17 de novembro de 2024
Justiça nomeia presidente da Comissão de Atletas interventor da Federação Paraense de Judô
Judiciário reconheceu a ilegitimidade dos antigos dirigentes e escolheu Milton Rafael Ribeiro de Miranda para comandar a FPAJU
Por Paulo Pinto / Global Sports
19 de abril de 2022 / Curitiba (PR)
Após as ilegalidades praticadas no processo eletivo da Federação Paraense de Judô (FPAJU) e os cinco anos de desmandos e autoritarismosdo seu presidente, a juíza Valdeíse Maria Reis Bastos, da 2ª Vara Cível e Empresarial de Belém, deu início ao processo de restauração, reorganização e democratização da entidade.
Em seu despacho a magistrada paraense determinou que Milton Rafael Ribeiro de Miranda, atleta da seleção brasileira de judô, presidente da Comissão Estadual de Atletas e membro da Comissão Nacional de Atletas, comande temporariamente a FPAJU. Eis o que diz o despacho:
A assembleia convocada por Alcindo Rabelo Campos, injustificadamente, deixou de observar o prazo previsto no Estatuto (art. 32), desatendendo o múnus que lhe incumbe, o que inegavelmente contribui para um cenário de incerteza aos associados. No mesmo sentido, há nos autos declarações de vários atletas, relatados em boletins de ocorrência – o que lhes confere maior legitimidade –, reportando a ocorrência de ameaças por terem se posicionado contrários ao presidente Alcindo Rabelo Campos (Id Nº 35176014 – págs. 4/9).
Ademais, importante pontuar que Alcindo Rabelo Campos já se encontra à frente da federação há quase nove anos, sendo que sua permanência neste cargo por tempo indeterminado vai de encontro às normas constitucionais do estado democrático de direito (fenômeno da força normativa da Constituição), tanto assim que o próprio Estatuto da FPAJU somente permite uma única recondução ao cargo.
Diante deste cenário, somado às denúncias realizadas perante o MPPA (Id Nº 34601360 – pág. 1, Id Nº 34601360 – págs. 2/3), mostra-se evidente que a manutenção de Alcindo na presidência da federação por período que ultrapassa seu mandato não é medida mais benéfica à instituição, neste momento, notadamente por estar diretamente envolvido nos fatos que são averiguados na presente ação.
Desta feita, observo que a nomeação de administrador temporário de confiança deste Juízo, com capacidade técnica, sem vínculo e sem indicação de qualquer dos envolvidos, equidistante, é ato que melhor preserva os interesses da federação e de seus atletas. Tanto assim que a própria federação ré, no petitório de Id Nº 28823424, reconheceu a necessidade de nomeação de administrador temporário, o que indica a ausência de pretensão resistida neste ponto, cabendo ao Juízo, apenas, a indicação do interventor segundo a capacidade e preparo técnico. Num. 57639507 – Pág. 4
Assim, presente a probabilidade do direito e o perigo de dano, de modo a preservar os interesses da FPAJU, dos atletas e associações a esta vinculados, entendo que se faz necessária a imediata nomeação de interventor capacitado, razão pela qual nomeio como administrador temporário Milton Rafael Ribeiro de Miranda, atleta da seleção brasileira de judô, presidente da Comissão Estadual de Atletas de Judô e membro da Comissão Nacional de Atletas de Judô, referência no judô paraense como um dos atletas com mais resultados expressivos na história do esporte no Estado, a quem incumbirá a presidência da Federação Paraense de Judô, para exercer e conduzir a presidência da Federação Paraense de Judô, conforme atribuições dispostas no art. 37 do Estatuto, até ulterior deliberação, exceto a realização de nova assembleia para eleição, haja vista que este ponto será objeto de sentença de mérito nesta ação.
Após a decisão da Justiça, César Luiz Vieira e Cintra de Oliveira, candidato à presidência da FPAJU pela chapa Renascer Judô: União, Respeito e Transparência e autor da ação, avaliou que a decisão da magistrada ajudou na luta por uma gestão democrática e pôs fim a um período desagradável pelo qual passou o judô paraense.
“Aguardamos com grande expectativa a questão das eleições, pois será objeto de sentença futura, porém estamos confiantes de que aquilo que ocorreu jamais foi uma assembleia eleitoral e que será tornado sem efeito algum e que por meio de um processo eleitoral justo possamos vencer o pleito para que com as devidas legitimidade e legalidade possamos assumir a gestão da modalidade em nosso Estado.”
