sobretudo, a justiça e integridade dos combates — pilares essenciais do judô.
Os exames internacionais de arbitragem, que deveriam ser oportunidades justas e democráticas para árbitros de todo o País, transformaram-se num esquema fechado e segregador. O acesso às certificações FIJ é sistematicamente restrito a pessoas do Distrito Federal e dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina — exatamente aqueles que orbitam a cúpula da CBJ.
Para a próxima certificação da FIJ, que ocorrerá em Lima, Peru, em 2025, o cenário escandaloso se repete. Enquanto árbitros qualificados de diversos Estados, que estudaram e se prepararam, sequer têm a chance de pleitear uma vaga, um nome foi incluído na relação dos convocados sem a adoção de qualquer critério técnico: Everson Parente Assis, membro da coordenação técnica do Ceará, que nem sequer exerce mais a função de árbitro. A pergunta que fica é: com base em quais critérios esse indivíduo foi escolhido pela Coordenação Nacional de Arbitragem?
Esse esquema criminoso não apenas marginaliza árbitros qualificados de todo o Brasil, como também fere os princípios de equidade, isonomia e transparência.
O compadrio dentro da CBJ atingiu níveis inimagináveis. Outro exemplo gritante é o da professora catarinense Kamila Elisabete Lemos, aluna direta de Silvio Acácio Borges na Associação Colon de Judô de Joinville. Em apenas três anos, ela foi catapultada de árbitra nacional para o mais alto degrau da arbitragem mundial, tornando-se FIJ A — um feito que, de acordo com os critérios normais da própria Federação Internacional de Judô, demandaria pelo menos oito anos.
O mais grave é que o caso de Kamila Lemos não é isolado; há inúmeros exemplos semelhantes dentro da CBJ. No entanto, destacamos o dela por se tratar de uma aluna formada diretamente pelo presidente da entidade, em um dojô que pertence a ele e a Icracir Rosa, ex-presidente da Comissão Nacional de Graus. Ambos, que deveriam ser referências de retidão e transparência, tornaram-se, na realidade, símbolos do desrespeito e da total subversão dos princípios filosóficos do judô.
Enquanto isso, árbitros altamente qualificados, com décadas de dedicação, estudo e vasta experiência, são deixados de lado, sem nenhuma perspectiva de crescimento. A discrepância se torna ainda mais revoltante quando se descobre que os “escolhidos” têm suas taxas para exame, alimentação, hospedagem e passagens aéreas custeadas pela CBJ, enquanto os demais devem arcar com todos os custos.
Diferente do desserviço prestado pelo atual presidente da CBJ à arbitragem, o passado trouxe nomes de grande relevância, como Carlos Catalano Calleja. O professor paulista ocupou o cargo de diretor de arbitragem da FIJ, tornando-se a maior autoridade mundial no setor e contribuindo significativamente para o desenvolvimento do judô no Brasil e no mundo © Divulgação
Tais fatos atrasam e desolam os quase 2 mil árbitros que tanto se dedicam na expectativa (frustrada) de avançar da arbitragem nacional, em todos os aspectos e direções que a carreira oferece.
Identificamos que a sensei Kamila já está convocada para atuar no Campeonato Pan-Americano e Oceania Sênior 2025, que será realizado entre os dias 25 e 27 de abril, em Santiago, no Chile, e também no Campeonato Pan-Americano e Oceania de Cadetes e Júnior 2025, que ocorrerá entre os dias 18 e 20 de abril, em Lima, no Peru — país que, coincidentemente, sediará o Seminário de Arbitragem da CPJ 2025.
Nossa reportagem foi informada de que, no exato momento em que finalizávamos esta matéria, a sensei joinvilense se encontrava na Hungria, participando do curso da IJF Academy, uma nova exigência da direção de arbitragem da FIJ para as novas gerações de árbitros. O que torna essa movimentação ainda mais paradoxal é a seguinte questão: como a representante da Associação Colon de Judô tem conseguido custear toda essa intensa agenda internacional, sendo que, segundo registros, atua como motorista de aplicativo?
Uma das mais graves denúncias envolve o desvio de recursos do Programa de Apoio às Federações (PAF), criado para custear passagens, hospedagem e alimentação de árbitros em competições nacionais. Sob Silvio Acácio Borges, esse benefício foi drasticamente reduzido e direcionado a um pequeno grupo de aliados, enquanto os demais árbitros foram obrigados a custear as próprias despesas.
Mais grave ainda é a revelação de que parte desses recursos foi usada para bancar viagens de dirigentes aliados do presidente da CBJ, garantindo-lhes regalias em eventos nacionais e internacionais, enquanto a arbitragem brasileira segue sucateada e desvalorizada.
O ofício de árbitro de judô exige muita dedicação e investimento. A cobrança sobre os árbitros é a mesma de um profissional; logo, a ascensão na carreira deve ser tratada de forma profissional e clara pela entidade que a regula. Quanto maior transparência dos critérios para as convocações e ascensão no ofício de árbitro, melhor será a qualidade deles e dos eventos. A CBJ exige qualidade de seus árbitros por meio da presença em seminários nacionais, estudo de idiomas, atualização constante e comportamento impecável, entre outros quesitos. Mas tamanha exigência requer via de mão dupla; ou seja, após tanta dedicação e investimento, quando o árbitro é convocado, deve ter suas despesas pagas pela entidade máxima do judô nacional. Se a balança estiver desequilibrada, o árbitro ficará em desvantagem, posto que suas obrigações são infinitamente superiores aos seus direitos.
Logo, os árbitros devem receber tal suporte da CBJ, e o mesmo deve acontecer com naturalidade, como sempre ocorreu antes desta fatídica gestão que, felizmente para todos, se finda no próximo dia 15.
Nem os árbitros FIJ A, degrau máximo da arbitragem, inspiração para os novos árbitros, são tratados com a devida isonomia. Alguns conseguem atuar em vários eventos com as despesas pagas pela CBJ, enquanto outros precisam usar recursos próprios para estar no mesmo evento.
Qual motivação terá o jovem árbitro, que tanto investe para melhorar e chegar ao topo da carreira, sabendo que, após décadas de sacrifício, vai continuar pagando para atuar nos eventos? Qual é o objetivo da entidade ao tratar de forma privilegiada os que pertencem à sua tropa de elite?
O nível de precarização e abuso imposto à arbitragem brasileira pela gestão atual chegou a tal ponto que ser convocado para um evento da Confederação Pan-Americana de Judô tornou-se motivo de desespero para os árbitros do Brasil.
Em qualquer país minimamente organizado, a confederação nacional responde por todas as despesas de seus árbitros convocados para competições pan-americanas. No Brasil, a lógica foi subvertida: os árbitros são obrigados a pagar do próprio bolso para representar o País, enquanto a CBJ simplesmente se omite e mantém privilégios para sua cúpula.
A situação agravou-se recentemente quando, a contragosto da Coordenação de Arbitragem da CBJ, alguns árbitros brasileiros foram adicionados ao grupo de WhatsApp das Américas. O acesso direto às informações internas da entidade revelou um mar de injustiças e favorecimentos escancarados. Foi nesse espaço que os árbitros brasileiros perceberam, com provas concretas, que há anos vinham sendo deliberadamente explorados e segregados pela CBJ.
A quebra de regras e a falta de critério geram um caos gigantesco e impõem um desgaste desumano a profissionais que deveriam atuar com equilíbrio, conhecimento e isenção para garantir a lisura dos combates. No entanto, tudo isso se tornou impossível diante da postura autoritária, negligente e corrupta da atual gestão da CBJ, cujo presidente parece desconhecer por completo os princípios básicos de justiça, transparência e respeito que regem o judô.
A negligência da CBJ atingiu níveis absurdos de desumanidade quando, em 2024, o árbitro FIJ A Edilson Hobold faleceu tragicamente num acidente aéreo enquanto estava a serviço da entidade. A CBJ sequer prestou condolências diretamente à família, muito menos se prontificou a auxiliar em questões burocráticas ou financeiras. Mesmo insignificante, o seguro obrigatório, que deveria ser acionado pela CBJ, só foi recebido graças à intervenção de colegas da arbitragem e do advogado da família.
O mesmo descaso foi observado meses depois, quando Angel Peleteiro, um dos árbitros mais respeitados do País, faleceu vítima de câncer. Novamente, a CBJ ignorou completamente a família e a memória de um profissional que dedicou décadas ao judô brasileiro. E mais uma vez foram os colegas da arbitragem que se articularam para conseguir recursos para auxiliar a esposa do importante árbitro baiano. De forma cruel, a atual diretoria da CBJ deixou claro o desprezo pelos árbitros FIJ A.