Avaliando o cenário que se avizinha, Vieira mostrou que vislumbra um cenário promissor. “Acredito que esta decisão terá impacto positivo e resultará na renovação por meio de uma gestão participativa, inclusiva e democrática. O que houve foi a contramão de uma gestão. Acreditamos mais ainda que, fará renascer a prática saudável e harmônica do judô; que haverá alegria nas academias e clubes; que haverá ampla participação das associações legalizadas nas decisões, pois estávamos sendo geridos por associações sem poder de voto que nem CNPJ tinham e estavam inativas junto à Receita Federal, mas apoiavam tudo que acontecia ou seja, não existiam e fomentavam o caos.”
César Luiz Vieira entende que a prioridade agora é fortalecer o grupo na busca da reaproximação de todos aqueles que adormeceram ou se afastaram em razão do descrédito e desmandos que aconteciam.
“Temos de manter a esperança de que saia logo a sentença direcionando ao processo eleitoral definitivo. Devemos acreditar que seremos vitoriosos e revigorar as metas para gerir o judô no Estado do Pará com planejamento, objetivando recuperar prontamente a terra arrasada que herdaremos da gestão que foi retirada pela Justiça. De forma participativa vamos auxiliar a gestão do nosso administrador temporário para que não haja quebra na solução de continuidade da administração”, disse Vieira.
Ele não acredita na possibilidade de inclusão da chapa Disciplina e Uniformidade, encabeçada pelos professores Adaelson Souza dos Santos e Alcindo Rabelo Campos, no pleito que terá data definida pela Justiça.
“De forma democrática, espero que não”, disse. “De forma jurídica acredito que a chapa será julgada inelegível pelas transgressões e vários crimes que cometeu nestes anos em que esteve à frente da gestão da FPAJU e que deverão ser apurados de modo regular e processual buscando a penalização. Como praticante de judô, espero que estes pseudodirigentes sejam retirados do cenário da modalidade, pois o mal causado gerou feridas profundas tanto em atletas quanto em gestores de associações e patrocinadores. A terra arrasada precisará de fertilizantes de vontade, de capacidade técnica e de sementes morais para gerar uma pratica de judô renovada, saudável e com capacidade de ocupar seu lugar no cenário nacional.”
Alan Camilo Cararetti Garcia, advogado e professor especialista em direito esportivo, responsável pela condução do processo aberto por César Luiz Vieira e Cintra, entende que o deferimento da juíza Valdeíse Maria Reis Bastos é histórica para o esporte brasileiro.
“Eu nunca havia visto uma decisão como esta”, disse Garcia, que também é membro das comissões estadual e federal da OAB e do Conselho Nacional de Justiça, além de procurador de várias federações esportivas. “Quando nomeia o atleta de expressiva relevância do Estado do Pará, a juíza determina que uma espécie de representante do povo comande temporariamente a Federação Paraense de Judô, até que as eleições se realizem e isso é um fato inédito. Havíamos solicitado um advogado ou interventor, mas a magistrada foi além, acertadamente.”
O advogado também expressou alegria pela decisão da juíza Reis Bastos. “Fiquei muito feliz. Finalmente conseguimos afastar o senhor Alcindo Rabelo do cargo. Após o fim do seu mandato ele não era mais presidente, mas mesmo assim se apresentava como tal.
A decisão judicial consubstancia-se principalmente ao senhor Alcindo Rabelo e seu vice por não cumprirem funções básicas, deixando de prestar contas ao juízo e principalmente aos associados do Estado do Pará, na contramão do que reza o artigo 32 do Estatuto da FPAJU.”
Garcia informou que já notificou a Confederação Brasileira de Judô. “Se a CBJ não cumprir a determinação judicial poderá responder por crime de responsabilidade e ser multada, além de ser apurado um possível atentado à dignidade da Justiça. Parece que a confederação ainda não assimilou a gravidade deste caso. Alerto que as correspondências, documentos e informações inerentes a um presidente deverão ser destinadas ao novo administrador nomeado judicialmente.”
Por fim, o advogado lembrou que a Justiça é igual para todos. “Às vezes pensamos que não existe justiça, mas quem pensa assim está equivocado.”