O golpe final no que restava de esperança para a arbitragem nacional veio com a criação do Projeto Olímpico, que, em teoria, deveria apoiar financeiramente árbitros jovens e promissores. Na prática, foi um mecanismo para destinar todos os recursos disponíveis para Kamila Elisabete Lemos, aluna direta de Silvio Acácio Borges.
Fica evidente que a perpetuação dessa política de favorecimento e corrupção levará a arbitragem brasileira ao colapso definitivo. O judô é um esporte fundamentado na justiça, na disciplina e no respeito. A comunidade judoísta não pode permitir que esses princípios sejam destruídos por interesses escusos.
Segundo informações obtidas por nossa reportagem, Silvio Acácio Borges vem fazendo lobby para assumir a coordenação de arbitragem da Confederação Brasileira de Judô, na tentativa desesperada de perpetuar suas práticas nefastas. Sua intenção é clara: continuar perseguindo aqueles que despreza e protegendo seus aliados, sustentando um projeto de poder marcado pelo autoritarismo e pela destruição institucional da CBJ.”
No entanto, a manutenção do poder baseada no ódio e na maldade representa um sistema sustentado pelo medo, pela perseguição e pela aniquilação de qualquer oposição. Em vez de liderança legítima, impõe-se um regime de manipulação, retaliação e destruição moral dos adversários. Felizmente, o futuro presidente da CBJ não se prestaria a um papel tão vil. Depois de ter feito história em seus mandatos anteriores, o professor Paulo Wanderley retorna para resgatar o prestígio e o status que o judô brasileiro experimentou até 2017, restaurando a credibilidade e os princípios que foram brutalmente corrompidos por essa gestão desastrosa.
O caos instaurado na CBJ nos últimos oito anos, especialmente no setor da arbitragem, é a prova cabal da destruição provocada por uma gestão incompetente, autoritária e pautada pelo favorecimento de grupos específicos em detrimento da competência e da transparência. O judô brasileiro, referência mundial por décadas, tornou-se refém de esquemas que corrompem os valores fundamentais da modalidade e desmoralizam aqueles que dedicam suas vidas à arbitragem.
Diante desse cenário de terra arrasada, o retorno do profissional de Educação Física e professor kodansha hachi-dan (8º dan) Paulo Wanderley Teixeira representa a única esperança para que o judô nacional volte a trilhar o caminho da excelência. Sob sua liderança, a arbitragem brasileira alcançou patamares inéditos de profissionalismo e credibilidade, consolidando um corpo técnico respeitado internacionalmente e assegurando que as convocações fossem pautadas exclusivamente por critérios técnicos e meritocráticos.
A expectativa para sua nova gestão não poderia ser mais clara: reconstruir a Confederação Brasileira de Judô, expurgando as práticas nocivas que a corroeram nos últimos oito anos e responsabilizando aqueles que transformaram a entidade num reduto de interesses pessoais, conspirações e abusos administrativos.
Se há um setor que exige ação imediata e enérgica é justamente a arbitragem, que foi destroçada e se tornou o maior símbolo do desastre promovido por Silvio Acácio Borges. A limpeza nos quadros dirigentes e a restauração dos princípios técnicos e éticos são passos essenciais para devolver dignidade e confiança aos árbitros brasileiros, garantindo que aqueles que se dedicam de forma séria e comprometida voltem a ter espaço e oportunidades justas.
A comunidade judoísta aguarda com ansiedade o fim desse ciclo sombrio e o início de uma era de reconstrução e resgate dos valores que sempre nortearam o judô brasileiro. A missão de restaurar a CBJ e sua arbitragem começa agora – e a esperança renasce com a certeza de que a impunidade não terá mais vez e que os responsáveis pelo desmonte do judô nacional serão finalmente extirpados do cenário esportivo.
Relação de árbitros convocados para o Campeonato Pan-Americano e Oceania Sênior 2025 que será realizado 25 e 27 de abril, em Santiago, no Chile © CPJ
Relação de árbitros convocados para o Campeonato Pan-Americano e Oceania de Cadetes e Júnior 2025, que ocorrerá entre os dias 18 e 20 de abril, em Lima, no Peru © CPJ
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